A aposta de Kelda, a escolha de Lend (COMPLETO)

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 Mal teve um tempo de dar seu malditoso sorriso antes que a explosão tomasse todo o aposento. Tudo foi pelos ares! Cartas de baralho (marcadas para trapaça), dados (com pesos alterados), roletas (com ângulos modificados); tudo foi envolto na enorme onda de impacto, inclusive os pomposos participantes das jogatinas: o conjunto mais desgraçoso de diabretes, demonecos, aggeli e sulferes que alguém poderia encontrar naquele pedaço esquecido do espaço.

Tadinhos. Nem tiveram tempo de tirar o aspecto bobo do rosto quando Kelda, após trapacear os trapaceiros e ganhar uma impossível mão de pôquer, tomar para si o grande prêmio da noite: um dado produzido pelas próprias mãos divinas de Nimb, um dado capaz de modificar os sabores da sorte!

Lógico – e previsível! – os maus perdedores não aceitaram que ela tivesse um royal street flush com cartas dobradas (como se eles mesmos não tivessem fazendo esse tipo de coisa, né?). Por isso ela veio preparada com sua mais nova invenção e, realmente, podia dizer que estava bastante satisfeita com o resultado. Uma bomba de vácuo, capaz de gerar uma onda de pressão imensa. Não tão útil assim para causar dano, mas ótima para gerar confusão e, também, propulsão. Tão logo os brutamontes começaram a se levantar de suas cadeiras de cetim acolchoado, já estava disparando o gatilho da bomba que carregava no cinto.

E daí: kabum! Blam! Bloft! Mesas destroçadas, paredes quebradas, e Kelda, empurrada pela fortíssima explosão, foi – perfeita e calculadamente – arremessada pela janela no cassino. Quicando para lá, quicando para cá, Kelda foi se esbatendo nas rochas do pequeno asteroide. Uma situação um tanto dolorosa, é verdade. Mas no geral, tudo funcionou direitinho: a bomba fez 'kabum', e seu traje aguentou totalmente toda onda de pressão.

Foi se levantar. Sentiu os pés tremerem. A paisagem a sua volta começou a rodar. Ok, tudo bem, talvez devesse estar usando alguma proteção melhor para os ouvidos e assim não ter o equilíbrio afetado. Bom, não dava tempo para ficar se lamentando. Tinha apenas alguns segundos antes que a galera do cassino se endireitasse e avançasse contra ela.

Então, começou a correr – meio torta de início, ainda bamba da explosão, mas logo ganhando velocidade. Precisava alcançar a Indecorosa o mais rápido possível. Ela estava ali, estacionada onde deixara: a pequena e rápida nave, com suas asas de barbatana e o formato de uma truta – a boca aberta levava ao interior da nave, e os dois grandes olhos de peixe servindo de janelas. Só mais alguns passos, e Kelda iria conseguir alcançá-la...

Barulho: saindo dos destroços do cassino surgia uma enorme criatura chifruda, com asas de morcego e soltando fogo pela bocarra de presas afiadas. Era o guarda-costas, droga; sabia que ele era durão, mas esperava que teria mais alguns segundos por causa da bomba.

Kelda acelerou o passo. Atrás dela, a criatura enorme bateu as asas e alçou voo, disparando em sua direção. Quando finalmente alcançou a boca da nave truta e adentrava sua embarcação, sentiu um calor horrível às costas. O miserável estava próximo!

Ela suspirou. Corria freneticamente por dentro da nave, seguindo de memória todos os pequenos ângulos e corredores. Ouviu atrás de si um barulho grave, o chão inteiro da nave tremeu. Com certeza, o brutamontes estava entrando pelos corredores estreitos, tentando caber. Novamente, Kelda suspirou. Sabia o que tinha que fazer...

Brogo era um diabruto: como um diabrete, só que maior. Estava acostumado a lidar com convidados indesejados no cassino, mas recebia bem e, por conta disso, não fazia muitas perguntas nem muitas exigências. Mas, caramba, como Brogo odiava esses malditos sklirynei – sempre com suas bugigangas e dispositivos, eram um verdadeiro chute no olho. Achavam que podiam vir no cassino, fazer brilhar alguns trequinhos tecnológicos, e magicamente escapar. Era por isso que Brogo começou a colecionar os crânios dos sklirynei que matava. Nem era por um gosto particular: apenas mesmo pelo incômodo contínuo que lhe causavam. E esta daí, pelos deuses, estava sendo particularmente irritante. Tava pensando em torturá-la um pouco, só por perrengue mesmo. Nem gostava de tortura – não era esse tipo de endemoniado. Mas essa daí merecia! Bombas, nave de corredores apertados, e agora todas essas armadilhas: tiro de um lado, laser do outro, outra bomba. Brogo era um diabruto pragmático e forte: via um problema, batia nesse problema até esse problema deixar de problematizar. Era só seguir em frente, a miserável devia estar tentando se esconder na cauda da nave. Mais um pouco e ia encontrá-la.

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