Glórienn quebrada 09 - Olá. Adeus.

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Em Arton, chegava o entardecer: a noite de Tenebra se aproximava, ao passo que o sol de Azgher deixava os céus. Mas as cores estavam estranhas: um vermelho sangue, que se recusava a sumir. Muitos, no momento, estavam ocupados demais com seus próprios problemas (fome, guerra, morte) para perceber aquele estranho fenômeno. Contudo, aqueles que perceberam ficaram perplexos com aquelas cores bizarras, dizendo uma ou duas preces aos seus respectivos deuses.

Os elfos – pelo menos aqueles que ainda lembravam das tradições passadas – viram aquilo com receio e temor. "A luz morna do amanhecer e do entardecer são os cabelos de Glórienn, guiando os irmãos em conflito", diziam as canções. Por isso, mesmo os elfos que haviam deixado para trás a fé na deusa resolveram, naquele momento, fazer-lhe uma prece honrosa. Com palavras sussurradas, disseram:

"Glória a Glórienn. Sempre linda, sempre bela".

Presa no mundo arrancado por Tauron, no vazio do nada, Glórienn berrava e pranteava sem fim, olhando seus cabelos pálidos, tendo perdido toda a cor violeta. Seus ferimentos expostos – fraturas, rupturas, sangramentos, vivissecções – tudo ardia num nível incompreensível. Sua mente não era mais capaz de focar. Glórienn não conseguia mais raciocinar para além do sofrimento que sentia. Seu nome ia se perdendo, afogado em dor. E, com cada grito, com cada lágrima, brotavam incontáveis vermes e vespas e maribondos, que revoavam sobre sua cabeça, zumbindo, picando, mordendo.

Aos seus pés, a escuridão virava lama. E Glórienn afundava, lentamente, sem qualquer possibilidade de impedir.

Uma espada foi desembainhada, com a lâmina apontada ameaçadoramente.

"Acha que pode vir até aqui e nos intimidar, Keenn?", disse Lin-wu, a lâmina a poucos centímetros do deus da guerra.

"Intimidar? Pelo contrário. Gostaria de instigá-los. Vamos, você está perto. Mais um passo; toque essa lâmina em mim, irmão".

"Acha que temo suas palavras? Eu confrontei a Tormenta e protegi meus filhos dela!", reiterou o deus da honra, "acha que seu bravado insolente me afeta?".

Keenn sorriu com seus dentes feito lápides num mausoléu: "então, brande essa espada contra mim, e verá que não me bastará esforço em espalhar igual terror e devastação que a Tormenta sobre seu povo".

Tauron intercedeu entre os dois, "BASTA! Estão agindo feito moleques! Recomponham-se, a situação é séria demais para litígios inconsequentes!", com um olhar, Tauron censurou Lin-wu, que recuou um passo e embainhou sua espada. Agora, virando-se para Keenn, o deus da força continuou: "não há nada que você queira ganhar com isso, Keenn. Glórienn sofre, e sofre sozinha. Uma dor irrelevante para as guerras em Arton que você tanto adora!".

"Ao contrário, meu belo irmão", Keenn tocou carinhosamente a ponta do queixo do deus da força, "eu tenho muito o que agradecer à minha irmã caída. Graças à burrice e incompetência dela, o mundo está a um passo de uma guerra total. Quem sabe, essa transformação final dela seja tudo o que preciso para conseguir com que esse maravilhoso quadro se torne realidade?".

Tauron se preparou para responder ao deus da guerra, mas foi interrompido pelo grito de Lin-wu:

"Onde está a honra de vocês! ONDE?", dentro de sua armadura, os olhos faiscantes do deus da honra e da tradição observou cada um dos presentes, "Glórienn agoniza de dor em razão de sua própria traição! Ela cometeu crimes imperdoáveis! Ela descumpriu seu dogma basilar e está prestes a se transformar numa força de absoluta depravação! Ela PRECISA SER FINALIZADA! Esta é a ÚNICA solução honrada! GLÓRIENN PRECISA MORRER!".

"Precisa?", a voz veio da velha senhora carregando um cajado.

Tauron sentiu seus músculos retesarem de raiva, "Tanna-toh, por acaso nos irá agraciar com mais uma de suas anedotas ponderativas?".

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