OITAVO CAPÍTULO

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Uma semana depois, a cidade apresenta-se tranquila em todos os aspectos necessários, é uma visão completamente diferente da movimentação do primeiro dia. Deste a nossa chegada ao casarão não sai, primeiro porque não conheço a cidade suficiente para aventurar caminhar em suas esquinas, segundo por também não conhecer ninguém suficiente para acompanhar em uma pequena caminhada muito além do quarteirão. Aos poucos a casa apresentando-se ao nosso gosto e decoração, o quarto organizado a minha maneira, até a escrivaninha já tem os meus papéis da próxima tradução. Mesmos assim, ainda não compreendo por completo o objetivo dessa viagem repentina para a capital, nem papai ou mamãe deu qualquer explicação. Na verdade, papai passa mais tempo realizando visitas a alguns amigos cafeicultores e comerciantes — aparentemente ele é um dos poucos que ainda mantém residência nas fazendas.

Giro meu corpo e encaro o quarto, é um cômodo menor comparado ao dá fazenda, mesmo assim posso dançar sem bater na cama e muito menos na pequena penteadeira, feitos ambos com um mesmo tipo de madeira escura. Assim com a casa, os móveis são mais delicados e sofisticados em sua arquitetura e detalhes, as cortinas estampadas de florzinhas em cores mais claras também ornam bem todo o ambiente, vejo meus objetos no espaço, vejo meus textos na escrivaninha e sorriu. Minha reclusão na fazenda nunca incomodou-me, a rotina disciplinar com todas as aulas montadas por mamãe e preceptora fora a única realidade conhecida, o mundo fora das cercas era apresentado apenas em páginas de livros e dos jornais. Agora, em São Paulo, posso realmente ver o quanto o mundo é grande e a pespectiva das minhas pesquisas recentes em encontrar um redator e publicar minhas traduções enche-me de frenesi.

Suspiro e aproximo-me da escrivaninha, a luz do sol toca o móvel de forma singela e tímida graças a sua posição, deixando as minhas letras no papel claras e muito visíveis. É uma boa posição para escrever, sobretudo porque a pequena brisa vinda da janela toca minhas pernas quando estou escrevendo, tornando todo o trabalho agradável. Levo meus dedos até o volume de Madame Bovary, seguindo com as pontas dos dedos pela pequena elevação das letras, todo o planejamento da viagem deixou-me completamente distante do trabalho de tradução e apenas agora, uma semana depois da nossa chegada posso retoma as minhas tarefas diárias.

— Com licença. — escuto alguém chamar, viro meu rosto na direção da porta e vejo o rosto da empregada aparecer numa pequena fresca da porta, balanço a cabeça dando autorização para sua entrada.

— Bom dia. — saúdo a moça, a jovem de rosto simples olha para mim de forma indireta, a meu ver ela possuía a mesma idade que a minha, — houve algo? — questiono diante do seu silêncio contínuo.

— Está tudo bem, apenas vim lhe entregar uma carta endereçada à moça. — afirma, a jovem dá um passo à frente e ergue o envelope, olho para ela e em seguida para o papel estendido a minha frente de maneira desconfiada, a única pessoa que pode enviar uma carta é Aurélio, até mesmo as poucas moças que moravam no Vale não falam comigo para uma recepção calorosa a minha chegada. Sorriu pensando na sua surpresa a nossa chegada.

— Mamãe sabe da chegada da carta? — questiono de pronto, ergo a minha mão e pego o envelope de cor amarela, olho para a empregada sentindo meus dedos esquentar ao tocar o papel.

— A correspondência chegou pelas mãos de um menino de recados, d. Isabel não sabe. — afirma hesitante, ela cruza as mãos em frente ao avental branco e dá um sorrindo de lado para mim, — ela inclusive está fazenda leitura no pequeno jardim da casa, nem ao menos viu o menino chegar. — aquiesço e baixo meus olhos para o envelope.

Amélia Andrade

— Obrigada. — agradeço voltando a olhar para ela, não sentindo muita confiança em suas palavras, — por favor, peça para trazer algum refresco, estou com a garganta seca. — a jovem assenti e se afasta no mesmo segundos, saindo de forma sorrateira da mesma maneira que entrou. Mordo o lábio em expectativa, volto a escrivaninha e deixo a carta pousada sobre o livro, sendo tocada de maneira plácida pela luz do sol, a espessura do envelope não auxilia numa leitura externa, ainda hesitante pego a carta mais uma vez e analiso a letra preta redonda e curvilínea, escrita sem respingos de tinta e pressa.

Amor entre ConveniênciaOnde histórias criam vida. Descubra agora