29 | O restante da quarta história

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Era neste momento que ele geralmente acordava. Quando ela caía, gritando, soltando-se dele, no abismo,
pega pelo pesadelo, perdida para sempre, era quando ele geralmente se sentava na cama, todo suado, o
coração batendo tão apressado que ele achava que fosse morrer.
Mas ele não acordou.
O pesadelo ainda o cercava. O teixo ainda estava atrás dele.
— A história ainda não foi contada — disse.
— Tire-me daqui — exigiu Conor, levantando-se, trêmulo. — Preciso ver minha mãe.
— Ela não está mais aqui, Conor — disse o monstro original. — Você a soltou.
— Isto é apenas um pesadelo — disse Conor, ofegante. — Isto não é a realidade.
— É a realidade — disse o monstro. — Você sabe que é. Você a soltou.
— Ela caiu — emendou Conor. — Eu não podia mais segurá-la. Ela estava pesada demais.
— E por isso você a soltou.
— Ela caiu! — repetiu Conor, erguendo a voz, quase desesperado. A mistura de fuligem e cinzas que
pegou sua mãe estava subindo pelo paredão como tentáculos de fumaça, uma fumaça que ele acabou
inspirando. A fumaça entrava em sua boca e seu nariz como o ar, preenchendo-o, sufocando-o. Ele teve
de lutar para conseguir respirar.
— Você a soltou — disse o monstro.
— Eu não a soltei! — gritou Conor, a voz hesitante. — Ela caiu!
— Você tem de dizer a verdade, senão jamais sairá deste pesadelo — sentenciou o monstro, erguendo-
se perigosamente sobre ele agora, a voz mais assustadora do que nunca. — Você ficará preso aqui
sozinho pelo resto da vida.
— Por favor, me deixe ir! — gritou Conor, tentando se afastar. Ele gritou aterrorizado ao perceber que os
tentáculos do pesadelo se enrolavam em suas pernas. Eles o derrubaram e estavam começando a envolver
seus braços também. — Ajude-me!
— Fale a verdade! — disse o monstro, a voz séria e apavorante agora. — Fale a verdade ou ficará aqui
para sempre.
— Que verdade? — gritou Conor, lutando desesperadamente contra os tentáculos. —
Não sei o que você quer dizer!
O rosto do monstro de repente apareceu em meio à escuridão, a centímetros do rosto de Conor.
— Você sabe — disse ele, grave e ameaçadoramente.
E, então, fez-se silêncio.
Porque, sim, Conor sabia.
Ele sempre soube.
A verdade.
A verdade verdadeira. A verdade do pesadelo.
— Não — disse ele, baixinho, enquanto a escuridão começava a se enrolar em seu pescoço. — Não
posso.
— Você deve.
— Não posso — repetiu Conor.
— Pode — insistiu o monstro, e algo mudou em sua voz. Um quê diferente.
Um quê de bondade.
Os olhos de Conor estavam cheios de lágrimas agora. Lágrimas escorriam por seu rosto e ele não
conseguia impedir, não conseguia nem mesmo enxugá-las, porque os tentáculos do pesadelo o amarravam
agora, quase cobrindo-o completamente.
— Por favor, não me obrigue — implorou Conor. — Por favor, não me obrigue a dizer.
— Você a soltou — disse o monstro.
Conor fez que não com a cabeça.
— Por favor…
— Você a soltou — repetiu o monstro.
Conor fechou os olhos com força.
Mas então fez que sim com a cabeça.
— Você poderia tê-la segurado por mais tempo — disse o monstro —, mas a deixou cair. Você a soltou
e o pesadelo a pegou.
Conor fez que sim novamente, o rosto contorcido pela dor e pelo choro.
— Você queria que ela caísse.
— Não! — exclamou Conor em meio às lágrimas espessas.
— Você queria que ela se fosse.
— Não!
— Você tem de falar a verdade e tem de falar agora, Conor O’Malley. Diga. Você deve.
Conor fez que não novamente, a boca fechada com força, mas ele sentia a queimação no peito, como se
uma fogueira tivesse sido acesa ali, um sol em miniatura, brilhando e queimando-o por dentro.
— Vou morrer se fizer isso — disse ele com dificuldade.
— Vai morrer se não fizer — emendou o monstro. — Você tem de dizer.
— Eu não consigo.
— Você a soltou. Por quê?
A escuridão envolvia os olhos de Conor agora, apertando-lhe o nariz e cobrindo sua boca. Ele tentava
respirar, sem conseguir. O pesadelo o estava sufocando. O pesadelo o estava matando…
— Por quê, Conor? — insistiu o monstro. — Diga-me POR QUÊ. Antes que seja tarde demais!
E o fogo no peito de Conor de repente crepitou, de repente queimou como se fosse consumi-lo vivo. Era
a verdade, ele sabia que era. Um gemido subiu por sua garganta, um gemido que virou grito e depois um
berro alto e ininteligível e ele abriu a boca e o fogo queimando, queimando para consumir tudo, se
espalhando pela escuridão, pelo teixo também, queimando-o juntamente com o restante do mundo,
queimando-o enquanto Conor gritava e gritava e gritava, de dor e sofrimento…
E ele disse as palavras.
Ele disse a verdade.
Ele contou o restante da quarta história.
— Não aguento mais! — gritou enquanto o fogo o cercava. — Não aguento saber que
ela se vai! Só quero que tudo acabe! Quero que isso termine!
E então o fogo consumiu o mundo, destruindo tudo e destruindo-o pelo caminho.
Conor aceitou tudo com alívio, porque aquele finalmente era o castigo que ele merecia.

Sete Minutos Depois Da Meia-Noite [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora