A ferida ainda está aberta

1.2K 84 26
                                    

Desceram do carro e percorreram os seis quarteirões que levavam ao ponto da baía onde haviam sido
construídos os palcos para as bandas. A música dominava o ar da noite, junto com o cheiro da cerveja e do churrasco. Anahi ficou bem perto de Alfonso, enquanto os dois abriam caminho por entre a multidão até um local relativamente tranquilo, perto de um parapeito.

Dali podiam ver o show sem serem empurrados e espremidos pelo público. Alfonso comprou cerveja e cachorro-quente para os dois e eles comeram e beberam, enquanto o céu de verão ia escurecendo. As luzes nos postes e a iluminação presa nos galhos
das árvores começaram a se acender ao seu redor. Alfonso falou do trabalho e dos amigos que tinha em Nova York. Anahi falou da loja e do sonho de expandir os negócios. Falou da primeira vez que Henry se sentou, de quando ficou de pé e deu o primeiro
passo. Contou que ele ficou parecendo aqueles desenhos de ligar os pontos quando teve catapora e de como estava empolgado para ir para a escola em setembro. Continuou falando, adorando a expressão orgulhosa que via no rosto de Alfonso, mas odiando o jeito como seus olhos verdes mel assumiam, às vezes, um ar triste ou revelavam uma ponta de raiva ou de dor. Anahí  parou e se debruçou na amurada.

– Sei que você devia ter acompanhado tudo isso, Poncho – murmurou.

Ele se pôs na mesma posição.

– Devia mesmo. – As palavras foram breves e sinceras. Ele balançou a cabeça. – Mas você fez um excelente trabalho, Annie. É uma ótima mãe.

Ela não tinha imaginado como era importante ouvir aquilo até ele dizer.

– Obrigada. Mas ele torna tudo mais fácil. – Ela se calou por um instante, continuando em seguida: – E vai ser assim com você também. Vai estar presente em tudo o que vier pela frente, e nunca mais vou privar você disso.

Ela tinha escondido tanta coisa dele ao longo dos anos: a gravidade da depressão; como precisava desesperadamente dele, apesar de tê-lo mandado embora; e o filho que tinham.

– Jura? – perguntou ele, baixinho. – Não minta. Tenho que poder confiar em você novamente.

– Sei disso. Juro. Não é mentira.

Alfonso tomou uns goles da cerveja. Ela cutucou o ombro dele com o seu.

– Mas me fale de você – disse Anahi, passando o dedo pela borda do copo. – Teve alguma coisa mais séria com alguém?

Ele fez que não com a cabeça, mantendo o olhar fixo na baía.

– Além de você? Não. Tentei esquecer, tentei seguir com a minha vida e, sinceramente, achei que estava indo bem... Mas, não... Ninguém chegou nem perto...

Anahi odiou a sensação de alívio que experimentou. Na verdade, não tinha esse direito depois de tudo que ela fez.

– E você? – perguntou ele, então.
Ela negou com a cabeça.

– Nem valia a pena tentar.

Mesmo com a música ecoando lá do palco, Anahi e Alfonso continuaram conversando. Quanto mais falavam, mais fáceis as coisas iam ficando. Era maravilhoso perceber ali lampejos da amizade que ela tanto prezava, como nos velhos tempos. Não havia pressão, nem qualquer tensão.

O único momento em que o clima ficou um pouco mais sério foi quando Anahi perguntou a Alfonso sobre o pai dele. Era óbvio que a situação era complicada, por mais que Alfonso se esforçasse para disfarçar. Ela ficou bastante triste, pois sabia como a aprovação de Fernando sempre tinha sido importante para Alfonso.

– Andei pensando... O que acha de eu ir conversar com a sua mãe? – indagou Anahi, meio que
sondando. Alfonso ergueu uma das sobrancelhas, com ar inquiridor. – E talvez também com o seu pai. Na verdade, com a família inteira. Quero dar explicações a eles. Sei que você deve ter falado dos meus
motivos, mas gostaria de ter a oportunidade de esclarecer as coisas eu mesma. Devo muito à sua mãe. Muito mesmo. E sua família também é a família de Henry.

Alfonso olhou de novo para a baía.

– Acho que seria uma boa ideia.
Nem precisava ter dito isso: dava para perceber pelo rosto dele que Ruth estava decepcionada com
ela.

Anahi pôs o cabelo para trás, sentindo-se meio confusa.

– Ok. Vou passar lá daqui a alguns dias. Vamos dar mais um tempo para o seu pai se recuperar.

Percebendo de repente a música que estavam tocando, Anahi deu uma risadinha. Era “I Want It That Way”, dos Backstreet Boys.

– Meu Deus! Isso me traz muitas lembranças.

Alfonso também riu.

– Com certeza. Você me deixava louco com essa música.

Era verdade: ela tinha passado
pelo menos uma semana ouvindo sempre a mesma faixa do CD,
aprendendo a coreografia com Mac e cantando todos os trechos de Nick Carter. Sabia que Alfonso nunca tinha gostado desse tipo de música, mas ele tolerava tudo por causa dela. Lembranças inocentes e despreocupadas atravessaram a mente de Anahi, chegando a deixá-la sem fôlego.

Ela sentiu o rosto quente.

– O meu coração nunca bateu tão forte quanto no momento em que vi você na varanda, esperando por mim, no dia daquele baile do colégio. – Ela se virou para ele. – Sabe, quando eu estava grávida –
sussurrou – e lembrava de algumas das coisas que fizemos juntos, Henry chutava com tanta força... Como se soubesse que era em você que eu estava pensando. – Por um breve instante, um lampejo de saudade passou pelo rosto de Alfonso, mas logo desapareceu. Anahi sentiu o coração apertado. – Detestei o que aconteceu conosco.

Os ombros de Alfonso se encurvaram.

– Eu sei – disse ele. – Também detestei. E continuo detestando, mas...

Alfonso abriu a boca, mas se segurou, contraindo os lábios.

– Fale – implorou Anahi. – Seja honesto comigo. Diga o que sente.

– Eu me sinto lesado, Annie – revelou ele, com os olhos ardentes. – Eu me sinto abandonado. Estou com tanta raiva de você... Não posso... Não me dizer nada foi uma merda. Tudo bem, não precisava me contar pessoalmente. Eu compreendo. Mas podia ter mandado um bilhete ou uma mensagem de texto, ou ter me
ligado. – Ele se aproximou dela, sua raiva mais intensa à medida que as palavras brotavam. – Você me afastou da coisa mais importante da minha vida. Guardou segredo. – Um músculo da sua mandíbula estremeceu. – Que direito você tinha de fazer isso?

– Nenhum – respondeu Anahi – Nenhum direito. Mas eu estava me protegendo. Protegendo Henry.

– Protegendo do quê? – indagou Alfonso, incrédulo. – Cometi um erro, Annie. Cumpri a minha pena. E daí? Continuei sendo o homem que você conhecia, o homem que teria feito qualquer coisa por você, com quem poderia contar e que amaria os dois incondicionalmente.

O peito dele arfava.

Anahi sentiu os olhos arderem. Já fazia tanto tempo que não o via assim tão inflamado... Tinha quase esquecido como aquela raiva era impressionante. Ficou olhando até que a fúria se abrandasse, aos poucos. Alfonso tomou o último gole da cerveja e jogou o copo vazio numa lixeira próxima. Ele enfiou as mãos nos bolsos e ficou se mexendo, inquieto. Demorava um bom tempo para ele ficar tão furioso, e
quase a mesma coisa para recuperar a calma. Anahi apenas esperou, deixando as acusações e o veneno se dissiparem, sabendo que merecia tudo aquilo. Ambos ficaram calados por um tempão. Depois, ela murmurou:

– Vou fazer tudo que puder para reparar isso. Prometo.

Ela encarou Alfonso e ficou impressionada com a intensidade do olhar dele. Sentiu vontade de rir e de chorar ao mesmo tempo. A ausência de qualquer reação foi como um peso entre eles, e algo ficou evidente para ela, tanto quanto se ele tivesse gritado na sua cara: Alfonso não acreditava em Anahí.

___

Um pequeno capítulo pra vocês amores hoje estou muito cansada mais no próximo prometo que será maior 😘😘😘 obrigada pelos cometário e por estarem gostando da história

Always With You Onde histórias criam vida. Descubra agora