Deuses do Além

V - Rosas perfeitas possuem espinhos

Ano de 481

 A maioria dos convidados estava presente quando Felia entrou no salão principal. Alguns fizeram uma breve reverência ao notar sua presença, outros não deram importância. Muitos estavam ao redor do rei, próximos a uma extensa mesa de prata repleta de comidas de todos os tipos. Seu pai fazia questão de agradar a cada um dos convidados e sua melhor arma para tal feito eram seus cozinheiros.

 Tentando não atrair sua atenção, Felia caminhou até o outro lado do salão onde Cassius estava de pé observando o jardim por uma das janelas. O rapaz vestia seu novo uniforme cerimonial militar amarelo canário, que na opinião dela combinava perfeitamente com ele.

 - Está atrasada. – Ele disparou assim que Felia se aproximou. Direto ao ponto como o habitual.

 - Precisava de algumas horas de sono. – Ela respondeu tão seca quanto ele. - Espero que não me importune mais com esse assunto. Fale sobre a situação atual dos convidados.

 Cassius voltou a olhar para o jardim.

 - Ou você prefere que eu explique para o meu pai o motivo do meu atraso?

 Mesmo que sua expressão não tenha alterado qualquer tanto, a pele de Cassius quase ficara no tom do seu uniforme. Ele pigarreou.

 - Não precisamos incomodar sua majestade com coisas tão pequenas.

 Felia abriu um largo sorriso.

 - Sim, não precisamos.

 Depois de Cassius resumir quais convidados chegaram e quais estavam por vir, Felia decidiu que era hora de agir como mandava o costume e socializar. Daria sua posição como princesa a qualquer um para não ter de fazer isso, se tivesse escolha. No ano anterior a maioria dos convidados insistiu para que ela visitasse seus Reinos ou falavam sobre as proezas de seus filhos e como eles formariam um maravilhoso casal.

 Pelos deuses, ela só tinha treze anos na época. Não queria pensar em coisas assim antes de viajar e conhecer o mundo. O que poderia demorar algumas décadas já que até para fazer uma simples visita á sua mãe ela precisava ser escoltada por um pequeno exercito. Viver uma aventura estava fora de cogitação.

 Este ano ela estava preparada para essas conversas. Cassius fora promovido, agora era um cavaleiro de ônix em provação e ela quase que imediatamente o requisitou como seu guarda pessoal. Tendo em vista que o Continente está em paz e não há qualquer outra função importante para alguém de tal grau, seu pai depois de muito ponderar deu sua permissão. Agora ela usaria seu guarda pessoal como escudo contra esses corvos enfeitados de pedras preciosas e cheios de palavras doces.

 É claro que esse não foi o único motivo para ela o ter requisitado. Um cavaleiro de ônix em provação só é promovido a cavaleiro de ônix de acordo com o seu desempenho em combate. De forma alguma enquanto princesa ela permitiria que Cassius fosse enviado a uma batalha sem sentido. Já vira outros morrerem em situações semelhantes. Não mesmo. Ele estaria mais seguro ao seu lado assim como ela estaria mais segura ao lado dele.

 - Princesa Felia, minha querida moça. Como foi a viagem? Sua mãe está saudável? - Puxou assunto Betanor Navali, o organizador de eventos oficiais.

 - Foi tranquila, Cassius fez um ótimo trabalho como o esperado. E sim, minha mãe saudável.

 Ela estava grata por ter sido essa a pergunta e não qualquer outra. O fato de sua mãe estar saudável foi a única informação que conseguira. Os sacerdotes não deixaram que as duas se encontrassem, pois acreditavam que isso poderia atrapalhar o tratamento. Era horrível a ideia de que sua presença faria mal a saúde de sua mãe, mas tomou a decisão responsável de não insistir e deixar que o tratamento continuasse já que demonstrava resultado.