Capítulo 14: Aquele maldito celular

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A playlist de Tim está pausada na música: Rootless – Youngblood Hawke

"Eu posso sentir você na minha garganta

Você não é bom, mas você é bom o suficiente

Vou lhe dar todo o meu tempo, mas não meu amor"

O discurso do professor Sussurro, ecoou na minha mente durante todo o trajeto do ônibus. Toquei o celular, cogitando se deveria responder Nolan, mas acabei desistindo novamente, sentindo a enxaqueca esmurrando as têmporas. Bom, poderei espairecer esse estresse durante o serviço e rever aquele ruivinho... meu coração deu um solavanco repentino. Sacudi a cabeça, fixando o olhar para a janela, reparando num rapaz ruivo de óculos quadrados, sorrindo. Virei o rosto abruptamente, mas a pessoa do meu lado, não era nenhum pouco parecida com ele, até afastou-se um pouco de mim após o susto. Cacete, qual a merda do meu problema!?

Desci uma rua atrás do ponto da livraria, caminhando sem pressa até o estabelecimento... fechado? Aproximei o rosto da janela, não havia ninguém lá dentro. Estranho. Chequei o horário no celular, o senhor Felipe e Tim estavam bem atrasados, espero que não tenha acontecido nada grave com nenhum dos dois. Uma gotícula minúscula de suor escorreu da minha testa, tratei de retirar a jaqueta e amarrá-la na cintura. Sentei no chão e cruzei as pernas, preferindo dar continuidade ao desenho para passar o tempo. Deslizei a lapiseira pelo papel, puxando os fios do cabelo, pontuando várias sardinhas e detalhando os óculos quadrados... um sorrisinho idiota escapou dos lábios.

De repente, uma sombra esparramou-se pelo papel, atrapalhando minha concentração. Ergui a cabeça, pronto para xingar o poste ambulante, entretanto meu coração pulsou depressa ao perceber que o tal "poste ambulante" era... Timóteo! Fechei o caderno bruscamente e afastei a cabeça para trás, batendo em cheio na parede de tijolos. Ao invés de se preocupar comigo, ele gargalhou alto, apoiando a mão na barriga. Franzi a testa, massageando a nuca dolorida:

– Não é nada educado dar risada de alguém que acabou de ser nocauteado pela parede! - Ele não cessou o riso, o que me deixou ainda mais bravo - Argh, você não presta! Não fale mais comigo! - Ao invés de afastar, Tim deu um passo para frente, quase que debruçando todo o corpo em cima de mim. Uh, isso soou extremamente excitante, mas estamos em local público, não é o momento mais adequado para tais indecências.

– Oh, me desculpe, só queria dar uma espiadinha nesse desenho misterioso, já que parecia bem focado - O rosário bronze e os fios do fone de ouvido dele caíram, ficando na altura do meu nariz, uma canção cochichava dos mesmos, mas não tenho a menor ideia de quem é que está cantando. Tim ergueu o dedo, apontando-o em direção do meu peito - Yu Yu Hakusho? - Encarei a estampa do anime na camiseta preta, o ruivo sorriu de canto, erguendo uma das sobrancelhas - Não acredito que meu colega de trabalho além de ter uma péssima coordenação motora, é um otaku, isso é bem preocupante.

– Vai conhecer meu lado Hiei* daqui a pouco se continuar com essas gracinhas - Cutuquei a bochecha dele, guardando rapidamente o caderno de volta para a mochila. Tim estendeu a mão, desviei o rosto, soltando um grunhido rouco - Eu sei muito bem me levantar sozinh... - Estiquei a perna, sentindo um formigamento desconfortável atravessar pela mesma, além de alfinetadas pontuais de dor - Merda de câimbra! - A mão de Tim continuava parada na mesma posição, ele curvou ainda mais o cantinho da boca. Minhas bochechas coraram, emiti um resmungo frustrado - bom, preciso de ajuda, mas só dessa vez!

Apertamos nossas mãos, fui puxado subitamente para frente, quase despencando todo o corpo no dele. Uma intensa onda de calor, percorreu por cada centímetro da minha pele, aquele cheiro forte de perfume, o shampoo de eucalipto e cigarro. Afastei-me, contendo meus impulsos inconsequentes, vestindo a jaqueta xadrez, fingindo distração. Tim aparentou o mesmo incomodo, enterrando as mãos no bolso da calça e dando um passo para trás. Espiei ligeiramente a camiseta dele, a estampa da vez era do Bob Esponja e como sempre, vestia um casaco enorme de mangas compridas:

Muito jovens para tragédias (em revisão)Onde histórias criam vida. Descubra agora