O Vestido de Época

Capítulo 22

Ano de 1920

Charlize levantou os braços e espreguiçou-se, espichando todo o corpo no colchão. O seu novo quarto era muito agradável com uma confortável cama de casal com dossel, localizada no centro dele. Uma cadeira Luis XV, uma penteadeira ainda maior do que ela possuía antes e uma cômoda branca compunha harmoniosamente a decoração. Assim como no castelo de sua família, na sua casa nova ela possuía uma vista linda, com muito verde para admirar e um quarto de vestir próprio. Anthony manteve tudo em segredo até o momento do casamento, quando ele anunciou animado sua decisão de morarem somente os dois. Ela derreteu-se de amor por ele ao imaginá-los tranquilos no novo lar.

A residência deles era muito próxima de Bertbury Park, o que deixou Charlize ainda mais contente com a decisão do marido. Ela possuía uma pequena equipe que trabalharia para eles, algo mais que suficiente para atender as mordomias as quais estava acostumada. Praticamente todos os dias ela conseguia passar algumas horas no castelo com a mãe, enquanto Anthony dirigia o seu escritório de advocacia ou produzia pesquisas em sua cabana. A vida não poderia ser mais generosa com ela, um marido extremamente carinhoso, que atendia a todos os seus anseios para deixá-la feliz.

Charlize notara que a mãe estava cada dia mais agitada, uma dor de cabeça havia se instalado constantemente e ela aparentava cansaço, mesmo quando negava e dizia estar bem.

Certa manhã, quando estava entrando na biblioteca do castelo, Charlize notou que a mãe conversava com alguém. Ela diminuiu os passos e aproximou-se silenciosamente da porta para ver com quem Sophie falava tão alto. Ela viu a mãe andar de um lado para outro despejando aos ventos suas aflições. O Sr. Hoffmann escutava-a com atenção e tentava acalmá-la servindo-lhe uma xícara de chá, na tentativa de frear os saltos que deslizavam sem dó na batida firme do calcanhar da patroa. A filha escutou claramente o que Sophie dizia sem meias palavras; mais uma vez Daniel causara transtorno por beber sem controle algum durante a madrugada afora. Ele agora herdara Bertbury Park e tinha grandes responsabilidades em suas costas, seus atos inconsequentes geravam falatório e tudo aquilo era péssimo para a reputação da família. Sophie sempre o defendia quando Philippe protestava sobre as atitudes imaturas do filho, ela amava-o e julgava ser o seu papel defendê-lo e protegê-lo. Mas Daniel ultrapassara qualquer limite que a mãe poderia acobertá-lo e agora era tarde demais, porque Philippe não estava ali para ajudar a esposa. A propriedade era enorme, muitos hectares de terra e alguém teria de ser responsável pela administração de tudo aquilo. Ela tentava lidar sozinha com a situação, porém não estava aguentando ver o filho jogar sua vida pela janela.

Charlize conseguiu sentir a aflição da mãe, mesmo sabendo desde o início de que Daniel não seria capaz de cumprir com o seu papel de herdeiro. Era fundamental que a filha entrasse em cena ou a situação financeira dos negócios afundaria por completo. Ela aproximou-se totalmente da porta e simulou uma leve batida, provocando barulho suficiente para que eles a notassem. Cumprimentou a mãe casualmente e sentou-se no sofá para observá-la melhor. Sophie estava realmente com uma aparência cansada, no entanto, a filha decidiu ignorar tudo aquilo para não deixar a mãe ainda mais dramática. Com um gesto carinhoso, Charlize pediu para que Sophie se sentasse ao seu lado e o mordomo serviu um chá para cada uma delas; depois, afastou-se da sala. O Sr. Hoffmann tinha ouvido da patroa lamentações suficientes para a semana, era o momento de dar privacidade para as duas conversarem. Ele sabia que Charlize seria mais racional como o pai, ela era a pessoa certa para apagar o fogo que se instalara naquele magnífico castelo.

– Mamãe, sei que algo não anda bem, você tem ficado muito aflita nos últimos dias. É algo que eu poderia ajudá-la? A senhora sabe que eu me interesso muito pelos negócios da nossa família, não tente me esconder nada.

Sophie soltou um suspiro profundo para aliviar o peso em seus ombros. Ela sabia que Charlize estava com razão em pedir explicações; com certeza, a energia do lugar andava bem diferente após a morte de Philippe.