5 | Anjos

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Subindo a estradinha de pedras até o enorme portão branco da casa de Kurt, senti calafrios cobrirem minha pele quando vi que tudo estava escuro, parecendo abandonado. Ele não estava ali, estava dormindo ou algo ruim aconteceu. 

O cadeado e a corrente eram pesados, foi difícil fechá-los após entrar. Já impaciente, corri até a porta e bati nela, implorando por uma resposta do vocalista. Longos segundos se passaram e nada. Meus dedos sangravam de tanto que eu os mordia. Forcei a chave para dentro da fechadura e empurrei a madeira, sendo envolta pela a escuridão do hall de entrada. 

"Kurt?" Chamei, quase chorando. Nada. Entretanto, vi que seus Vans e seu casaco verde oliva estavam jogados em um canto. Cobain estava em casa. 

Notei um líquido escuro no chão da entrada da cozinha e fui verificar. A estante de bebidas estava revirada e havia cigarros e maços espalhados pelo local, como se houvessem sido objeto da fúria de alguém. Eles foram amassados a ponto da marca dos dedos permanecer. Além disso, alguns tinham marcas de sangue.

Meu Deus. Meu Deus. Meu Deus. Preciso encontrá-lo.

Respirei fundo, tentando manter a calma e o equilíbrio para conseguir subir as escadas, onde percebi mais do líquido escuro. Provavelmente uísque. Novamente, o andar estava completamente sombrio. As cortinas balançavam, revelando a luz da lua e um frio capaz de percorrer por baixo da pele. Meu corpo e coração estavam pesados, pois eu sabia que era melhor não perder tempo checando outros cômodos. Fui direto ao quarto principal.

A porta estava semi-aberta. Senti a esperança de ele estar apenas dormindo, de poder acordá-lo e dar uma bela bronca por ser tão irresponsável. Cobain me daria aquele sorriso aquecedor, afastaria uma mecha de seu cabelo e falaria algo para me fazer sorrir, então pediria perdão e nós passaríamos o resto da noite ouvindo e falando de música.

Uma ansiedade se espalhou por meu peito quando empurrei a porta. A luz estava acesa. 

"Kurt?" Chamei de novo, sem nenhuma resposta. Ele estava deitado de bruços na cama, como se houvesse despencado da mesma forma que eu em meu apartamento. Me aproximei e sentei na beira do colchão. "Kurt? Acorda..." Disse, suave, mas o vocalista nem ao menos se mexeu, o que fez com que meu coração acelerasse. Toquei suas costas e o sacudi levemente, mas ele era pesado e somente sua camiseta saiu do lugar. Ainda assim, nenhum movimento. "Por favor, por favor acorde." Implorei, tocando seus cabelos e rosto. Minha respiração estava tão alta que meus ouvidos desenvolveram um chiado.

"Evelyn..." Virou-se e sorriu. Porém, tinha algo de diferente nele. Sua fala estava arrastada, quase embriagada e seu corpo não parecia funcionar direito, estava mole e descoordenado. "Eu já morri? Estou no céu?"

"Cobain, o que aconteceu?" Choraminguei, querendo entender.

"Eu morri." Riu. "Eu morri, finalmente. Pedi para ver um anjo, para ver você. Agora estou aqui." O vocalista colocou sua mão na minha, tentando apertá-la apesar de não ter forças e em seguida desmaiou. Embaixo do seu corpo, que agora estava de lado, havia um recipiente de remédios completamente vazio e uma nota. 

"Ai meu Deus, Kurt!" Gritei, levantando em um pulo da cama. Um mais um é igual a dois, ele estava tentando suicídio. Senti uma onda de adrenalina percorrer meu corpo, Kurt não estava mais reagindo. Suas veias estavam extremamente roxas e expostas. A vida em seu rosto se esvanecia aos poucos, me levando a loucura. Com as mãos tremendo, peguei o telefone ao lado da cabeceira e disquei o número de emergência. Então, liguei para Dave, que viria em minutos.

"Por favor não nos deixe." Repeti diversas vezes, ajoelhada ao lado de Cobain e segurando seu pulso fechado de forma perfeita e impossível de ser aberto. Seus dedos estavam feridos, ele devia ter socado alguma parede. "Por favor, por favor, por favor. Fique com a gente... Eu imploro, você me deve essa." Falei e beijei sua testa. 

Salvando Kurt CobainOnde histórias criam vida. Descubra agora