Capítulo 1.

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Poder. Essa era a palavra que definia o que Aysha tinha sobre mim. Mas agora, ela já não estava ali. Ela nem sequer lembrava do garoto tatuado que sempre a rodeava.

Mas eu a vi crescer, sem ela nem sequer perceber. E mesmo fugindo da verdade, eu percebi que sempre, ela sempre seria o meu pecado.

*****

De fato, ter uma família literalmente oposta era complicado. Minha mãe acreditava que me protegia me mantendo ali, presa em um condomínio fechado com seguranças por toda a parte, enquanto o restante da minha família, comandava o tráfico e vivia do crime.

Eu nem sequer pude conviver com aqueles que eu amava. Eu apenas fui mantida longe de toda a verdade, de tudo aquilo que eu necessitava conhecer.

Em cadernos, eu contava os meus sonhos, os meus desejos e os meus planos. E a verdade era essa, eu não desistiria de conhecer o outro lado. Eu iria além do que me limitavam ir.

E eu conheceria aquilo que chamavam de pecado.

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"- Aysha, não!" - Mamãe diz eufórica do outro lado da linha.

- Tchau, mãe. - desliguei o telefone e limpei a lágrima que insistia em cair.

Diego adentrou o quarto e me observou sentada no chão, com minhas coisas jogadas por todo o lado.

- Nosso pai está te chamando. Parece que o assunto é sério. - disse baixo, com receio de suas próprias palavras.

- Quando isso vai acabar? - pergunto.

- Aysha, é pelo seu bem. - ele pensa um pouco antes de continuar. - Principalmente agora que o filho da Grazy assumiu o comando do Vidigal.

- E o que merda eu tenho a ver com isso, Diego? - me levanto irritada.

- Tudo tem um vínculo. E o seu é o maior deles, o problema é que não se lembra.

- É incrível que você sabe de tudo, mas eu não posso saber sobre a minha própria história. - faço ênfase na palavra "eu".

- Só vai lá, depois a gente resolve isso. - diz e sai do quarto de cabeça baixa.

Diego e eu tínhamos uma união que muitos irmãos não tinham. Éramos inseparáveis e sempre que discutíamos, ficávamos extremamente chateados.

Desci as escadas e encontrei meu pai no sofá, junto a Grazy. Conversavam baixo sobre algo que parecia ser muito sério.

- Aysha... - diz ao perceber minha presença no cômodo. - Precisamos conversar sobre um assunto.

- Diz. - falo sem expressão alguma.

- Eu sei que está sendo difícil pra você ultimamente, mas precisamos que entenda o nosso lado...

- Pai, por favor, só vai direto ao assunto. - peço.

- Vamos ficar fora por um tempo, e você precisa ir com...

- Eu não vou, desculpa.

- Aysha, você não tem escolha. - me interrompe.

- Na verdade, tenho sim. Não sei se lembra, mas há alguns meses eu me tornei maior de idade. Então eu posso muito bem fazer o que quiser da minha vida. - respondo impaciente. Eu odiava ser grossa com quem não merecia, não gostava de respondê-lo dessa forma, mas acreditava que era necessário, porque eu estava cansada de tantas mentiras.

- Allan... - Grazy chama sua atenção. Eles se encaram por alguns minutos e então ele solta um longo suspiro.

- Eu não posso, querida. - diz ainda encarando-a. - Lamento Aysha, mas terá que vir. Eu prometi a sua mãe que cuidaria de você.

- E eu não irei repetir tudo o que eu acabei de falar aqui. Você já sabe a minha resposta.

Subo as escadas na maior velocidade possível e tranco a porta. Pego uma mala e coloco menos da metade dos meus pertences ali, a enchendo por completo. Em uma bolsa, os documentos, meu caderno e alguns outros objetos.

Ouço uma batida na porta e me desespero.

- Aysha? É o Diego. Abre aí, é rápido. - pede do outro lado.

Droga! O que raios eu faço agora?

Respiro fundo e vou na minha única opção, destranco a porta e encaro o garoto alto a minha frente.

- Eu sei que você vai fazer alguma loucura. Te conheço o suficiente pra saber de tudo que envolve você. Olha, eu não posso dizer nada, mas procura a Melanie, ela participou da história tanto quanto você. - diz me olhando da forma mais carinhosa possível.

- Por que você sempre sabe de tudo?

- Porque eu tenho ótimos ouvidos. - sorriu. - Agora pega. - diz e me entrega um pacote. - Tô aqui pra tudo.

- Eu amo você. - digo e ele retorna ao seu quarto.

Fecho a porta e abro o pacote, encontrando uma quantidade absurda de dinheiro.

Esse garoto tem sérios problemas.

Coloco o pacote dentro da bolsa e ando até a janela, encarando o céu escuro. Já estava prestes a dar dez horas e então vou até o banheiro. Tomo banho, visto uma roupa confortável, faço minhas higienes e termino de arrumar todo o quarto, procurando algo importante para ser levado.

Entro em um site seguro de viagem e compro a última passagem que havia para o Rio de Janeiro. O ônibus partiria em algumas horas, e eu precisava preparar tudo até lá.

A viagem duraria poucas horas, então se partisse no fim da madrugada, chegaria no início da tarde.

Desço até o andar de baixo e analiso se ainda há alguém acordado. Após percorrer por toda a casa, vou até o quarto de Diego, abro a porta e o chamo até que acorde.

- Aysha? - pergunta sonolento.

- Tô saindo, me ajuda aqui. - peço e volto para o quarto.

Pego a mala e a bolsa e sigo para o corredor. Diego para em frente a porta e mexe a cabeça em repreensão.

- Você é louca. - sussurra.

Ele pega a mala e a leva até o primeiro andar, o acompanho e assim que chegamos no portão, o abraço me despedindo.

- Eu volto logo, não se preocupa. - digo após soltá-lo.

- Se cuida. E eu amo você.

- Recíproco. - solto um riso e olho pela rua, a procura do carro que eu já havia chamado.

Assim que o motorista chega, peço para colocar as coisas no porta-malas, e no mesmo instante lembro de algo extremamente importante.

- Eu volto em um minuto. - digo e entro correndo enquanto Diego me observa sem entender.

Subo as escadas fazendo o menor barulho possível e entro em meu quarto. Sigo até o guarda-roupa e o abro, em busca de uma caixinha que se mantia escondida em meio a algumas roupas. Assim que a encontro, confiro se o colar ainda se mantinha ali e retorno para o carro.

Essa era a tão sonhada hora.

A Filha do ComandanteOnde histórias criam vida. Descubra agora