TERCEIRO CAPÍTULO

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Estávamos a alguns minutos infinitos recepcionando os convidados dessa noite e minha boca continua fechada, até mesmo mamãe está surpresa com a minha atitude, sempre que possuía uma oportunidade sentia seus olhos escuros e críticos em minha direção. Os homens estão sentados nas cadeiras e nós duas no sofá, ou seja, meu rosto está em evidência para vista dos dois homens ao quais inicialmente pensei que nunca veria depois do incidente da sanga. Mesmo após a apresentação educada sigo sentindo minha pele queimar e a mão formigar, minha inquietação sufocando meu peito com o auxílio das vestes, para minha sorte até esse momento ambos os cavalheiros não tinha mudado sua postura distante e indiferente em minha direção.

Suspiro mais uma vez e ergo meu olhar na direção do homem que usava o cavalo negro, agora sabia toda a sua identidade. Tratava-se de Aurélio Albuquerque Brás, seu rosto era-me desconhecido, mas o sobrenome não, os jovens a minha frente são apenas filhos de outro grande cafeicultor da região vizinha da fazenda. Em uma situação normal estaria com minha atenção voltada para as palavras da conversa e as longas discussões sobre o café e a política, no entanto, agora estou com minha cautela voltada exclusivo para as visitas e o medo de algum relato sobre o incidente, até mesmo um olhar invasivo em minha direção. Também tenho cuidado com a atenção de mamãe, seus olhos sempre foi como águias para tudo a sua volta e quando é algo relacionado a mim, sua atenção redobra.

Observo discreta a face do filho mais velho, a forma como todo o rosto reage à conversa, os movimentos de lábios em pronunciar as palavras com cuidado. Aurélio é o responsável em ajudar o pai nos negócios e baseado na minha pequena observação dessa noite, era extremo oposto do irmão. Bento, o rapaz de cavalo branco com pintas pretas, é mais franzino e jovem, passou grande parte da noite quieto completamente diferente da postura na sanga onde fora mais confiante e adulta, agora parecia mais um jovem vulnerável. 

— Então seu pai lhe deu liberdade para administrar uma fazenda? — papai questiona, saiu do pequeno transe e olho para ele. Se existia algo que detesto é esse silêncio nas conversas quando visitas nos acompanham nas refeições ou jantares e não existe outra dama para acompanhar, os homens conversam longamente sobre todos os assuntos e nós somos obrigadas a manter o maior silêncio possível. Posso contar nos dedos quando papai perguntou algo à mamãe sobre as temáticas e a mim, nenhuma vez, — ele informou-me isto há algum tempo, como também confessou seu empenho no trabalho nas fazendas. Acredito que meu amigo, Álvaro está muito feliz!

— Está bem informado, senhor Humberto! — olho de relance para o interlocutor, meus olhos não conseguiu desgrudar muito de seu corpo, numa procura contínua em garantir a minha segurança como também refletir se devo contar para papai a identidade dos invasores, sendo os mesmos sujeitos a nossa frente, — faz algum tempo barganho com papai essa responsabilidade e apenas no final de 91 concedeu-me essa dádiva. O principal empecilho para sua demora em responder fora o uso da fazenda, crescemos todos embaixo dos pés de café, mas tenho outros planos e usarei a propriedade para criar gado de corte. — antes de olhar para papai, o jovem encara-me e pela segunda vez na noite trocamos olhares.

— Pecuária, é uma excelente ideia. — papai afirma balançando a cabeça analisado os planos do jovem, — é diferente dos negócios da família, mas por nossas conversas nessa noite demonstra ser muito determinado e qualificado para tal tarefa, tenho certeza que irá enriquecer com muita facilidade. — sorriu pela frase, reconhecendo a hipocrisia, o mesmo homem que ultrapassou as cercas de uma propriedade e ainda fora audacioso em afirmar que as terras não possuem donos, possuem terras tão grandes quanto papai e ainda iniciará seus próprios negócios com um capital acima de muitos outros iniciantes.

— É bom saber que papai me fez boa figura aos amigos. — sua voz estava seguindo o mesmo ritmo, no entanto, parecia mais sombria.

— A senhorita Francisca toca piano? — Bento questiona-me, olho para ele no mesmo segundo ainda temerosa, tinha sida a primeira vez que alguém falava em minha direção. Seus gritos em nossa primeira conversa invadem minha mente como uma chuva forte, não sinto confortável com sua fala direta, giro um pouco meu olhar na direção do irmão, encarando ainda sua postura impenetrável e indiferente. Visivelmente a única pessoa nessa sala a temer sou eu e por isso, prefiro ficar calada, pelo menos nessa noite, — é um questionamento diferente, mas enquanto vínhamos para essa bela sala, vi o instrumento. Não tenho talento algum para música, porém aprecio.

Amor entre ConveniênciaOnde histórias criam vida. Descubra agora