CAPÍTULO QUARENTA E QUATRO

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    No dia em que me tornei oficialmente a guardiã de Emma, Mark, Julian, Livvy, Ty, Dru e Tavvy, Isabelle e Clary decidiram que era uma ocasião digna de um grande jantar. Era, na verdade, uma desculpa excelente para enfim reunirmos todos em um mesmo ambiente por mais do que alguns breves minutos. E felizmente Jace conseguiu dissuadir a irmã da ideia de cozinhar. Nenhum de nós estava disposto a encarar a gastronomia de Isabelle.
    O Instituto encheu-se de vida naquela noite. Maia e Bat chegaram em companhia de Lily, que pôde entrar em solo sagrado graças a uma Runa especial que Clary colocou temporariamente nas portas de entrada. Aquela súbita parceria era algo que até pouquíssimo tempo pareceria inconcebível. Theresa recusou educadamente o convite, mas Malcolm e Catarina vieram, trazendo com eles muito vinho e cerveja. E, claro, nosso megalomaníaco de olhos roxos não perdeu a oportunidade de beijar minha mão e, consequentemente, fazer com que James trincasse os dentes. Simon achou aquilo divertidíssimo, pelo menos até Malcolm começar a chamar Isabelle de “Fios de Ônix” ou “Bela Obsidiana”. O Nephilim ficou ainda mais irritado quando Jem, com um sorriso de canto de boca, lhe deu dois tapinhas consoladores no ombro.
    Jocelyn e Luke também marcaram presença, bem como Maryse Lightwood, a quem eu finalmente pude conhecer pessoalmente. A mãe de Alec e Isabelle parecia sentir-se completamente deslocada ali, mas não rechaçou as tentativas de interação de Catarina e Maia. Eu não diria que morria de amores pela mulher, mas fui receptiva para com ela em consideração ao meu amigo.
    O jantar transcorreu maravilhosamente bem, tirando o fato de que Magnus não estava presente. A princípio preocupado, Alec foi tranquilizado pelo telefonema do namorado, que lhe garantiu que chegaria mais tarde. E ele chegou, bem quando Tavvy perguntava por que Lily não estava comendo e ela, pacientemente, explicava que sua espécie seguia uma dieta muito específica. Foi um gigante eufemismo, mas era uma boa forma de colocar as coisas.
    Alec levantou-se para receber Magnus e, quando este aproximou-se da mesa, eu pulei da cadeira.
    Seu cheiro havia mudado. Ainda se parecia com rosas, argila e bronze, mas faltava algo. Faltava o cheiro de eternidade.
    — O que você fez, Magnus? — perguntei.
    Todos pararam de conversar.
    O feiticeiro sorriu.
    — O mesmo que você, Talita.
    Meus olhos arregalaram-se.
    — Você está bem? — murmurei.
    — Um pouco cansado, apenas. Tessa me ajudou com os encantamentos.
    Alec levantou os braços em um gesto de exasperação.
    — Do que vocês dois estão falando?
    Magnus e eu nos olhamos por mais alguns instantes e eu assenti.
    — Hora da sobremesa — anunciei — Alec, leve Magnus para a biblioteca. Prometo guardar um pedaço de bolo para você.
    Meu amigo, confuso, seguiu o namorado para fora da sala de jantar.
    Malcolm riu.
    — Meu bom Magnus foi muito ousado dessa vez — disse.
    — Não posso discordar de você, Malcolm — falei. E voltei ao meu lugar.
    — Eu diria que você deve contar a todos o que aconteceu, Olhos de Lua.
    Eu ri.
    Mas, só por precaução, segurei a mão de James por baixo da mesa.
    — A verdade — comecei — é que sempre houve um sério conflito no relacionamento de Magnus e Alec, assim como um dia existiu no de Simon e Isabelle. Afinal, Caçadores de Sombras envelhecem, enquanto feiticeiros e vampiros são imortais.
    “Há um tempo Magnus e eu conversamos. Na época considerei, talvez tolamente, a possibilidade de que ele estivesse com ciúmes de minha relação com Alec. Eu deixei bem claro que não tinha qualquer interesse inapropriado por seu namorado e, então, ele me perguntou se eu tinha interesse por outra pessoa. Eu respondi que isso era irrelevante, porque, independente de qualquer sentimento que pudesse ter, eu retornaria ao Céu. A imortalidade estava no caminho do que eu sentia. Mas eu abri mão dela para ficar aqui, então acho que podemos dizer que Magnus inspirou-se em mim. E desistiu da vida imortal.”
    Silêncio.
    Estupefação.
    — O quê? — Luke questionou.
    — Magnus não é mais imortal, meu caro licantrope! — Malcolm exclamou, animado.
    — Ele não deseja uma eternidade onde Alec não esteja — confirmei.
    Não fosse o fato de a campainha ter tocado, quebrando o choque que tinha se espalhado, os presentes à mesa poderiam ser confundidos com estátuas de tão imóveis que estavam.
    Foi Bat quem desceu para ver quem havia chegado e, ao voltar, vinha acompanhado de um homem que aparentava ter mais ou menos a idade de Luke. Seus olhos eram de um azul cristalino e, olhando atentamente, via-se ao redor deles pequenas cicatrizes. Cicatrizes essas que também rodeavam sua boca. As Marcas em sua face, bem como o cabelo que começava a crescer, não deixavam dúvidas sobre quem ele era.
    E mesmo sem tudo isso, seu cheiro seria inconfundível.
    — Enoch — cumprimentei, pondo-me de pé. James me seguiu.
    Curado, o outrora Irmão do Silêncio parecia extremamente bem. Feliz. Refeito. Ele agradeceu-me por tê-lo possibilitado recomeçar. Agradeceu por eu ter me preocupado em enxergá-lo de verdade. Com uma pequena reverência, garantiu-me que eu teria nele um aliado e um amigo sempre que precisasse. E ofereceu-me de volta o recipiente onde antes havia as lágrimas de Rafael. Quando o convidamos a juntar-se a nós para a sobremesa, ele aceitou.
     Mais tarde, quando Magnus e Alec, este com uma expressão abobalhada, retornaram à sala, Jem levantou-se e me puxou com ele. No mesmo instante o cômodo caiu em silêncio.
    — Eu tenho pensado nisso há mais tempo do que você imaginaria — ele me disse — e cheguei à conclusão de que a melhor forma de fazê-lo seria na presença de todos que fazem parte dessa história.
    E então James apoiou um joelho no chão.
    Ah, meu Deus.
    — Talita Landway, eu amo você. Amo sua força, sua bondade e seu caráter. Amo o fato de que, apesar de ter mais de cem anos, eu me sinto um garoto apaixonado quando você está por perto.
    Minhas pernas enfraqueceram ao vê-lo retirar do bolso uma caixinha de veludo.
    — Não há nada em você que eu não ame. Não há nada que diminua meu desejo de tê-la como minha companheira pelo resto da vida. Talita, você aceita casar comigo?
    Eu não conseguia me decidir entre chorar ou rir. Gritar parecia-me uma boa escolha. Gritar para o mundo, em alto e bom som, que sim, eu aceitava. Gritar que ser sua mulher era meu maior desejo.
    E provavelmente eu teria mesmo feito isso, caso, no centro da extensa mesa de jantar, não tivesse brotado uma chama. Alguns assustaram-se, mas só até que o fogo se extinguisse e em seu lugar ficasse uma grande pena dourada. Uma pena que tinha como adorno um olho prateado.
    Eu sorri largamente.
    — Eu acho que isso — Alec disse — é o pai da noiva oferecendo seu consentimento.
    Todos rimos. E Simon – sendo Simon – falou:
    — Isso ou uma ameaça ao noivo.
    Balancei a cabeça com divertimento.
    E ajoelhei diante de James.
    — Quem sou eu para questionar algo que foi aprovado pelo Anjo, não é? — sussurrei. E o beijei para deixar claro que sim, eu aceitava ser sua esposa pelo resto de minha vida.

Os Instrumentos Mortais - Cidade dos Anjos Renascidos (concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora