Os passos de papai invadem meus ouvidos com uma violência digna de cascos de cavalos quebrando a terra onde passa. Desde o momento que chamou para seu escritório não falou nada e muito menos deixou fazê-lo algum questionamento, continuo olhando para ele numa ansiedade sem tamanho. Seu jeito taciturno também não transparecer muita coisa, mesmo sendo um sujeito conhecido. A luz entrando nas janelas atrás de si inflama meus olhos, o rosto de mamãe também não desapareceu da minha mente, nessa manhã ela apareceu ainda mais animada e falante. Um verdadeiro milagre, se assim posso dizer, essa viagem a São Paulo está fazendo bem para seu temperamento frio e distante.
- Francisca! - papai faz sua primeira pausa, ficando atrás da cadeira de couro marrom, olha para mim com todo cuidado, seu olhar nunca é de análise e torna o gesto mais acolhedor, - preciso de sua opinião sincera sobre o filho mais velho de Álvaro, o rapaz Aurélio. - sorriu simpática. O medo de terem desconfiado da aproximação de Aurélio na sala das janelas assumiu um canto em minha mente, fora várias tentativas para esquecer e mesmo assim continua assustando-me quando estou distraída.
- Bem, não sei o motivo para tal questionamento nessa hora do dia. - desconverso sem muita alternativa, nossa conversa na sala das janelas pode muito bem ter deixado mamãe desconfiada e na noite no jantar eles estavam muito juntos, não posso comprometer-me nesse momento. - Devo dizer que estou surpresa e também curiosa para saber a fonte desse questionamento, se fosse mamãe não acharia estranho, mas vindo da parte do senhor. Mesmo sendo uma moça inteligente, acho que não preciso ter opiniões formadas sobre todos ao meu redor e além do mais não conheço o sujeito o suficiente, muito menos conversamos por muito tempo. Entretanto, parece ser uma boa pessoa! - encaro papai de forma dissimulada, minha postura corporal não mudará, mas meus nervos começam a queimar como lava.
- Não respondeu minha pergunta, Francisca. - afirma um pouco mais rude, desvio meu olhar para as cortinas fechadas atrás de si, - sua opinião sobre Aurélio, diga apenas o que tem em mente.
- Obstinado. - afirmo seca, essa pelo menos é a impressão que tenta mostrar, papai aperta seus olhos esperando as minhas palavras, suspiro e continuo falando, - é um pouco esperada essa postura, também aparenta muita inteligência, vocês falaram do trabalho sendo iniciando na primeira conversa em nossa fazenda. E gosta dos irmãos, assume bem seu lugar como filho mais velho e responsável, até esse momento não o conheço o suficiente para encontrar defeitos mais explícitos. - acrescentaria senso de humor a lista, digo a mim mesma. Volto a encarar papai com mais atenção, ele suspira e muda sua posição saindo detrás da cadeira e sentando na mesma. Por alguns instantes não vejo apenas meu pai, mas, sobretudo o cafeicultor e esse fato não me deixa confortável, o pior disso tudo é a atenção a todos os meus gestos. Não há nada para chamar sua atenção senão eu.
- É bom saber que tem tais opiniões sobre ele. - fala sem demonstrar emoções, continuo olhando para papai com muitas dúvidas, fazia muito tempo que não me chamava para seu escritório. Pior, essa é a primeira vez que questiona sobre minhas opiniões sobre qualquer pessoal, - Estive a algum tempo conversando com meu amigo Álvaro sobre o futuro de nossos filhos, nossa aproximação nesses últimos dias também foram decisivo, reconhecemos estamos vivendo um momento único com cada um deles, principalmente você e Aurélio. O rapaz está se afastando do trabalho do pai e começando algo seu, está crescendo nos negócios e isso significa pequenas mudanças na sua vida pessoal. Assim como ele, você também está começando algo novo, e quando digo isso é sua idade Francisca, está com idade para muitas coisas. Estou começando a planejar seu futuro, filha! - fecho meus olhos por alguns segundos, quando os abro ainda continuamos aqui conversando, as palavras repassando em minha mente fresca assim como o orvalho.
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Amor entre Conveniência
Fiction HistoriqueBrasil, 1892. Francisca Lopes de Castro, filha de um grande produtor de café paulista, acredita fielmente que morrerá solteira. Tendo em vista que, todas as moças da região são casadas, a reclusão na fazenda também reafirma seu argumento, no entanto...