Capítulo 17.

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Quando eu finalmente sentei na cama do dormitório que ficaríamos, eu percebi que Bernardo tinha razão. Ali era, de fato, estável. E não tinha cheiro de maresia. Eu respirei fundo sem medo de sentir meu estômago revirar.

— Está sentindo vontade de vomitar, ainda? — Bernardo quis saber.

— Não. O remédio me ajudou. — eu sorri.

— Você se importa em ficar um pouco aqui, sozinha? Eu preciso falar com o capitão sobre umas rotas seguras para ele pegar até Fernando de Noronha...

— Claro que não me importo, Bê. Pode ir. — respondi. Ele me beijou a testa e saiu.

O meu instinto foi rápido em correr até o banheiro e tirar minhas roupas imediatamente. Fui até a cabine de chuveiro e liguei-o, deixando a água quente cair por todo o meu corpo. Deixei a boca aberta e a enxaguei com a água. Era bom não sentir nenhum gosto ruim em meus lábios. Eu peguei os pequenos frascos de shampoo que ali havia e os esfreguei em meus cabelos. Não era o melhor dos produtos e o melhor dos banheiros, mas era um banho. E eu estava precisando de um.

Eu tinha acabado de fechar o registro e aberto a porta da cabine. Alcancei uma toalha e me enrolei nela, parando em frente ao espelho que havia em cima da pia. No mesmo instante, a porta do banheiro se abriu.

— Pensei que não voltaria nunca — falei, me virando na hora para dar de cara com um homem desconhecido, as roupas desgrenhadas e botas de couro no pé. Eu abri a boca para gritar, mas a mão grande dele a tapou na mesma hora. Eu me debati conforme ele tentava segurar meu corpo e tapar minha boca, mas quando ele me arrastou para fora do banheiro, eu vi que não tinha como fugir.

— Eu falei para esperar a garota se trocar — a mulher, a dona da voz que estivera na casa de Bernardo, disse. — Você é um incompetente. — ela rolou os olhos claros e cruzou os braços, jogando para o lado uma das mechas loiras que caía sobre seu rosto. — Olha, querida, o seu querido Bernardo não vai se machucar se fizer o que a gente está pedindo. Está entendendo?

Eu não tive tempo para pensar. Apenas fiz que sim com a cabeça e o homem me empurrou para dentro do banheiro, me jogando as roupas que eu usara anteriormente. Eu tentei vesti-las o mais rápido possível, mas com as mãos tremendo e o coração pulsando loucamente, era impossível. Quando eu estava pronta, olhei em volta. Não havia uma janelinha sequer para que eu conseguisse fugir. Merda.

Abri a porta do banheiro e lhes lancei a expressão mais piedosa que eu conseguia fazer.

— Ah, querida. Não tem como fugir. — a mulher disse, antes de um dos homens ao seu lado vir para cima de mim e me afundar no rosto um pano com uma droga qualquer. Eu apaguei na mesma hora, deixando meu inconsciente preso à imagem dos cabelos loiros e olhos azuis da mulher.

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— Acorda! — eu ouvi a voz masculina gritar, no mesmo instante em que o barco em que eu estava chacoalhava. Eu abri meus olhos, assustada, com o coração pulsando loucamente em meu peito. Olhando em volta, tudo o que eu via era água; e a velocidade com que aquele barquinho era pilotado me deixava enjoada.

— Nós já estamos chegando, docinho — a mulher disse. — E precisamos de você acordada para nos mostrar onde está o tesouro, não é?

Eu franzi o cenho.

— Onde estamos? — eu perguntei.

— Chegando em Fernando de Noronha, né? — ela rolou os olhos, entediada, e voltou seu rosto para algo que eu não enxergava. Eu olhei para além do piloto do barco e vi a ilha se aproximando, suas paisagens rochosas e a água clara.

— Por que estamos aqui? — eu me fiz de desentendida, encolhendo-me enquanto sentava ao chão.

— O tesouro, querida, o tesouro. Nós queremos que você mostre o tesouro.

— Que eu saiba, ele não está ali. — eu rebati.

— Que eu saiba, o papai Pedro Cabral nos contou, minutos antes de morrer, se nós não matássemos seu filho.

Eu arregalei os olhos.

— Acontece que — a mulher continuou — nós achávamos que seria algo fácil. Algumas cavocadas na areia e encontraríamos um baú enorme. Infelizmente, precisamos de algo mais. E você vai nos mostrar.

— Mas eu não sei... — minha voz fugiu.

— Ah, docinho, eu sei que não. É por isso que pegamos você. Para fazermos uma troca com aquele idiota do Bernardo. Ele nos dirá onde está o tesouro e, em troca, nós te devolveremos sã e salva. Não é lindo?

Eu senti vontade de socar sua boca. Respirei fundo, tentando me concentrar, primeiro, em não vomitar.

Conforme nós nos aproximávamos da praia, eu pude ver a beleza do lugar — algo que eu pretendia ver ao lado de Bernardo, e não daquela forma. O céu estava tão límpido, sem nuvem alguma, que parecia ser a única coisa capaz de me acalmar. Eu me foquei no azul-claro e só tirei minha atenção do céu quando o barco parou na costa da ilha, a mulher e seus homens pulando na mesma hora. Eu me levantei, por último, e desci, caindo com os pés na água clara, conseguindo, até mesmo, ver alguns peixinhos se afastarem.

— O que fazemos agora? — um dos homens pediu.

— Agora... — a mulher se virou para mim. — Nós esperamos. Bernardo não deve demorar. — e, em seguida, ela sinalizou para um dos homens ir até mim. Ele obedeceu, pegando firmemente em um dos meus braços e começando a me empurrar pela areia, guiando para dentro de um caminho de palmeiras e gramíneas. Se Bernardo estivesse, mesmo, vindo, eu esperava que ele tivesse um plano. A única coisa que podia nos dizer onde o tesouro estava era a bússola que ele tinha, e eu sinceramente esperava que ele não me trocasse por ela. Não com todos os sonhos e planos que ele tinha para fazer com o tesouro.

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