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ELLIE

— Me conte sobre ela de novo — peço.

Mudo de faixa na pista superior da Bay Bridge para termos a melhor vista das luzes da cidade, embora Camila e Lauren estejam se beijando no banco de trás, alheias ao cenário, e de Sofia estar ocupada, procurando no celular a próxima música que devemos ouvir.

Ela ri.

— Não sei se ainda tem alguma coisa para contar.

— Tudo bem se eu já tiver ouvido.

Os primeiros acordes de "Divided", de Tegan and Sara, começam a tocar, e por um momento lembro como foi para mim e Sofia estar no show delas, no mar de garotas que amam garotas, quando estávamos no oitavo ano, e que senti uma coisa bem no fundo do coração e das entranhas que dizia sim.

— Ela chegou terça — diz Sofia. — Estava com jet lag, mas me disse que era acostumada a viajar, a não dormir muito, a normalmente ter horários malucos. Quando falamos ao telefone, ela estava costurando lantejoulas em um lenço. Disse que gosta de brilhar na Parada.

— Estou simples demais hoje? Sou o oposto de brilho.

Comecei a me preocupar com o que vestir várias semanas antes, mas isso não me deixou mais próxima de uma solução quando o hoje chegou. Acabei escolhendo o que esperei que fosse parecer meio boêmio, simples, mas ainda arrumado. Uma camisa jeans leve e macia para dentro de uma calça de jeansescuro. Cinto marrom com fivela turquesa. Botas de salto alto. Brincos de bronze compridos em forma de diamante e batom bem vermelho. Fiz uma trança lateral frouxa caída no ombro. Entre momentos de dúvida quase paralisante, olhei no espelho e pensei por meio segundo que eu parecia o tipo de pessoa que gostaria de conhecer, se já não me conhecesse.

— Você está ótima! — elogia Camila no banco de trás.

— Eu me apaixonaria por você — diz Lauren.

Sofia diz:

— É. Parece uma europeia, coisa que Áster vai gostar. E, depois dos artistas com quem ela tem andado, você provavelmente vai parecer normal.

Essa palavra, normal, me enche de pânico.

— Não esqueça de retocar o batom. Realça o castanho dos seus olhos.

Eu faço que sim. Aumento a música e tento me acalmar. Pela janela, as luzes da cidade se espalham à frente, cheias de promessa. As pessoas nos carros ao redor sorriem ou balançam a cabeça ao ritmo da música. Estamos a caminho da mesma festa, ainda que esteja acontecendo em centenas de bares e salões diferentes. Vamos celebrar cada um e celebrar uns aos outros. Vamos nos apaixonar ou nos lembrar de todas as pessoas que amamos no passado. No meu caso, a lista seria bem pequena. E isso é parte do motivo para esta noite me assustar tanto.

Sofia e eu somos amigas desde os 6 anos, então já sei sobre sua prima, Áster, há anos. Filha da tia jornalista de Sofia, Áster nunca morou no mesmo lugar por mais de um ano, jamais frequentou uma escola tradicional e está viajando pela Europa há vinte meses, estudando com trapezistas enquanto a mãe documenta a vida no circo. Áster sempre foi fonte de fascinação. Mais ainda quando, ano passado, escreveu de Praga para Sofia e contou que tinha se apaixonado por uma garota. Áster descreveu a paixão de uma forma que ninguém vivendo uma vida normal no subúrbio da Califórnia conseguiria. Usou adjetivos como tórrido e expressões como caso amoroso. A garota era dos Alpes suíços, o nome era Sabrina, a relação começou e terminou em duas semanas, do momento em que o circo chegou à cidade até o dia de arrumar as coisas e partir.

Então, dois meses depois, Áster escreveu novamente para dizer que voltaria a morar em São Francisco. A mãe tocaria o projeto do circo, mas Áster ia fazer 18 anos e queria cuidar da própria vida. Eu quero saber como é ficar no mesmo lugar por um tempo, escreveu ela. Então, estou voltando para casa, apesar de nem lembrar como são as estações do ano por aí. Quando um dia, já tarde da noite, Sofia disse com entusiasmo que devia me apresentar Áster, eu fingi que o pensamento não tivesse me ocorrido, quando na verdade era tudo que eu tinha na cabeça havia meses.

À Primeira Vista (Ellister)Onde histórias criam vida. Descubra agora