Capítulo 15.1 - Adeus Canadá

28 6 1
                                    

Eu poderia começar dizendo que aconteceu uma reviravolta em minha vida há 5 anos, mas eu estaria deixando para trás todas as outras que foram bem piores. Minha mãe morreu no parto, e meu pai quando eu era criança. Diferente da minha mãe, não foi um acidente o que aconteceu com meu pai, e foi só eu voltar para Vancouver que eu pude perceber.

Batizado como Giovanni Murphy Ballochi, antes de eu entrar na vida adulta, tive meu nome alterado para Antonello Rouge, o primeiro nome do meu pai e a cor vermelha em francês, uma das línguas mais românticas que eu já vi, e também para onde fui depois de cometer um dos maiores erros que algum humano poderia fazer: engravidar uma mulher casada. Margot Watterson não só é minha filha, como também herdou algumas características minhas, as piores eu diria. – As melhores, dependendo do ponto de vista, caso você não seja um psiquiatra. Eu fiquei 14 anos longe do Canadá, consequência de um erro que cometi com outra pessoa, mas que ela não pagou. Kiara pode ter sido uma boa mãe e uma boa esposa depois que Margot nasceu, mas o que ela fazia antes poderia não só acabar com sua reputação, mas com sua carreira e seu casamento.

O motivo que me trouxe de volta à Vancouver não foi minha filha, ou melhor dizendo, não só ela. Eu corria risco de morte caso o marido de Kiara descobrisse que na verdade o aluno dela não havia sido morto num acidente de avião, entretanto, foi ocasionalmente a morte – não a minha – que me fez correr atrás dos anos que eu fiquei sem investigar a súbita e misteriosa morte de meu pai.

Antonello, pelo o que me lembro, era um homem doce, gentil e sempre contente, por isso escolhi o nome dele para ser meu. Totalmente oposto a mim, mas acredito eu que todos os orfanatos, as rejeições de famílias, a mudança repentina para outro país com o dinheiro que havia sobrado dos meus pais e as experiências nada satisfatórias que eu vivi por Paris me desprendeu das características aceitavelmente normais deixadas pelos meus progenitores.

Certamente o que não estava em meus planos era que eu iria me apaixonar por Vancouver e pelas interessantes vidas que ali viviam. O plano inicial era descobrir o que de fato teria acontecido com o Antonello I e caso a teoria que eu tinha criado em torno de todos os anos da minha vida fosse real, eu acabaria não só com a vida do responsável mas com todos aqueles que ele amava, nem que eu tivesse que morrer para conseguir fazer.

Eu cresci vendo na TV ou ouvindo no rádio mesmo na França como a vida dos Murphy era perfeita e limitada. Eu não conseguia entender como eu tinha aquele sobrenome, mas não fazia parte deles, já que o que Louis Murphy deixava claro em todo episódio do seu reality era que ele era filho único, assim como Bennet e Raul, e que incrivelmente seus pais também não tinham irmãos... era realmente um fato curioso visto que Louis tivesse nascido na era do baby boom.

Meu alto QI me levou a curiosidade de saber mais sobre a família Murphy, ainda mais depois que Louis morreu e eles se mudaram para Vancouver. O mais impressionante era que ninguém sabia que eles na verdade estavam se mudando de volta e Louis tinha negócios lá, mais precisamente na época em que meu pai morreu. Em 2016, dois anos depois da morte do rei dos Murphy, eu voltei para Vancouver com um só propósito.

Não demorou muito para que eu conseguisse um emprego numa escola e como era meio período eu pude investigar a morte de meu pai e me instalar aos poucos na sociedade canadense, como se eu nunca estivesse lá. Aos poucos eu fui descobrindo coisas absurdas, que jamais ninguém tivera descoberto, como por exemplo a identidade de uma mulher jovial que era empregada da Mansão da primeira e única família que investiguei. Como Cordelia Cyrus, uma mulher tão bonita e estudiosa limpava a sujeira de Bennet, Lohany e seu filho, ao invés de continuar com sua carreira na segurança do Estado?

O primeiro fato curioso que descobri era que o sobrenome Cyrus não me era estranho. A última mulher que meu pai tinha visto na vida possuía esse sobrenome e espantosamente estava grávida da serva dos loucos por dinheiro naquela noite. Meu pai e Juliana, a mãe de Cordelia não só trabalhavam juntos como tinham uma amizade equilibrada em brigas e golpes baixos. Thomas Cyrus, o suposto pai de Cordelia era o homem a quem meu pai procurava na noite de sua morte, mas que no final acabou encontrando Juliana. Era tudo perfeito o que tinha acontecido naquela noite, e a resposta da minha teoria me caiu como luva.

Para comprovar o que eu já sabia, eu tive que primeiro investigar a vida de Louis Murphy na década de 90. Mesmo vivendo em Miami com sua família ele tinha reuniões semanais em Vancouver, mas curiosamente a semana da morte do meu pai foi a última vez que ele esteve lá, exceto por visitar alguém no ano seguinte, 1992, no mês em que Cordelia nasceu. Minhas peças estavam quase se encaixando quando finalmente eu consegui me infiltrar na empresa onde Juliana e meu pai trabalhavam.

Para comprovar as datas, eu consegui roubar do depósito da empresa documentos das reuniões que Louis tinha com os negociadores da empresa, mas infelizmente ele não esteve lá na noite da morte. Vendo por outro lado, eu consegui todos os nomes dos homens que participavam das reuniões e analisando o Facebook de todos eles – que ainda estavam vivos – eu consegui encontrar o de Michael Lavigne, curiosamente pai de Alison e Clinton, meu aluno do primário.

Propositalmente eu comecei a ser rude com Clinton, que era um ótimo aluno, mas quando se sentia pressionado tinha seu desempenho reduzido. Em menos de duas semanas eu consegui duas coisas: notas baixas de Clinton e uma reunião com o pai dele. Michael estava aposentado há anos, mas as publicações de luto por conta da morte de Louis entregavam que ele não tinha se esquecido da sua época de trabalho. A conversa foi longa começamos falando sobre Clinton, depois sobre Alison que era sua filha mais velha e tinha um apego enorme a Hettel, que trabalhava na Mansão dos recém chegados no assunto "Murphy". Xícaras de café e biscoitos de chocolate que tinham na sala dos professores ajudaram Michael colocar tudo pra fora, depois de se lembrar do seu querido, velho e morto amigo Louis. Eu sabia o que Michael estava pensando, só precisava das palavras certas para consolá-lo.

Nada saiu como eu esperava, Michael não abriu o bico sobre a verdade por trás da mídia e não disse nada do que eu não sabia sobre Louis. Porém, eu tinha descoberto naquela reunião que Michael não tinha tantos amigos como em 90 e Clinton realmente não se dava bem com olhares de julgamento. De três reuniões de pais foram para seis encontros num bar, depois nove jantares com Michael e sua esposa e três idas ao campo de golfe até ele finalmente contribuir para o meu primeiro plot twist na América.

Antonello, meu pai, competia indiretamente com Juliana na empresa, enquanto Michael era sócio e fofoqueiro de Louis em Vancouver. Eles tinham uma amizade antiga e quando Louis assinou contrato com aquela empresa, colocou Michael dentro dela para comandar enquanto ele tivesse em Miami. Juliana mesmo casada com Thomas, começou a sair com Louis, dezenas de anos mais velho que ela. O que nenhum dos dois esperavam era uma gravidez, mas que ocasionalmente aconteceu. Antonello ouviu a conversa dos dois e ameaçou contar para Thomas. Na noite em que ele estava convicto em fazer isso, Juliana fingiu que estava no hospital por conta de uma complicação com a gravidez, por isso Thomas não estaria em casa mesmo se Antonello conseguisse chegar até lá. No meio do caminho, Juliana apareceu na frente de Antonello, que teve uma longa e decisiva conversa com ela. Ela contou toda a verdade, que Louis e ela não iriam mais sair escondidos, mas que Thomas não saberia da traição e da real paternidade de Cordelia – que ainda era um feto. Mesmo assim meu pai não se sensibilizou e estava decidido a contar para Thomas, mas antes de entrar em seu carro, foi baleado na cabeça por Louis, que estava ouvindo a conversa.

Toda aquela situação foi um acidente, Louis não queria realmente matar meu pai, era para estar sem bala o revólver e ser apenas um susto e uma ameaça para Antonello – o que não acabou sendo. Assustados, Louis e Juliana levaram o corpo do meu pai para um local mais movimentado e no meio da madrugada jogaram ele num terreno abandonado. Na manhã seguinte todos os noticiários estavam com o nome do meu pai na capa, alegando ser uma suposta vítima de assassinato dos moradores do subúrbio, enquanto o responsável era um dos mais ricos dos Estados Unidos.

Aos poucos eu fui me distanciando de Michael, eu sentia a presença de Louis sempre que olhava para cara dele enquanto bebia os champanhes caros em taças caras na sua mansão cara. Em contrapartida eu investigava cada vez mais a vida de Bennet, Lohany e Raul, já que Louis estava morto há algum tempo.

SuicideOnde histórias criam vida. Descubra agora