Os animais da calada noite já estavam cantando quando eu voltei para casa. A rua estava deserta, apenas o vento fazia barulho juntando as folhas caídas do dia, mas eu já estava acostumada com o caminho solitário até minha casa. A sensação do ar gélido passando pelo meu pescoço junto com o silêncio da rua vazia chegava a ser agradável. Acho que passei tanto tempo ouvindo a gravação da música, que precisou ser refeita algumas vezes por causa de pequenos erros, que nem vi o tempo passar. Isso me fazia pensar com meus botões e ainda não queria que Suga fosse a pessoa mais detestável do mundo. Ele era tão inteligente em seus trocadilhos e críticas, como poderia ser um idiota pessoalmente? Sua persona não combinava com quem ele era na verdade.– Eu não acredito nisso, garota. – Minha mãe me olhava com as sobrancelhas franzidas em desgosto, enquanto eu passava do quintal para a sala.
– Boa noite para você também, Hyojong.
– É esse o estilo de vida que você pretende levar pelo resto dos seus dias? – Ela levantou o braço, apontando para mim.
– É, eu ando bem contente com ele. – Exprimi os lábios e olhei para o teto, fingindo estar refletindo.
– E o que você acha que vai fazer as outras pessoas pensarem? – Ela mexia os braços, envoltos nas mangas do seu vestido escuro impecável. Como sua aparência de porcelana. – É essa a reputação que você quer manter pra sua família?
– Não tenho nada a ver com isso...
– Como não? – Ela me questionou, elevando a voz. – É esse o tipo de futuro que você quer ter? Com essas roupas imundas e essas saídas com gente esquisita, como espera que consiga arranjar um homem que queira casar com você?
– Bem, talvez eu não consiga me casar.... – Murmurei, sem ter coragem de rebater de frente.
– Você tem sorte de ter nascido com um rostinho bonito e um dna tão bom. Com sua falta de maneiras e bons costumes, ninguém nunca iria se interessar por você.
– Minha personalidade é inútil, então?
– Se alguém te conhecesse pela sua personalidade, pode ter certeza que nenhum homem iria querer ficar perto de você!
– Muito obrigada pelo incentivo. – Caçoei. Eu estava incomodada. Mas não disse mais nada.
– Eu só quero abrir seus olhos, Yezi! Seu pai quer que você se junte a um dos pretendentes dele e tudo que você faz é fugir ou ficar se juntando aos porcos! Você nunca honra sua família!
Bem, parecia que honrar a minha família era me humilhar em frente a todo mundo. Usar aqueles vestidos apertados que me incomodavam, laços na cabeça que me deixavam como uma criança ridícula e ficasse ouvindo as seduções baratas completamente desnecessárias de homens velhos e nojentos. Que caminho de vida para se seguir... Eu continuei quieta.
– Você precisa se portar como uma Lee, Yezi. E esse é o único ano para que você decida o destino que fará com sua vida. Você sabe quais são as vontades do seu pai... – Ela tentava me convencer com suas palavras manipuladoras.
– E quais são as suas vontades? – Perguntei, sem saber mais o que dizer.
– Não seja idiota, eu sou uma mulher de família. Minha única vontade é servir o meu marido e o fazer feliz. Enquanto ele estiver inquieto com você, eu ficarei também.
Eu iria rir se pudesse. Puta projeto de vida, não ter suas próprias ambições. Eu só queria que existisse um jeito de fazer meu pai se sentir orgulhoso de mim, sem que eu precisasse me casar com um velho gagá que arruinasse os meus próprios projetos pessoais. Eu só gostaria que ele me notasse pelo o que eu realmente sou, ao invés de me desprezar sem nem ao menos lembrar que eu fazia parte de sua família quebrada.
– Yezi, essa conversa é para você pensar. Lembre-se que não vai ter um homem perfeito te esperando por aí e que o seu tempo está acabando. Eu estou avisando. Não fique esperando um príncipe encantado quando você não tem condições de conquistá-lo. Volte para a realidade.
– Claro... – Eu estava exausta na verdade, duas discussões que acabaram com a minha energia do dia e eu só queria que minha existência sumisse. Era irônico ter mais conforto e dinheiro que muita gente e ainda assim me sentir vazia pra caramba querendo que eu nunca tivesse nascido. Ou talvez eu tenha nascido na família errada. Tinha até perdido a fome de jantar. Me deitei na cama, enfiando a cabeça no travesseiro e desejando mais que tudo que meus pensamentos negativos parassem. Não queria acreditar no que minha mãe dizia, porém parecia a verdade. Eu nunca encontraria ninguém. Eu era uma pessoa ruim. Todos a minha volta conseguiam perceber isso. Perceber o quão perdida e desesperada eu estava. Era como se eu sentisse dor física apertando o meu peito de tanta coisa acumulada na minha mente. Era angustiante o quanto eu conseguia me sufocar dentro de pensamentos negativos.
Eu acabei dormindo depois de um bom tempo para repor minhas energias e silenciar as coisas ruins que me perseguiam até na segurança do meu quarto.
Eu só lembro de ser acordada pela empregada, dizendo que alguém queria me ver e estava me esperando no primeiro andar.
Troquei de roupa rapidamente para qualquer coisa desleixada e desci, coçando a cabeça e me sentindo um lixo. Como qualquer outro dia.
– Parece que os papéis se trocaram. O mundo dá voltas. Ou algo assim. – Chanyeol deu de ombros e eu não sabia se o socava ou o agradecia por ter me salvado.
– O que veio fazer aqui? – Parei no final da escada sem saber ao certo o que fazer.
– Olá, pequena Yeji. Parece que você totalmente se esqueceu de mim e está a dois dias sem mandar nenhuma mensagem. – Ele se aproximou de mim. – Só vim checar se você está viva, sabe? Vai que um herdeiro maldito te sequestrou e te transformou em uma das garotas francesas dele?
Por sua frase eu percebi um erro terrível, me distraí antes do final do seu discurso sobre como ruim seria a forma que eu seria retratada nos desenhos pornográficos de um mafioso tarado e o interrompi.
– Ah, merda. Eu deixei meu celular com ele. – Bati na minha testa em sinal de decepção comigo mesma.
– O quê ? – Ele exclamou com os olhos arregalados. – Eu perdi algum capítulo na minha novela favorita, Vida da Lee Yeji? Desde quando ela sai com protótipos de mini Min e se torna tão íntima ao ponto de dar o celular para ele?
– Isso é sério, Chanyeol. Sabe se lá o que ele pode fazer, eu preciso pegar de volta e depois eu te explico os detalhes de como chegamos a esse ponto. Você sabe onde esse maldito açúcar mora?
– Açúcar? Bem, com a urgência no seu tom de voz, vou levar você até o segundo apartamento dele, mesmo que eu não consiga entender nada do que está acontecendo e eu juro que estava atualizado com as novidades há dois dias, quando você parou de me responder.
– Para de fazer drama e me leva logo lá, pé-grande! – Gritei e empurrei seu braço, o incentivando a se mexer.
– Eu juro Lee Yezi, um dia eu ainda vou lhe processar por violência doméstica. Espero que você não vença o caso por ser persuasiva demais. – Ele arrastava os pés, devagar.
Revirei os olhos, desviei dele e fui andando depressa para fora de casa. É incrível a petulância do garoto e o seu jeito de manter sempre a calma e continuar com as brincadeirinhas, mesmo nas situações mais urgentes, como agora. Chanyeol provavelmente era um alienígena de outro planeta.
VOCÊ ESTÁ LENDO
White Noise
Fiksi PenggemarYezi é filha de um dos maiores mafiosos do seu país. Tentando recusar todas as propostas da sua família, ela busca encontrar outro propósito para o seu futuro. Tudo estaria bem até aí, se o filho do principal rival do seu pai, Min Yoongi, não se met...