Uno

513 39 31
                                    

Me aproximo lentamente da porta da casa vizinha para poder fazer o que sempre faço quando me mudo de cidade ou bairro, me apresentar e conhecer os novos vizinhos.

Observo a grande porta pivotante, branca, com vidros laterais que obviamente são fumês. Procuro pela campainha e quando a encontro, toco-a, assim ouvindo o barulho ecoar pela casa, e é então que uma moça de cabelo e olhos castanhos escuros, atende a porta.

-Oi.-Digo.

-Oi.-Ela diz, com uma expressão confusa.

-Então, eu sou o novo vizinho e sempre gosto de conhecer as pessoas do meu novo bairro, eu sou o Ross Lynch.-Estendo a mão para um cumprimento.

-Halsey Dickinson.-Ela aceita o cumprimento apertando a minha mão.

Eu estava tentando não ser curioso, mas não pude deixar de olhar para dentro da casa pela única fresta disponível que a senhora Halsey não conseguia tapar, foi então que reparei em uma garota, ela estava sentada no sofá, com os pés sobre ele, e tinha as costas encostadas no braço do mesmo, assim ficando de costas para a porta, ela lia um livro, estava tão vidrada nele que nada a sua volta parecia importar. No chão, próximo ao sofá, havia um concentrador de oxigênio portátil, a cânula conectada nele, provavelmente estava sendo usada pela garota, eu não vi seu rosto, tentei, mas a senhorita Dickinson reparou na minha curiosidade e saiu, fechando a porta e cruzando os braços.

-Bom, você já nos conheceu, senhor Lynch, somos os Dickinson's. Bem vindo ao bairro e a Miami.

-Foi um prazer e obrigado.-Digo, ao perceber que a senhora Dickinson não me queria ali e então me retiro, assim voltando para casa.

~Muni vision~

-Mãe, quem era?-Pergunto para a mesma enquanto ela fecha a porta.

-Só o novo vizinho querendo conhecer seus novos vizinhos.-Ela explica, vindo até a mim.

-Temos novos vizinhos?-Pergunto animada, fechando o livro.

-Sim.-Ela se senta no sofá.

-Tá, e esse novo vizinho, como é? É jovem, bonito?

Mamãe sorrir...

-É jovem sim, loiro, e bonito.

-E o cabelo, é grande ou pequeno?

-Médio.

-Ai, queria tanto um cabeludinho.

-Meu Deus, que paixão é essa por cabeludos?

-Ah mãe, homem fica tão lindo com cabelo longo.

-Bom, o dele é médio e você me disse que loiros pouco te atraem.

-Bom, talvez ele seja um loiro que me atraia.-Brinco fazendo charme.-Talvez seja esse o meu momento de viver um romance daqueles onde a mocinha se apaixona pelo seu novo vizinho e eles vivem momentos intensos.

-Muni, você está vendo filmes e lendo livros de romance, demais, não se iluda, querida, são só ficções.

-Ah mãe, não corta meu barato, sonhar não custa nada.-Resmungo, arrumando minha cânula no nariz.

-Eu só não quero que você ache que poderá fazer de tudo, sabe? Você sabe que...

-Eu posso morrer a qualquer momento, sei.-Digo, a interrompendo.

-Eu não iria dizer isso, eu iria dizer que na vida real, os garotos vão te magoar sem pensar duas vezes, e amar machuca.

-Mãe, eu sei, os livros não mostram só o lado bom das coisas, sabia?-Respiro fundo.-Eu só queria que alguém me amasse do jeito que eu sou, que aceitasse minhas condições e vivesse comigo por esse tempo que me resta, eu queria viver um romance, eu não tenho medo do amor.

-Eu sei que não.

-Mas eu sei que eu posso deixar uma ferida em todos ao meu redor, então, melhor não viver um romance mesmo.-Digo, pensativa.

-Chega desse papo, isso me deixa nervosa, pensar em você apaixonada.

-Tá bom.-Sorrio.-Vou para o meu quarto, quero terminar esse livro hoje.

-Tudo bem.

Me levanto do sofá e então arrasto meu concentrador até a escada, daqui em diante, tenho que carregá-lo, já me acostumei com isso, não me incomoda mais e afinal, a escada nem é tão grande assim.

Subo os degraus calmamente e assim que chego no topo da escada, arrasto o concentrador até o meu quarto, fecho a porta do cômodo assim que entro. Vou até o meu banco de janela e me sento, deixando o concentrador no chão, abro as cortinas e então através da minha janela de vidro, vejo que a janela de um dos quartos da casa ao lado, está aberta, finalmente, isso por que a casa está sendo ocupada, claro. Não dou muita atenção para isso.

Tiro minha cânula nasal e a deixo pendurada no concentrador, eu posso tirá-la, na maioria das vezes é necessário estar com ela, mas de vez em quando, tirá-la, não faz mal. Respiro fundo para poder receber oxigênio nos pulmões, e só então abro o livro e inicio minha leitura.

Não demorou muito para eu ouvir um "olá" bem distante, direcionei minha atenção para a janela a frente e vi um garoto loiro, ele era lindo. Ele sorrir e acena, sorrio sem jeito e aceno de volta.

-Eu sou o Ross!-Ele se apresenta.

Eu iria me apresentar, mas perdi totalmente o fôlego. Fechei as cortinas da janela e peguei a cânula rapidamente, assim colocando-a sobre os rosto e respirando fundo para receber todo oxigênio possível.

O garoto deve me achar uma maluca por ter fechado as cortinas do nada, mas eu não queria que ele visse meu aparente desespero colocando uma cânula nasal.

Anulei o acontecimento anterior e voltei a ler, eu realmente queria terminar aquele livro ainda hoje e faltavam cem páginas, provavelmente ficarei o resto da tarde e a noite lendo, nada que me incomodará, eu faço isso desde sempre.

afterlifeOnde histórias criam vida. Descubra agora