ATO 41

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O castigo foi feito para melhorar aquele que o aplica.

O castigo foi feito para melhorar aquele que o aplica

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     As ruas de Londres estavam vazias. O céu cinzento. Relampeava mas não chovia. 

     O vento forte quase me empurrava para longe. Tive que apertar a vista para enxergar um vulto no fim da avenida principal. Um vulto que se aproximava devagar. Pompoo trajava um vestido roxo-turquesa, muito mais cumprido que seu antecessor. Sua calda parecia interminável. Seus cabelos dançavam no vento. Ela segurava uma bengala dourada, mesmo não estando manca de nenhuma das pernas. 

     Os olhos da megera me fitavam. Conforme avançava, de passos arrastados, tudo apodrecia atrás dela. As pinturas dos carros estacionados, das paredes dos prédios e das lojas abandonadas. Cada batida no chão que sua bengala tocava, mais coisas se deterioravam. Nenhum de seus ferimentos estavam amostra. Pompoo voltara á perfeição como se em nenhum momento fosse desfigurada por meus punhos. Calafrios rondavam minha carcaça. Não senti medo mas temia pelo pior. 

      — Bem vinda de volta, Pandora — uma voz ecoou de todos os cantos. Era dela, mas sua boca não mexia — Sua mente apodrecerá aqui, para sempre — Pisquei os olhos. A mulher surgiu em minha frente, avançando e derrubando-me no chão. Ambas caímos no asfalto mas não senti o impacto da queda. O chão rachou sob nossos pés e caímos em um buraco profundo. Rodopiamos no vento. Ela me golpeava com socos e tapas e eu prendia em seus cabelos, puxando-os. Despencamos como um cometa voraz. A negritude clareou e quando percebi, estávamos em queda livre no céu azul. A pressão do vento nos espremia, mas não deixávamos de trocar golpes. Criaturas aladas voavam em todas as direções, com asas enormes e cabeças de bodes assustadoras. 

     Consegui uma brecha para golpeá-la na cabeça com um soco. Ao realizar o ataque, encontrávamos levitando no mar. Não houve queda. Nos teletransportamos para o fundo do oceano e meus ataques ficaram lentos e pesados. Pompoo olhava para mim como uma sereia olhava para o pescador. Sua roupa estava diferente. Trajava um vestido branco que ondulava nas águas. Ela agarrou em meu pescoço e fincou suas unhas na minha pele.   

     Não consegui me desprender. Polvos com cabeças de peixe-espada nos rondavam feito presas. Pelo menos vinte deles estavam ali.

     Uma enxurrada de água entrou em meus pulmões quando gritei de dor. Fechei os olhos e o segundo seguinte senti frio. Muito frio. Meu corpo tremia da cabeça aos pés. Agora estávamos de pé em uma ponte extensa de madeira, que balançava perigosamente. Em volta, montanhas cobertas de neve. Pompoo se firmou em meu pescoço, apertando o máximo que conseguia. Seu vestido estava preto e repleto de penas em seu colarinho. Os ombros cobertos por plumas bem aquecidas e luvas pretas em seus braços que o cobriam por completo.

     Meu bastão estava comigo, já em mãos.

     Me desvencilhei batendo o joelho em seu estomago. Pompoo me soltou e sacou sua bengala. Trocamos golpes ágeis com as armas. Mal tive tempo de retomar os sentidos. Eramos duas espadachins em uma ponte mortal, sustentada por correntes enferrujadas que balançavam. Abaixo de nós, o abismo. Pompoo permanecia seria. Caminhava para frente, e eu, para trás. Seus golpes eram muito mais potentes que os meus e o frio castigava-me. Minhas vestes se resumiam em uma camiseta de manga curta e um shorts apertado. Claramente todos os cenários davam vantagem para a diretora.

     — Se morrer neste sonho, pode apostar que não vai mais  acordar — Disse ela me afugentando para o final da ponte, onde criaturas de pelos brancos e dentes afiados nos esperavam. A primeira a pisar no terreno provavelmente seria brutalmente devorada. Revidei os ataques de Pompoo, andando para frente e forçando-a a caminhar para trás. Usei o bastão para destruir as tabuas de madeira que formavam a ponte. Muitas delas se desprenderam e caíram penhasco abaixo.

     — O que esta fazendo?! — questionou surpresa.

     — Garantindo que nós duas não acordemos mais — peguei em seu ombro e a puxei para o buraco formado na ponte. Ambas caímos mais uma vez, em direção ao precipício. No ar, usei o bastão para atingi-la nas costas. Pompoo se contorceu e o golpe nos distanciou enquanto caíamos.

     Em volta, tudo era breu. A queda já não era tão dolorosa quanto a primeira. Caímos em um terreno macio, de barriga para baixo. Estava quente. Minha boca e meus cabelos estavam repleto de areia. Quando levantei, o cenário tomou forma e revelou um enorme deserto. As solas de meus pés esquentavam rápido. Não avistei Pompoo em canto algum. As ondas de calor formadas pelo sol distorciam a paisagem. Um pouco além, cascatas de areias desciam dos morros como cachoeira. Foi quando senti o chão se mexer e as areias trepidarem ao redor. Uma serpente gigante emergiu do solo, arremessando camadas de areia por todos os lados.

     Corri o mais rápido possível, mas era como andar em neve. Meu corpo fazia um esforço sobre-humano. A serpente deslizou até mim abrindo sua boca. Parei de correr e a observei. Encostei em meu bastão e o saquei ali mesmo. As pontas afiadas, metálicas, ficaram amostra em sua parte da frente. Fechei um dos olhos e mirei na criatura. Ao se aproximar para dar o bote, arremessei a arma em sua boca, furando sua garganta por dentro. O bicho se contorceu na areia e entrou novamente para o solo.

     Perdi o bastão. 

     Eu precisava sair dali. Não demoraria até ele voltar.

     Escutei mais risadas. Elas aumentavam e espalhavam-se no ar. Meus pés afundavam na areia conforme avançava. O calor estava insuportável e as risadas, perturbadoras, mas não poderia fraquejar. Se demonstrasse qualquer cansaço, Pompoo destruiria-me. 

     Meus passos ficaram mais lentos. Em minha volta, todo o chão macio começara a se desprender, levitando no ar. Um redemoinho inverso, abrangeu-se no céu e as areias giravam em torno de mim. O furacão acumulou tanta areia que não se via mais nada a não ser aquilo. Estava no centro dele. O vento arejou meu corpo mas muitas partículas de pó caíam em meus olhos.

     — PARE DE BRINCAR COMIGO! DESGRAÇADA! APAREÇA! — Bradei, usando os dois braços para proteger meu rosto. Minha voz ecoou pelo furacão e de repente, se desmanchou, causando uma chuva de areia ao redor. Quando olhei para o cenário, ele já não era mais desértico. O chão não estava mais quente e o sol não importunava. 

    Tudo ficara escuro de novo.

    Apenas um gramado era visível no solo e a própria Pompoo, que me observava parada a poucos metros de distancia. A diretora sorriu diabolicamente e andou para trás, desaparecendo na escuridão. Ecos de risadas invadiram a cena. Olhei em todas as direções atenta para qualquer ataque surpresa, mas tudo o que aconteceu, foi a risada demoníaca virar o rugido de uma criatura. O som ofuscou as gargalhadas e prendeu minha atenção. Do mesmo lugar que Pompoo sumiu, uma criatura de quatro patas surgiu.

     Sua pelagem era vermelha e a cor de seus olhos combinavam com seus dentes pontudos: Amarelo. As orelhas iguais a de um morcego, suas patas possuíam garras cumpridas. Em suas costas os pelos eram negros, manchando o vermelho vivo do resto do corpo. Comecei a me sentir mal. Ajoelhei no chão e meu estomago revirou. A criatura não avançou. Observava cada segundo daquilo. Me arrastei para a camada de sombra e desapareci também. Nessa hora, tudo revirou dentro do meu ser. Me debati no chão e senti uma dor latente, pulsante. Não pude gritar. Afinal, o que estava acontecendo?

     Era o pior dos pesadelos.

     Era o pior dos pesadelos

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III - Liberdade Para IrrecuperáveisOnde histórias criam vida. Descubra agora