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• IMOGEN •

A viagem não é de todo cómoda, embora uma Annaleah adormecida nos lugares de trás tente provar o contrário. Sentada no meu lugar, viro-me e reviro-me mil vezes no banco, sem conseguir encontrar uma posição confortável. Para ajudar à minha disposição, o dia realmente está quente e apesar das janelas estarem corridas para baixo sinto-me a desfalecer em suor. Deduzo que como me sinto é basicamente o mesmo que os restantes sentem. Lá está, à excpeção de Annaleah.

Kai mantém-se concentrado na estrada, tentando falar o mínimo. O Rick imita quase na perfeição a sua postura. A tensão está presente, e não sei como posso quebrá-la. Para ser sincera, nem sei se quero.

Conduzimos durante mais meia hora, e só consigo interrogar-me quando chegaremos e esta viagem por fim será dada como encerrada. A minha única distracção é o facto de cada vez nos embrenharmos mais nas Ruínas e eu sentir-me cada vez mais fascinada por estas. Quanto mais entramos no seu coração, mais detoradas se encontram. Quem me dera puder sair do carro e percorrer a distância entre elas a pé.

Coloco a minha mão do lado de fora da janela e deixo-a navegar através do vento. É uma sensação agradável, entre tudo o que aconteceu e que está para acontecer me consiga sentir minimamente calma, nem que seja por cinco minutos. Não vou mentir, aquele nervosismo irritante mantém-se. No entanto consigo mascará-lo por toda a maravilha que tenho a oportunidade de presenciar.

Inevitavelmente, dou uma gargalhada quando o vento me provoca cócegas. Consciente da minha acção, observo os meus companheiros de viagem. Annaleah ainda dorme, Rick nem olha na minha direcção de tão envolvido que está nos seus pensamentos. Porém é difícil não sentir o olhar de Kai em mim. A medo, enfrento-o. Nos seus lábios, existe um pequeno sorriso desenhado. Quase imperceptível, mas está lá.

– O que foi? – Pergunto inocentemente.

– Nada – diz-me, olhando novamente para a estrada. – Acho que nunca te tinha ouvido rir.

Coro de imediato. Não sei como reagir, por isso mantenho-me calada. Kai também não adianta mais.

Cinco minutos passam adjunto de um silêncio constrangedor, até que Rick fala pela primeira vez desde que embarcámos nesta viagem.

– Podes parar aqui? – Suavemente começa a acordar Annaleah. Meio adormecida ainda, e sem perceber onde se encontra, olha para todos os lados com os olhos semiabertos. – Temos de prosseguir o resto do caminho a pé.

Kai encosta o carro, minimamente escondido num beco.

Contente por me ir levantar, apresso-me a sair de dentro do veículo. As minhas pernas estão dormentes e sinto-me tensa em partes do corpo que não sei que existem. Estico-me o melhor que consigo para desaparecer com a dormência. Entretanto todos vão se preparando, agarrando as malas que colocámos de manhã na bagageira.

Isso faz-me pensar que horas são. Dentro do carro perdi completamente a noção do tempo e do espaço. Também não sei onde me encontro. Mas suponho que seja esse o objectivo.

Após tentar ao máximo aprender a voltar a andar, sigo para junto deles para puder agarrar na minha mochila. O peso nas minhas costas obriga-me a entortar as costas. Kai insistiu para que trouxéssemos tudo o que pudéssemos, pois não sabemos quando voltaremos. De certo modo, o facto de ele ter pensado em mim como parte deles aqueceu-me o coração. Nunca tive algo assim.

– Temos somente de atravessar cerca de três quarteirões, não é nada de especial. Chegamos lá rápido.

– O carro fica aqui? – Kai interroga-se, e reparo no olhar que ele dá ao carro como se parte dele fosse aquele pedaço de metal.

– É só um carro, Kai – Annaleah consola-o, confirmando as minhas suspeitas. – Ninguém vai levá-lo, certo?

Rick não entende logo que ela lhe pede auxílio, mas quando se apercebe acerta ao rapaz de que sim, que o carro está seguro ao ficar ali. A custo, Kai tranca o carro e coloca as chaves no bolso das calças. Com a sua mochila preta às costas, afasta-se do beco em passadas largas sem olhar novamente para trás.

Seguimo-lo todos em silêncio. A tensão por estarmos a chegar é demasiado forte para que qualquer um de nós tenha coragem de falar. Não sabemos ainda se realmente é seguro confiar em Rick, ainda para mais quando claramente eles não resolveram as suas divergências do passado. O meu medo cresce à medida que avançamos pela rua deserta. A minha mão mantém-se sobre o cabo da minha espada, preparada para qualquer eventualidade.

Filhos das RuínasOnde histórias criam vida. Descubra agora