XIX - Saúde

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 - Já disse, o cara atirava flechas que se pareciam com raios. - Klaus insistia, enfatizando a palavra 'raios' e fazendo gestos expansivos com as mãos. - E elas explodiam!

 Arwin o encarava sem qualquer alteração em sua expressão enquanto acariciava a própria barba.

- Entendo. Luz roxa, certo?

- Sim! - Respondeu e depois espirrou. - Desculpe. E os olhos dele também brilhavam da mesma cor.

 - Sim, sim. - Concordava Arwin. - E ele parecia mudar de personalidade de uma hora para outra como um lunático?

 - Exatamente! - Concordou assentindo energicamente. - O cara é maluco.

 Celeste ria.

 - Ele não é o único maluco nessa história.

 Klaus a encarou. Celeste calmamente comeu um dos biscoitos do prato que estava em seu colo e que deveria ser o lanche de Klaus, mas ela havia tomado posse como sempre.

 - Por que você está aqui? - Ele perguntou enquanto tirava o prato de biscoitos do colo da garota e depositava ao seu lado sobre a cama. - Este é um assunto para os membros da guarda do leste.

 - Você acha que ninguém mais foi afetado por essa confusão? - Ela retrucou. - Meus pais estão lá em cima cuidando da bagunça que você causou. - Disparou apontando o dedo para Klaus, depois cruzou os braços. - Temos um monte de "clientes" querendo saber mais detalhes sobre o que aconteceu ontem à noite. E como você está morando na nossa casa alguém precisa verificar se você não ficou louco de vez. Seria perigoso morar com um maluco que anda pela casa com uma arma pendurada na cintura.

 - Celeste tem razão Klaus. - Arwin deu a sua opinião para encerrar a questão. - Como seus bem feitores, os Vankourt tem o direito de saber o que de fato aconteceu ontem à noite.

 Celeste sorriu triunfante.

 Por mais que fosse doloroso, ele precisava admitir que não estava em posição de retrucar. Tinha uma divida enorme com os Vankourt e trouxe problemas para eles. Contudo, a explicação da Celeste deixava evidente que não se tratava de um prejuízo, mas sim um aborrecimento por conta das muitas perguntas.

 - Bom, eu preciso ir. - Disse Arwin colocando-se de pé. - Parece que ouve uma confusão na zona norte também ontem à noite e sinto que pode haver alguma ligação com este caso. Kian está na torre tentando identificar o corpo carbonizado. Caso se lembre de mais detalhes é só ir até lá. No mais, tire a semana de folga. Não vai ser bom para nós se você sair por aí de uniforme até que essa confusão seja esclarecida. Entendeu?

- Sim. - Respondeu como se a palavra tivesse um gosto amargo.

 Quando Arwin abriu a porta do quarto no alto da escada Klaus pôde por um breve momento ouvir os murmúrios dos supostos clientes no andar de cima. Depois o lider da guarda fechou a porta e o silencio reinou.

 - Pelo menos a padaria está cheia. - Celeste continuou a conversa. - Toda essa gente tentando saber mais sobre o assunto e comprando salgados para disfarçar a curiosidade está fazendo muito bem para os negócios. Você poderia fazer algo do tipo uma vez por mês.

 - Uma pessoa morreu carbonizada. - Pontuou Klaus. - Eu quase morri! Quer que eu faça isso uma vez por mês?

 Celeste deu de ombros.

 - De qualquer forma, não acredito que você tenha ficado louco.

 A sinceridade na voz dela o tocou.

 - Obrigado.

 Ela sorriu.

 Demorou um tempo para Klaus perceber que depois de Arwin deixar o quarto e fechar a porta os dois ficaram sozinhos. Celeste também parecia um tanto desconfortável com a situação, o que era estranho. Os dois estavam acostumados a passarem um tempo juntos dessa forma a anos.

 - Esse tal arqueiro... - Continuou Celeste. - Você vai atrás dele?

 - É o meu trabalho.

 - Não dá para deixar o Kian cuidar disso?

 Normalmente Klaus tomaria a pergunta como um insulto velado, mas a voz de Celeste não soava como o de costume quando zombava da sua cara. Parecia preocupada. Ele queria dizer algo para acalma-la, alguma coisa que demonstrasse que ficaria tudo bem e que ele podia lidar com esse problema. No entanto, a dor que sentia por todo o seu corpo e as lembranças da noite anterior não o deixaram dizer tal mentira. Sentia medo sempre que pensava em como terminaria o seu próximo encontro com o arqueiro.

 - Não. Mesmo o Kian vai precisar de ajuda contra esse cara. - Foi tudo o que conseguiu dizer sem soar falso.

 Suas palavras pareceram preocupar ainda mais a garota que agora encarava o chão. Os dois ficaram em silencio até Klaus espirrar.

 - Olha, se te faz sentir melhor eu posso...

 A porta no alto da escada foi aberta abruptamente interrompendo Klaus. O andar de cima estava estranhamente silencioso. O pai de Celeste estava no topo da escada com um olhar um tanto estranho. Como se tivesse visto algo espantoso.

 - Filha, você tem visita.

 Ele saiu, deixando a porta aberta.

 - O que está acontecendo? - Perguntou Klaus enquanto tentava se levantar. Mal se colocara de pé e seu corpo vacilou, tombando para trás e caindo sentado na cama.

 Celeste gargalhou.

 - Seja já o que estiver acontecendo lá em cima, parece que não posso contar com você. - Ela pegou um biscoito no prato. - Fique aqui e descanse. Daqui a pouco eu volto com o seu almoço.

Celeste fechou a porta do quarto ao sair, o que só fez aumentar a curiosidade do rapaz que gastou o pouco de energia que ainda possuía para colocar o prato de biscoitos no chão e se ajeitar na cama. Sem muita opção e sentindo dores por todo o corpo, Klaus decidiu tirar um cochilo para passar o tempo.

Deuses do AlémOnde histórias criam vida. Descubra agora