Veintitrés

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Muni se foi há cinco dias atrás, quando seus pulmões não eram mais úteis de maneira alguma e seu coração parou de vez. Ela não sentiu tanta dor, se manteve calma durante o momento de sua partida, não se desesperou e nem entrou em processo de negação, aceitou facilmente que tinha chegado sua hora e se foi.

Eu ainda não acredito que fui capaz de deixá-la no momento que ela mais precisava de mim, eu não aceito o fato de que a última coisa que fiz ela sentir foi dor e que sua última lembrança de mim foi de eu a deixando.

-Ross.-Malu me chama, tirando-me dos meus devaneios.

-Oi.

-Eu perguntei como você está se sentindo?

-Bem, e você, Malu?

-Eu estou bem na medida do possível.

Malu veio até aqui para conversar comigo, a senhora Dickinson a convidou para jantar conosco e ela não exitou em vim. Estamos aqui, sentados no sofá após o jantar, tentando conversar sobre tudo que aconteceu, mesmo sendo um assunto delicado. A senhora e o senhor Dickinson nos deixou a sós pois disse que seria mais fácil para mim conversar com alguém que entende melhor o que houve entre eu e a Muni.

-Malu, você não sente repulsão por mim?

-Não tem porque sentir, Ross, você não tem culpa pelo que aconteceu com ela.

-Mas eu a deixei.

-Você teve seus motivos, creio eu, acredito que tudo acontece com algum objetivo.

-Minha mãe também acreditava nisso e sempre me dizia que amar iria doer mais que qualquer coisa, mas eu não sabia que eu teria que passar por uma outra dor, para sentir a dor do amor.

-As vezes só queremos que alguém nos avise que teremos que passar pela dor ou aprender a mudar se quisermos o amor, e também que se quisermos confiança, teremos que dar nosso jeito, mas infelizmente ninguém nunca vai nos avisar isso enquanto há tempo, teremos que descobrir sozinhos.

-É, ninguém nunca vai nos avisar.

-Ross, Muni não deixou de te amar nem nos seus últimos minutos de vida, ela não esqueceu de você nem quando estava deitada naquela cama prestes a partir. Me lembro de uma das últimas coisa que ela me disse, "eu espero que ele esteja bem e que seja muito feliz pois eu o amo e vou morrer o amando. Ross Lynch mudou minha vida", ela com certeza queria que você seguisse em frente sem olhar para trás e é isso que eu recomendo que faça.

-E eu farei, por ela.

-É o que eu espero.

-Eu me lembro da última vez que a vi na UTI, eles me deixaram vê-la antes de doar o sangue, então eu me aproximei dela e acariciei seu rosto por cinco minutos, foram os cinco minutos mais longos e reflexivos da minha vida, eu havia percebido que iria me desesperar se a visse partir, então achei que me retirar da sua vida antes disso, seria o melhor a se fazer, não só por mim, mas por ela.

-Eu te entendo, Ross, pode ter certeza que entendo.-Malu respira fundo.-Como está o Ryland?

-Triste por ter te deixado, disse que sente vontade de voltar e que fará isso assim que puder, ele sente muito sua falta.

-Eu também sinto muita falta dele, trocamos algumas mensagens mas isso já faz uma semana, cheguei a pensar que encontrou outra e me substituiu facilmente.

-Ele não fez isso, só está trabalhando muito, mas sei que ele tentará arrumar tempo para falar com você. Ele te ama.

Malu sorrir boba e suspira, porém logo me olha penosa ao perceber minha tristeza. Eu estava me sentindo vazio, queria tanto poder ver a Muni outra vez, daria tudo para tê-la comigo novamente.

Os Dickinson saem da cozinha, a Halsey trazia uma bandeja com quatro xícaras, ela coloca a bandeja sobre a mesa de centro e se senta em uma das poltronas, o Carl se senta na outra.

-Preparei um chá para nós.-Ela diz.

-Obrigado.-Agradeço pegando uma das xícaras na bandeja.

Todos pegam suas xícaras e então tomamos um pouco do chá em silêncio.

-Como se sente agora, Ross?-Carl pergunta, quebrando o silêncio.

-Melhor, obrigado.

-Ótimo.

-Sem querer ser indelicado mas... você e a senhora Dickinson, voltaram?

Pela primeira vez desde que cheguei, vi eles sorrirem.

-Ai Ross, claro que não, o Carl só está passando um tempo comigo pois nós precisávamos de apoio, então resolvemos apoiar um ao outro.-Halsey explica.

Assinto, pensativo.

-A estufa, como está?-Pergunto.

-Eu estou cuidando dela pois era o lugar preferido da Muni desde que você construiu.

-Posso ir lá, senhora Halsey?

-Claro.

Coloco a xícara na bandeja enquanto me levanto.

-Licença.-Digo, me retirando.

Saio da casa pela porta dos fundos e vou até o jardim, a estufa estava iluminada e do mesmo jeitinho que a vi pela última vez, entro no local e observo tudo. Ele me fez lembrar de cada momento com a Muni. Pego um dos jarros que está com tulipas laranjas plantadas nele, eram as flores preferidas dela, com certeza essas flores me farão lembrar dela toda vez que eu ver uma.

Eu estava disposto a ficar aqui por horas, mesmo tendo sido aqui a última vez que vi a Muni, isso não me incomodou, apenas me fez sentir como se ela estivesse perto de mim e lembrar de cada detalhe seu, do seu cheiro, seu jeito único e seu mais belo sorriso. Muni Dickinson será sempre o amor da minha vida.

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