19• | Lamúrias e um novo integrante | David 💫

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David Soure🖋

Não tenho recordações de como fui parar nas ruas, desde que aprendi a reconhecer os lugares, as pessoas, não conheço outros lugares a não ser a rua e as pessoas como eu. Achava que havia algo errado comigo, todas as outras crianças de certa forma tinham adultos que moravam na rua como pais, eles cuidavam delas, de mim também, às vezes, por ser amigo das outras crianças, mas não me tratavam como o resto. Recebia todos os dias, quase todos os segundos, olhares de desprezo, nojo de parte dos pedestres e de motoristas que abriam a janela ao passar próximo a mim. Nunca ninguém tinha me olhando como ela olhou. Samantha não me olhou como se eu fosse uma escória da sociedade. Enxergou em mim uma criança normal, um ser humano. Dois atributos que eu próprio não conseguia ver. Crescer nas ruas ouvindo o quanto você cheira mal, recebendo todos os dias palavras que machucam a sua alma, nos torna aparentemente forte por fora, e totalmente destruídos por dentro.

Eu não tinha nada, até Samantha e Lucas se tornarem meus pais. Não sabia o que era amor, carinho, o que era receber um abraço, um beijo de boa noite, nunca tinha ouvido um eu te amo, não tinha dito a palavra papai ou mamãe, muito menos acordado cedo para comprar torta de maçã.

Nos tornamos uma família unida. Papai e mamãe a cada dia preenchia a casa com risadas, boa conversa e me ensinavam a buscar a Deus de todo o coração. Não podia estar mais feliz. Eles não falavam em ter mais filhos, porém conforme fui crescendo desejei ter uma irmã ou irmão. Compartilhava esse meu sonho durante as nossas reflexões e conversas sobre o futuro. Mamãe começou a sonhar junto comigo e, passamos a orar em relação a isso. Quando o teste deu positivo, pensei que a alegria que pulsava em meu coração o faria pular do peito e sair correndo. Era muito maior do que qualquer dificuldade que possivelmente iríamos enfrentar a partir dali. As quais não foram poucas, no entanto, permanecemos unidos, ansiando pelo pequeno bebê. Mamãe antes de ir para a maternidade conversou comigo, nunca esqueci suas palavras.

Mamãe, eu posso ir segurando suas mãos? — implorei com os olhos, não queria deixá-la sozinha, parecia está sofrendo tanto. Ela sorriu e em seguida arregalou os olhos soltando um urro. Soltei suas mãos dando um pulo para trás.

Não fique com medo, meu filho. Assim que sua irmãzinha ou irmãozinho nascer, ficará tudo bem. — ela ergueu as mãos na minha direção chamando-me novamente para perto. — Quero que saiba de uma coisa — disse conforme alcancei suas mãos. — Não poderei estar ao seu lado para sempre, nem eu, nem o seu pai. Mas de uma coisa tenha certeza, Deus jamais te desampará e nunca duvide do cuidado dEle por você. A partir do segundo que eu passar por essa porta tudo pode acontecer. Nós oramos e confiamos no Senhor; confiar nEle é não duvidar nem um pouquinho que seja, ainda que o que planejamos e dizemos crê não aconteça da forma que imaginamos. Sempre esteja preparado para todas as circunstâncias, somos seres humanos, ou seja, um hora precisaremos voltar para Casa, o nosso Lar original. Por mais que o meio de locomoção até lá não seja o mais agradável, porém, Jamais duvide do amor de Deus, e se por acaso acontecer, saiba que Ele jamais resiste a um coração verdadeiramente arrependido. Nunca esqueça o quanto você é amado David, eu amo você mais que a minha própria vida. — Ela terminou e fiquei com medo dela morrer no parto, mas seu conselho não era especificamente para aquela ocasião, mas para uma vindoura que dividiria nossa família.

Quando soubemos que era uma menina, sabia exatamente qual o nome escolher para minha irmã mais nova. Um nome que significava o que nossa família representava, Esperança. Esperança de dias melhores, de um novo tempo, novos sonhos...

Jamais imaginávamos que o motivo de nossos sorrisos um dia se tornaria a principal causa das nossas lágrimas. Nunca me arrependi tanto de ter orado por sua vinda, como ao ouvir as barbaridades que fluíram de sua boca, como uma fonte de água amarga. O que eu queria era voltar no tempo e nunca ter dito que queria uma irmã. Seríamos somente nós três e apesar de ter minhas falhas, jamais cometeria uma atrocidades daquelas diante do corpo da única mulher cuja única coisa que fez foi me amar incondicionalmente. Naqueles segundos Hope conseguiu acabar com o resto de Esperança que me fazia crê que ela ainda tinha jeito. Nenhuma mulher me feriu tanto, destruiu meu coração como Hope fez. Não sei se serei capaz de perdoá-la e muito menos continuar convivendo com sua pessoa como se não tivesse tratado nossa mãe como a pior pessoa do mundo.

Ainda há Esperança (Concluído)Onde histórias criam vida. Descubra agora