Continuo encarando a escuridão da rua, mesmo com as lamparinas espalhadas pelas calçadas. Minhas mãos continuam pousadas no batente da janela, corpo escondido para o mundo exterior pelas grossas cortinas, sorriu ao perceber ser a última vez a ver essa vista da janela. Há muitas semanas, imaginava uma imagem triste pela perspectiva do casamento na próxima manhã. No entanto, não sinto-me assim, após minha conversa com Aurélio mostrou-se um excelente noivo, assim como transformou em ação todas as suas palavras para com Carolina e o bebê.Suspiro e giro, encarando o quarto mergulhado numa pequena penumbra. Todos os meus pertences guardados em baús, a maioria já estando guardado em minha nova casa a alguns quilômetros desta região, outros objetos tinha vindo da fazenda para a nova moradia. O que ainda acompanha-me nesta noite é apenas pequenas coisas, alguns vestidos para passar o dia, meus cadernos de anotações e o livro da cabeceira. Dou um passo em direção a cama, tocando as ondulações do móvel, mesmo amanhã estando casando com um amigo, ao qual fora bastante atencioso nesses poucos meses de noivado, não posso negar o nervosismo nisso tudo.
Lúcia tentou dizer palavras carinhosas e tranquilas, mesmo sabendo tão pouco sobre casamentos quanto eu, papai apenas reafirmou ser o noivo escolhido fora bom e faria-me feliz e que seria um bom pai, não conseguir dizer que creio não ser uma boa mãe, talvez nem possa tê-los. Mamãe não falou nada durante todo o jantar, apenas observou-me muito calada, na verdade nosso jantar dessa noite fora igual a todos os outros, silencioso e curto, mesmo com a chegada de tia Glória e sua família. Volto a caminhar pelo cômodo, saindo do espaço iluminado pelas velas.
Mesmo assustada apenas por imaginar todos os ocorridos de amanhã, posso imaginar-me distante da figura de mamãe e suas palavras amargas, na verdade esse é um dos motivos para minha felicidade. Ela tinha organizado todo esse casamento apenas para assistir minha infelicidade no matrimônio, em ver as decisões serem tomadas e eu não poder fazer nada para contornar a situação, porém nada realmente se concretizou. Nos últimos meses Aurélio passou a vim mais para o jantar, conversando longamente comigo e também levou-me para um pequeno passeio no jardim público, mesmo tendo nossas conversas observadas, conseguimos nos conhecer.
— Posso entrar? — tia Glória anunciasse sorrateira, sorriu em sua direção, assentindo para que entre. Ela abre a porta e finalmente entra no ambiente, a observo fechar a porta. Tia Glória e seu marido tinha chegado no dia anterior para o casamento, junto a Carlos e Cecília. — imaginei que ainda estivesse acordada, dizem que é a noite para descansar, mas não é fácil dizer isso aos nervos. — sorriu assentindo enquanto aproximasse de mim, tia Glória é a irmã mais nova e acredito que por causa disso sempre fora mais leve e amável, seu temperamento amoroso sempre ficou evidente para mim no fim de cada mês, quando envia os vários jornais com os textos de Machado de Assis dos periódicos fluminenses.
— Realmente, na verdade meu nervosismo está atrelado mais a pensar como será meus próximos anos junto a Aurélio que na cerimônia em si. — afirmo, minha voz soa tranquila, diferente do meu estado de espírito. Tia Glória ainda contida, aproximasse mais, sentando na cama ainda arrumada, — deve compreender os meus pensamentos.
— Sente-se aqui. — tia Glória afirma, no mesmo segundo obedeço, meus joelhos acabam tocando no seu, mesmo com os vestidos cheios de tecidos, depois ela pega minhas mãos e a segura com força, — também pensei que queria conversar com alguém, mesmo a mesa estando mais cheia o jantar fora muito silencioso. Não estou habituada, imagino também que queira falar com alguém. Observei conversando com Lúcia no jardim, mesmo ela sendo muito nova. Aproveite, é sua oportunidade. — abaixo meu olhar para nossas mãos, parcialmente escondidas pela pouca luz.
— Bem, não tenho muito o que falar. — afirmo timidamente, volto a olhar para ela, seu rosto iluminado pelas velas tonalizou sua face de amarelo, — todos esses planos de casamento fora uma surpresa, contudo Aurélio é uma boa pessoa e sei que seremos bons amigos. Teremos uma vida tranquila e agradável, é uma pena que apenas irá conhecê-lo amanhã na cerimônia. — tia Glória faz um pequeno carinho em minha mão, mesmo sendo a única parente de mamãe que conheço, seus traços são completamente diferentes e até mesmo mais parecida comigo, baixa e com curvas.
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Amor entre Conveniência
Ficção HistóricaBrasil, 1892. Francisca Lopes de Castro, filha de um grande produtor de café paulista, acredita fielmente que morrerá solteira. Tendo em vista que, todas as moças da região são casadas, a reclusão na fazenda também reafirma seu argumento, no entanto...