19 | Alma Incendiada

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Evelyn's  POV

"Ugh..." Ele gemeu quando nos esbarramos. Tentei ultrapassar sua figura, mas Kurt ignorou sua dor e segurou meus ombros. Comprimi meus olhos, desejando estar tendo um pesadelo.

"Olhe para mim." Pediu no tom suave e doce do início de nossa relação. Relembrar esse detalhe me fez encolher ao sentir ânsia de vômito. Meu estômago revirou-se em desgosto e... saudade.

"Não..." Encará-lo seria como lembrar do peso de tudo que ocorreu, me situar no purgatório dos sentimentos que me proporcionou. Estava bem no meio do paraíso e inferno. "Não há nada de novo para ver. Sei porque está aqui, Kurt." Lágrimas fluiram por meus cílios. Era drogas, óbvio.

"Porque eu levei um tiro." Colocou minha mão sobre a bandagem abaixo da roupa hospitalar. Meus dedos tocaram a gaze e reconheceram o esparadrapo que a prendia contra as costelas do vocalista. Por mais que eu tivesse certeza do que tocara, abri os os olhos e examinei o local.

"O que aconteceu?" Encarei-o, chocada, porém desconfiada. "Problemas com traficante?" Ri breve, sem humor algum, e retirei as mãos do seu corpo. Seu semblante passou de interessado no momento para incredulidade.

"Problemas em morrer, Evelyn." Suas palavras, apesar do teor, saíram leves e naturais da sua boca. Continuei olhando para a janela, para o show que seguia. Tantas pessoas despreocupadas, dançando e bebendo. Eu queria a paz divertida que elas tinham. Deixei as lágrimas escorregarem, já estava acostumada com seu secar próprio, independente de mim.

Minha cabeça continuava processando sua última frase, buscando o real sentido dela, quando ele se aproximou. Meu coração bateu mais rápido. Se aproximou mais. Minha boca secou, o chorou ficou preso na garganta. Cobain me abraçou pela cintura. Mantive meu físico rígido, na mesma posição com o braço apoiado na cintura. Deitou minha cabeça em seu ombro. Tudo em mim estremeceu. Senti seus lábios na minha testa."Te dei motivos para desejar minha morte. Você deveria me odiar..." Começou. Meus músculos desistiram, causando com que meus braços tocassem a lateral de minha cintura e pernas. "Eu queria tanto que não me amasse." Possível. Impossível. Possível. Impossivel. Possível. Impossível. Brigava comigo mesma ao ouvi-lo, sem condições de falar coisa alguma. "Li sua carta hoje de manhã. E, além do tiro, foi a única coisa que senti essa semana. A única. Até a heroína tem falhado. Estou livre há uma semana."

A minha carta. O poema que escrevi. De repente, as palavras tocaram minha língua, e seu gosto me fez retribuir o abraço, finalmente. Selamos, um no outro, nossas palavras. Mesmo que o enlace fosse apertado, estávamos nos libertando das mágoas e tristezas. Kurt reprimia o choro. "Não poderia morrer sem te ver uma última vez. Voltei por você."

Desfiz nosso toque e virei as costas para ele. "Esse joguinho já funcionou uma vez...".

"Esse joguinho" Mudou o tom de voz, enfatizando a última palavra com ironia. "Envolveu a minha vida. Desprezo-a, mas não quando você aparece na minha cabeça pedindo para eu lutar por ela."

"Kurt, por favor, chega." Engoli em seco, sem olhar em seus olhos. A tristeza formigava em mim, bem como o constrangimento. "Onde fica sua ala e quarto?" Passei a mão por suas costas, segurando seu peso. Tentei caminhar com ele, mas rapidamente fui repelida.

"Não, não quero que continue me salvando." Franziu o cenho, quase com raiva. "Eu consigo sozinho, você me mostrou que consigo sozinho.".

Suspirei, sem tempo para lidar com seu gênio forte e meus instintos. "Tudo bem... Olha, não pode ficar vagando pelo hospital a essa hora, Kurt. Não pode fumar aqui também. Onde estão Dave e Krist?" Procurei-os ao olhar para o corredor de onde veio.

Salvando Kurt CobainOnde histórias criam vida. Descubra agora