Fernanda

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É claro que não conseguiria ir para a faculdade essa noite, nem de roupa consegui trocar.

Estou tão irritada com toda essa situação que só ando pela rua, sem sequer olhar para que direção estou indo.

A Fabiana foi longe demais e sinceramente eu não aguento mais essa situação toda. Não aguento mais aquela casa, aquela vida. Eu ainda não tenho condições de bancar o aluguel de uma casa sozinha, mas preciso me organizar.

Não dá mais pra morar lá, até sinto pena em deixar o meu pai sozinho naquele ninho de cobras, mas não dá mais. Eu preciso de espaço, preciso de paz. Só morando sozinha mesmo pra conseguir isso.

Com a ideia fixa em minha mente, começo a prestar atenção para onde os meus pés me levaram, estou andando por uma rua que ainda não conhecia. Mas continuo, me sinto mais relaxada e menos estressada. Está sendo bom caminhar assim, sem direção.

Entretanto, ao dobrar na esquina à minha frente me deparo com a pior cena possível. Fogo! Gente gritando.

Que cenário horrível. Corro o mais próximo possível para tentar ajudar, e ao me deparar com toda essa gritaria a adrenalina aumenta em meu corpo.

- Chamem os bombeiros! Alguém já fez isso?

Me aproximo das pessoas paradas e elas me olham com terror estampado em suas faces.

- Não há como, eu deixei meu telefone dentro da casa.

Um rapaz me avisa e rapidamente tiro o meu aparelho do bolso e começo a discar o número dos bombeiros.

- Melina. Minha filha. Melina. Cadê a minha filha?

Uma senhora chega correndo aos berros, avisando que a sua filha ainda estava dentro de casa. Eu olho para o desespero estampado no rosto dela e sem pensar corro em direção ao fogo.

Acho que ajudar as pessoas corre em minhas veias, está em meu sangue. Eu não penso no perigo que me cerca ao entrar num local completamente incendiado, só penso na Melina e na mãe dela gritando lá fora.

Preciso salvá-la.

Só que eu não faço ideia de como encontrá-la aqui dentro. Mal consigo ver devido a fumaça e as fortes chamas.

- MELINA! MELINA, ONDE VOCÊ ESTÁ? MELINA. EU VIM TE AJUDAR. SE VOCÊ CONSEGUE ME OUVIR ME DIZ ONDE VOCÊ ESTÁ?

Caminho mais um pouco, meus olhos ardem e meio abaixada continuo andando. É extremamente complicado andar num local onde você não conhece, procurando alguém que você não faz ideia de onde está.

E que droga?! Por que os bombeiros estão demorando tanto?

- MELINA??? VOCÊ CONSEGUE ME OUVIR??

Nada. Não ouço nada.

Só o barulho das chamas destruindo tudo ao meu redor.

Começo a subir as escadas que levam  ao segunda andar. Uma porta.
Uma porta fechada. Tem que ser aqui.

Eu corro em direção à porta na minha frente, mas sou atingida por uma parte do forro, acabo caindo. Sinto que me machuquei, e uma dor horrível nas costas, mas com toda a força que há no meu interior, consigo me levantar. Alcanço a porta e graças a Deus a menina está ali, deitada no chão, desmaiada.

Merda!

Corro até ela e a pego em meu colo.
Uma criança tão linda, sinto um aperto em meu coração.

- Calma linda, eu vou te tirar daqui. Vai dar tudo certo! Sua mãe está te esperando lá fora.

A respiração dela está bem devagar, mas pelo menos ainda está viva.

Só que agora não faço ideia de como tirar a gente daqui. A porta já está tomada pelas chamas e não há como voltar pelo mesmo local que eu vim.

Então ouço a sirene dos bombeiros e é como se fosse a luz no fim do túnel, olho para a janela e apesar de estarmos no segundo andar da casa é a nossa única opção de saída.

Corro em direção à janela e começo a acenar como uma doida para que os bombeiros corram em nossa direção e nos tirem daqui o mais depressa possível.

Pela janela eu vejo o alívio nos olhos da mãe de Melina e percebo que os bombeiros estão se apressando para nos socorrer.

Ouço um barulho e percebo que o chão está querendo ceder e se isso acontecer já era a nossa chance de sobreviver. Lentamente as madeiras que formam o assoalho se racham e pelo barulho que faz não vai demorar para desmoronar.

E nesse instante, num rompante de agonia e adrenalina, atiro Melina pela janela na esperança de já estarem a postos lá embaixo aguardando ela, enquanto sinto o chão sumir dos meus pés e cair em direção ao inferno que está abaixo de mim.

Paixão em ChamasOnde histórias criam vida. Descubra agora