Capítulo 19 - Artur

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Artur foi confinado por alguns minutos a uma sala bem pequena, sozinho. Permitiram-lhe que usasse um banheiro e bebesse água, e o garoto ouviu guardas comentarem algo como "vai precisar de forças para passar pelo interrogatório" e "é muito novo, melhor se estiver morto".

Nos minutos em que pode sentar-se e analisar toda a situação na qual estava envolvido, Artur sentiu um sono terrível, uma fome avassaladora e um medo sem igual. Mas o que mais machucava-o era a impotência. Era só uma criança, estava separado do seu mentor (era assim que considerava Lucas, agora), não tinha certeza se os pais estavam ali e, se estivessem, nem sabia o que poderia fazer. Achou toda a situação desfavorável. Mesmo se ele e Lucas tivessem entrado escondidos ali, de que adiantaria? Não conseguia analisar nada de forma coerente.

Deixou-se dominar pela frustração e recostou-se na parede, fechando os olhos por um momento e imaginando a sua vida como era antes. Quantos dias haviam se passado? Dois, três? Parecia uma semana. Era noite ou dia? Perdera totalmente a noção de tempo ali dentro, por onde era quase impossível avistar o lado de fora. Despertou do seu devaneio ao ouvir passos e o barulho de uma chave destrancando a fechadura da porta de metal. 

- Anda, moleque. Sua hora chegou.

Ele dirigiu-se para a saída. O guarda guiou-o pelo ombro; era tão pequeno e insignificante ali que não se deram ao trabalho de lhe colocarem algemas, como haviam feito com Lucas antes de separarem os dois. Os corredores longos e cheios de portas sobre os quais Lucas lhe contara pareciam parte de um mundo paralelo. Andou por muito tempo antes de ser empurrado por uma porta maior, de ferro vermelho, destoando de todas as outras.

Tinha o chão feito de um piso cinza escuro e muito polido e parecia um tribunal. Foi levado ao centro de um círculo, cercado por arquibancadas de madeira escura. O local estava cheio de gente; todos homens, pelo que Artur identificou. Estava muito assustado para observar melhor. Lucas não estava em lugar nenhum.

À sua frente havia uma mesa com a cadeira alta, também em madeira, com dois guardas escoltando. Artur imaginou que ali era onde o juiz de tudo aquilo ficaria. Tentou supor que tipos de pergunta lhe fariam e como responderia a elas. Não poderia falar o nome de Lucas, isso seu bom senso já tinha lhe alertado.

O silêncio era aterrador e o garoto ficou acanhado. Passou a encarar o chão e viu que as mãos pingavam suor. Queria chorar, mas forçou-se a ficar firme. De repente, o barulho de um passo metálico chamou sua atenção e ele ergueu o rosto. Na cadeira alta, agora, encontrava-se um homem de rosto cruel. Todos os homens que estavam ali ficaram de pé e em posição de respeito e Artur fez o mesmo, endireitando-se nervoso.

- Bem que me disseram que você era só um moleque. Mas tenho certeza de que não é burro e vai conseguir responder algumas perguntas. Eu sou o chefe da guarda da Central. Comandante Zion Velert. E você vai responder tudo o que eu perguntar. Acabei de chegar de uma longa viagem e não quero ser contrariado logo pela manhã.

Artur estava mortificado. Que homem imponente e assustador! Prestou atenção à informação que já era de manhã e isso intensificou seu cansaço. Não havia nenhum banco no qual ele pudesse se sentar, ou algo para se apoiar. Cambaleou um pouco e encarou seu interrogador, que prosseguiu.

- Nome?

- Artur, senhor. - tentou soar firme e objetivo. Já estava encrecado mesmo. Fazer gracinha ou evitar responder poderia deixá-lo, - e a Lucas, em uma situação ainda pior.

- De onde veio?

- Uma das vilas espalhadas ao redor da capital, senhor.

- Idade?

- Doze, senhor.

- Preocupante. Novo demais para ser pego por um rastreador. Como você chegou até aqui? E há quanto tempo?

- Não consigo precisar o tempo, senhor. Cheguei pelo ar. Fui pego por engano por um rastreador.

- Como é? - Zion soou interessado. Arregalou os olhos e levantou-se da cadeira onde estava, descendo dois degraus e indo até Artur. - Como é que um fedelho como você, sabe sobre os rastreadores? Asseguramo-nos todos de que qualquer pessoa que caísse nos arredores fosse capturada. Depois, percebemos que alguns de vocês estavam reunidos. O governo encarregou-se de lidar com isso diretamente, para não haver dúvidas. E nós continuamos ajudando. Há mais de vocês? Onde estão reunidos? 

Artur não respondeu. Piscou várias vezes, tentou clarear a mente, encontrar uma desculpa, uma resposta qualquer, mas nada lhe veio para tirá-lo daquela situação. Por isso, ficou em silêncio, mesmo sabendo que isso teria consequências.

- Não entendeu, pirralho? Então vamos de novo, pergunta por pergunta. Não abuse da minha paciência. Como você sabe sobre rastreadores e sobre ter sido pego por engano?

- Eu... só sei, senhor. 

- Só sabe... Você parece saber de muitas coisas mais. E deve ser porque alguém lhe contou. Deve ter sido o seu companheirinho, não é mesmo? Já soube sobre ele. Está muito bem guardado. Vamos mudar o foco agora, então. - Zion colocou as mãos para trás e começou a rodear Artur, que agora se segurava para não tremer. Estava consciente a respeito dos vários pares de olhos que se concentravam nele. - Qual é o nome dele? Quem é, e de onde veio?

Novamente o silêncio. Não, não poderia responder, pensou o garoto. Abanou a cabeça em negativa. 

- Vai dizer que também não sabe? 

- Não, senhor.

- Não sabe ou não vai dizer?

Artur ergueu a cabeça. Inflou o peito e considerou suas opções. Não queria e não iria cometer mais erros com Lucas. Já tinha tomado sua decisão. Agora, o chefe da guarda encontrava-se parado à sua frente, encarando-o de modo intimidante. 

- Não vou dizer, senhor.

- Imaginei. Mas temo que você, moleque, esteja enganado. Temos muitos jeitos de te fazer falar tudo o que precisamos. Temos muitas pessoas na fila para o Abate. Vamos ver se você vai salvar a vida de alguma delas desembuchando o que sabe ou se vai enviá-la para a morte um pouquinho mais rápido. Guardas!  Busquem alguém que esteja aguardando execução. Qualquer pessoa, de preferência alguém que não faça ideia de onde esteja, se constar a informação na ficha. - Zion fez uma pausa e deu uma risadinha. - Ah... e tragam também o amigo do pirralho aqui. Dêem umas porradas nele antes, não se esqueçam. Quero que ele chegue aqui já no ponto certo para... comover. 

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