Em Família

1.5K 85 3
                                    

Cerca de uma hora e meia mais tarde, os dois entravam apressados pelas portas do Centro Médico de Munson. Na recepção, Alejandro disse algumas palavras que pareciam termos médicos e deu o nome do pai deles a uma enfermeira que estava no balcão.

- O pai de vocês ainda está em cirurgia - disse ela, enfim, com as unhas batendo nas teclas do
computador. - Podem subir para a sala de espera no quarto andar. O médico vai procurar vocês.

Foi lá que encontraram a mãe.
Alfonso a adorava. Será que ele era um filhinho de mamãe?

Provavelmente, mas estava se lixando para isso. Era um rótulo que ele se orgulhava de ostentar. Ruth Herrera era, e sempre tinha sido, uma pessoa corajosa e forte. O fato de ser a única mulher numa casa cheia de meninos bagunceiros e com um marido
que passava muitas horas no trabalho teria sido um desafio para qualquer uma, mas ela sempre conseguiu fazer tudo aquilo parecer fácil.

Alfonso não se lembrava de já ter visto a mãe estressada ou infeliz, e podia contar nos dedos de uma
das mãos as ocasiões em que ela havia gritado com ele, com os irmãos ou com seu pai. A mãe tinha uma dose altíssima de paciência e de otimismo, qualidades que usava sem pensar duas vezes para manter os
filhos na linha. E funcionava. Embora o disciplinador da casa sempre fosse o pai, Fernando, era a ele que Alfonso sempre se esforçava para agradar.

- Mãe? - disse ele, do vão da porta.

Ela levantou a cabeça depressa, os olhoscansados e vermelhos. A simples ideia de ela estar chorando despertou alguma coisa ferozmente protetora em Alfonso algo que fez com que as suas pernas percorressem a distância que os separava o mais depressa possível. Ele a tomou nos braços, envolvendo-a num abraço apertado enquanto Alejandro, que não era lá muito de abraços, permaneceu parado um pouco atrás. A cabeça de Ruth batia abaixo do queixo do filho, e o cheiro tão familiar daquele perfume adocicado no seu cabelo já grisalho levou Alfonso a fechar os olhos. Ele ficou assustado ao perceber o quanto a mãe parecia pequena e vulnerável ali nos seus braços.

- Ah, Poncho... - murmurou ela, com o rosto enfiado no peito do filho.

Ele a acalmou com afagos, apertando-a um pouco mais contra o corpo.

- Está tudo bem, mãe. Ele vai ficar bem.

- O que aconteceu? - perguntou Alejandro parado ao lado, num raro rompante de frustração.

Ruth ergueu os olhos, separou-se de Alfonso e estendeu a mão para segurar o braço do outro filho.

- Ele estava consertando o telhado naquela maldita varandinha.

Tanto Alfonso quanto Alejandro fecharam a cara.

- Eu disse que era besteira - continuou ela, esfregando as mãos no jeans e voltando a se sentar. - Mas vocês sabem como ele é.

- Teimoso como uma mula - observou Alejandro, balançando a cabeça. - Onde estava Oscar?

- Tinha ido comprar umas coisas para o jantar. Quando ele voltou, o pai de vocês já estava sendo
colocado na ambulância.

Alfonso se sentou ao lado da mãe

- Papai conseguiu descer antes de...

- Não. - Ruth umedeceu os lábios e os comprimiu. - Ouvi um grito e, depois, um barulhão. Ele caiu
no gramado, mas mesmo assim foi uma queda de uns bons 3 metros. Bateu com a cabeça e... Liguei para a emergência na hora. - A voz de Ruth ficou trêmula, e ela levou a mão à boca - O médico disse a você que estão querendo colocar um stent na válvula dele? -perguntou, hesitante, olhando para Alejandro, que confirmou com um aceno de cabeça. - Mas não sabem qual foi a extensão dos danos no coração.

Alejandro se sentou do outro lado da mãe, passando o braço pelos ombros dela.

- Tenho certeza que vai dar tudo certo. Trouxeram ele para cá bem depressa. Existem tantos recursos
para tratar o coração hoje em dia...

- Eu sei, mas eles estão preocupados... Não faz tanto tempo que...

Alfonso trincou os dentes. Detestava ouvir aquele tremor na voz da mãe. Vê-la assim tão desanimada era ao mesmo tempo estranho e assustador. Adoraria poder dizer alguma coisa que a fizesse se sentir melhor, mas não sabia o quê. Até Alejandro, que era sempre o mais calmo e objetivo dos irmãos, parecia mais ansioso do que o normal

- Oi, gente.

Parado no vão da porta, com dois copos de café nas mãos, estava Oscar. Fazia seis meses que Alfonso não via o irmão desde que tinha voado de Chicago a Nova York para o Natal. Ele parecia tão cansado quanto o próprio Alfonso. Oscar se aproximou, entregou um dos copos à mãe e aceitou de bom grado o abraço de Alfonso.

- E aí, cara? - disse Alfonso, dando uns tapinhas nas costas irmao.

- E aí?

Oscar recuou e endireitou os ombros largos. Os olhos estavam opacos; ele não tinha feito a barba e o cabelo estava bagunçado. Se a situação fosse diferente, Alfonso com certeza teria começado a implicar com o visual do irmão, mas, naquelas circunstâncias, ficou calado enquanto Oscar apertava a mão de Alejandro.

- Alguma notícia? - perguntou.

Ruth fez que não com a cabeça,
apertando o copo de café junto ao peito.

- Que droga! - exclamou o rapaz, antes de tomar uns goles de café. Fez uma careta, olhando para a
bebida com cara de nojo. - Está horrível!

As cadeiras daquela sala de espera eram o pesadelo de qualquer quiroprático, por isso os quatro
acabariam andando para lá e para cá durante boa parte das duas horas que teriam de esperar ali.

Depois de pelo menos mais duas horas, a porta da sala de espera finalmente se abriu, despertando
Alfonso e Oscar de um sono irregular. O médico ainda usava aquele traje verde e a máscara cirúrgica estava pendurada no pescoço. Ele deu um leve sorriso, que fez com que o seu bigode grisalho se retorcesse. Ao vê-lo, Alfonso, antes sonolento, acordou numa fração de segundo. Levantou-se imediatamente, pondo a mão no ombro da mãe, pronto para apoiá-la caso as notícias fossem ruins.

- Sra. Herrera, sou o Dr. Gomes. Fui eu que operei o seu marido.

O médico então olhou para Alfonso e seus irmãos.

- Perfeito - replicou Ruth, fazendo um gesto amplo para indicar os rapazes na sala. - Estes são os
meus filhos. Como está Fernando?

O médico cruzou os braços, e Alfonso sentiu o peito apertar.

- Está na UTI. A cirurgia correu bem. Consegui introduzir o stent e verificar as válvulas, que me pareceram em bom estado. Mas o coração dele está muito fraco. Apesar da boa condição física do Sr. Herrera, dois ataques cardíacos em tão pouco tempo são muita coisa para um homem de 62 anos.

- Posso vê-lo? - perguntou Ruth de imediato.

O médico suspirou de leve.

- Pode, sim, mas só por dez minutos. O paciente precisa de repouso.

Ela pegou a bolsa e o casaco.

Enquanto isso, Alfonso ficou olhando, esperando que alguém falasse mais alguma coisa, e ouvindo o som dos próprios batimentos cardíacos. Fechou os olhos e apertou a ponte do nariz, tentando acalmar a pulsação. Quem falou primeiro foi Alejandro, fazendo perguntas que Alfonso não chegou exatamente a compreender mas que foram muito bem-vindas. Não que elas o tivessem deixado mais tranquilo: Alfonso ouviu o médico dizer, em alto e bom som, que o pai deles ainda não estava fora de perigo.

Quando Alfonso voltou a abrir os olhos, o médico e Ruth já tinham saído.

- E agora? - perguntou Oscar enfiando as mãos nos bolsos da calça.

- Vamos esperar a mamãe e, depois, vamos para casa -respondeu Alejandro erguendo a mão na direção de Alfonso, que tinha aberto a boca para protestar. - Não há nada que a gente possa fazer aqui. Ele está no melhor lugar possível. Podemos vir para cá amanhã logo cedo. Todos nós precisamos dormir.

Alfonso olhou o relógio e viu que eram quase cinco da manhã. Depois, encarou Oscar que deu de ombros.

- Ok - disse Alfonso sentindo-se cansado de repente. - Tudo bem.

Always With You Onde histórias criam vida. Descubra agora