11

208 21 65
                                    



PAUL

Pego o trem na cidade e ando da estação até a casa de Trig. Exatamente o que tínhamos planejado fazer no sábado, antes de a noite ser sequestrada.

Mandei uma mensagem para tentar ter ideia do que ele queria. Mas ele não responde. Eu me pergunto se é possível que minha mensagem tenha sido de fato compreendida, me pergunto se é possível termos mesmo essa conversa. Eu me acostumei tanto a ficar no limite que me esqueci da possibilidade de um outro lado.

O mais próximo que cheguei foi depois de termos assistido a Milk: a voz da igualdade, um mês antes. Ele escondeu no computador, como se fosse pornografia. Tivemos de esperar até uma noite em que os pais estivessem fora para assistir. Foi risível; acho que não se incomodariam. Mas ele achava. Ele acha.

Já tínhamos feito tantas coisas juntos àquela altura, mas nunca havíamos chorado. Não assim. Não por todas as coisas que podiam dar errado. Não por todas as coisas boas que podiam resultar de tudo. Quando o filme terminou, eu queria dominar o mundo. E tinha uma voz forte na cabeça dizendo: Como você pode dominar o mundo se não consegue contar a ele o que sente?

As palavras estavam bem ali. As palavras estão sempre bem ali, a 2 centímetros de serem ditas. Mas ele estava a uma distância um pouco maior que o habitual, perdido na reação ao filme. Então, em vez de falarmos sobre nós, conversamos sobre história, e sobre como esse ano, de alguma forma, iríamos à Parada do Orgulho Gay

Agora, essa semana chegou, e não da forma que achei que seria. Chego à porta da casa dele e toco a campainha apesar de não precisar; já entrei várias vezes sem tocar primeiro. Mas, nesse momento, quero ser anunciado.

Quando Trig abre a porta, exibe um sorriso largo no rosto. Abertamente eufórico.

— Como você demorou! — diz ele. E, sem dizer mais nada, sai correndo para o quarto. Eu grito um oi para a mãe dele. Ela não responde, então acho que não está em casa.

Temos a casa só para nós.

Mesmo assim, Trig fecha a porta do quarto quando entro. Coloca uma banda indie para tocar e se assegura de que a música seja envolvente. Tiro os sapatos e me sento em sua cama, porque é isso que sempre faço.

— Tenho tantas coisas pra contar — diz ele. — Tantas.

Ele não consegue ficar parado. Muda a música. Ajeita meus sapatos. Mexe em uma raquete de tênis que está na escrivaninha por algum motivo.

— Tudo bem — continua ele. — Por onde começo?

Eu vejo o quanto ele está feliz. O quanto está ansioso para conversar comigo. E percebo com a dolorosa clareza nascida de anos observando seu rosto: isto não tem nada a ver com minha mensagem. Não tem nada a ver com nós dois.

Ele não se senta ao meu lado. Fica perto da escrivaninha, mexendo na raquete.

— É o seguinte, Taylor vai dar uma festa hoje e quer muito, muito, muito que eu vá. Não é um pretexto pra encher a cara nem nada, é só uma festa do Orgulho Gay que os amigos organizam. Para ver uns filmes e bater papo. Parece que vai ser legal. A gente anda trocando tantas mensagens que é como se eu já conhecesse a maioria das pessoas que vão estar lá. Ele é amigo de tantos artistas, tem uma garota que é titereira. É o trabalho de sua vida. Não é legal? E Taylor vai cozinhar. Eu contei que ele cozinha? Ele não fica se gabando nem nada, mas tenho a sensação de que é ótimo cozinheiro. Não se faz comida na própria festa quando não se é bom, né?

Não compro nem batata frita para minhas próprias festas, então não posso nem começar a responder essa pergunta.

Mas Trig não quer uma resposta. Ele só quer que eu o ouça.

À Primeira Vista (Ellister)Onde histórias criam vida. Descubra agora