DÉCIMO CAPÍTULO

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Continuo olhando para toda a imensidão do jardim da família Brás, tanto mamãe quanto Lúcia acompanham as anfitriãs num pequeno passeio a área externa. Aproveito os poucos minutos sozinha para finalmente sorri sem nenhuma discrição, o esperado para uma jovem em minha idade é a felicidade do casamento próximo, porém conhecendo a mãe que tenho, não seria um futuro excelente. Mamãe talvez acredite que a  solteirice seja sinônimo de infelicidade e ruína, assim como a maioria o pensa, mas para mim não é. Na verdade terei uma vida tranquila e monótona, talvez até mais independente e quando meus pais estiverem em uma idade mais avançada cuidarei deles, verei Lúcia casar e formar uma família.

Casar com qualquer sujeito escolhido por mamãe, de longe não causa felicidade.

Sorriu mais uma vez, vendo todo o meu reflexo através dos vidros das grandes janelas. Após a chegada repentina de Aurélio e  sr. Álvaro, continuamos com nossa tarde e d. Catarina fez Lúcia falar pelos cotovelos, esquecendo por completo sua timidez. Mesmo estando muito duvidosa com nossa chegada, depois fiquei mais tranquila com tudo, não vejo a hora de conversar a sós com Lúcia e rir das suas opiniões sobre os planos de mamãe. Abaixo meus olhos pela primeira vez e fico a encarar o pequeno livro de poesias de Nora, ela tinha emprestado quando fomos ao seu quarto para mostrar alguns dos seus estudos do francês, aparentemente a jovem está sem professora nesses dias e a mãe não mais sabe como dar-lhe disciplina.

— Sozinha? — giro meu corpo sobressaltada, levo uma das mãos ao peito, suspiro ao ver o rosto de Aurélio encarando-me atentamente.

— A melhores formas para apresentar-se em uma sala. — afirmo sentindo o peito bater com violência, — mesmo o cômodo seja na sua própria residência. — vejo um sorriso se forma em seu rosto, Aurélio continua parado próximo ao sofá enquanto quase encosto-me à janela.

— Estou tomando como hábito assustá-la quando distraída. — afirma, ainda de forma divertida, retiro a mão do peito e volto a segurar com força o pequeno volume do livro, — onde estão todas, parece muito sozinha. — ergo um pouco mais meu rosto, o suficiente para lhe encarar sem problemas, mesmo com minha baixa estatura a nossa distância auxilia meu gesto.

— Estão no jardim, estávamos no quarto de sua irmã e depois Lúcia tocou um pouco de piano para sua mãe, d. Catarina está bastante admirada e quer descobrir todos os talentos de Lúcia. — informo sem reservas, Aurélio e senhor Álvaro não passou muito tempo em nossa companhia e depois da pequena passagem não vimos mais eles na casa, trancaram-se no escritório mesmo quando estávamos na sala de piano, — preferi ficar aqui nessa bela sala, devido à viagem não conseguir trazer muito dos meus livros e sua irmã emprestou esse, tenho um exemplar e estava com saudades desses versos. — ergo um pouco do livro, numa tentativa de mostrar a capa, o gesto é respondido com um dos seus sorrisos marotos. Aurélio começa a andar em minha direção, fazendo a volta pelas poltronas brancas para logo em seguida parar em minha frente, ainda estando a uma distância segura e longe das vistas das janelas.

— Esse volume era meu, — informa, abaixo os olhos mais uma vez para o livro em minhas mãos, — lia muito quando estava estudado Direito no Largo São Francisco, distraia a mente quando cansado. Acabei dando para Nora, mesmo papai não julgando Castro Alves seria uma boa leitura para uma adolescente, no final de tudo acabou gostando. Fico feliz que os versos continuem em boas mãos. — ergo mais o rosto quando escuto os sapatos tocando no assoalho, a madeira não range, mas produz um barulho inquietante. Minha atenção fica entre o olhar de Aurélio em minha direção e as janelas ao nosso lado direito, ainda precisamos manter o mínimo de discrição possível, as janelas não garantem tanta privacidade quanto o confessionário de padre Firmino.

— Era um escritor para jovens, em sua maioria. — afirmo após um tempo, Aurélio muda sua postura, colocando as mãos nos bolsos, em outra pessoa o gesto poderia parecer distante e entediado, contudo com ele parece está relaxado, — mamãe também não gosta muito, afirma ser um devasso! — Aurélio ri e depois balança a cabeça concordando com as palavras, ele dá outro passo à frente ficando também visível para quem passa no jardim, desvio meu olhar para as janelas percebendo ninguém circular nessa área do jardim.

Amor entre ConveniênciaOnde histórias criam vida. Descubra agora