Capítulo 23

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Lord Hartford tirou os óculos de leitura e escaneou a sala. Todos os olhos estavam fixos nele com grande expectativa e cada um tinha um diferente tom, que ele tentou ao máximo decifrar.

Primeiro, reconheceu os de Henry Bentley no meio; olhos amigáveis, mas amedrontados. Ao redor dele, um grupo de olhares esperançosos de pessoas que volta e meia davam-lhe um tapinha nas costas, oferecendo algum conforto. O sr. Hawkins também estava perto dele e de um rapaz magrelo que ele nunca havia conhecido. Os dois mordiam os lábios incessantemente.

No canto próximo à porta, um grupo de moças dava as mãos e engolia em seco, fechando os olhos por breves momentos como se estivessem em uma conversa silenciosa com Deus.

Devido à distância, ele não podia ter certeza, mas parecia que suas filhas estavam entre elas, num forte e ansioso abraço.

Na fileira da frente, ele pôde ver olhares ameaçadores, como o de Anthony Murray; ele encarava-o diretamente como um lembrete de seu último encontro, o dia em que ele sugerira que sua carreira dependia daquele resultado.

John respirou profundamente e massageou as têmporas.

– Nosso país tem sofrido muito com a instabilidade política nos últimos anos e embora o próprio governo e as leis sejam demasiado recentes, também são bastante claras – disse ele. – Em qualquer caso em que a autoridade e integridade do governo está ameaçada, as práticas políticas devem ser reduzidas, o estado de sítio deve ser decretado e mais poder deve ser dado ao Parlamento.

A multidão se agitou e Lord Hartford teve de pedir silêncio no tribunal ao menos umas duas vezes antes de continuar:

– No entanto, – ele ergueu as sobrancelhas –, não são estas as circunstâncias do caso.

Murray inclinou-se no assento, apoiando-se em sua bengala.

– Aliás, – continuou John –, evidências recentes mostram que Vincent Sutton não esteve envolvido em nenhum tipo de investigação, o que sugere que ele foi liberado da prisão por uma ordem direta de um membro do Parlamento, não por sua colaboração. Também não há nenhuma evidência de que Sutton obteve qualquer ajuda de civis nem no planejamento do ataque e nem em sua fuga. Está claro que as reuniões informais e regulares que discutem as ações do governo não tiveram impacto direto nas ações de Sutton e por isso não devem ser proibidas.

Ele fechou suas anotações e cruzou os dedos sobre a mesa, suspirando. Então, encarou brevemente o teto, ignorando os burburinhos que tomavam conta da sala novamente, mas sua atenção foi recobrada quando ouviu alguns gritos como "Sim!" e "Isto é um ultraje!".

– Quando ainda um jovem rapaz no início de minha carreira, – ele começou –, eu estava desesperado para manter minha posição na Ordem. Eu tinha uma língua rebelde e costumava falar coisas que, como pensavam os poderosos, não deviam ser faladas; portanto, tive de adaptar-me. Eu parei de incomodar aqueles acima de mim com meus valores e aprendi a simplesmente seguir suas regras, pois estava tão determinado a tornar-me poderoso o suficiente para tornar meus princípios em realidade, que desisti deles.

A sala permaneceu em completo silêncio.

Na fileira da frente, Anthony Murray bufou e travou a mandíbula. Sua vontade era de arrastar Hartford para fora dali a pontapés.

– Na minha opinião, ninguém deveria ter de desistir de sua própria voz em troca de segurança, pois uma paz sem ela não é paz, é medo – disse John encarando a multidão solenemente. – Uma lei que permite diminuir qualquer ser humano ou tira-lhe o direito de expressar seus pensamentos e desejos não é lei, é um duro golpe contra a própria essência humana.

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