25 | Um bilhete

34 4 0
                                    


Alguns dias se passaram. E depois mais. Era difícil dizer exatamente quantos. Todos pareciam um único
dia longo e cinzento. Ele se levantava pela manhã e sua avó não conversava com ele, nem mesmo sobre o
telefonema da diretora. Ele ia à escola e ninguém conversava com ele lá. Ele visitava sua mãe no
hospital, e ela ficava cansada demais para conversar. Seu pai ligava e não tinha nada a dizer.
Tampouco havia sinal do monstro, não desde o ataque a Harry, apesar de supostamente agora ser a hora
de Conor contar sua história. Todas as noites, Conor esperava. Todas as noites, o monstro não aparecia.
Talvez porque soubesse que Conor não sabia que história contar. Ou que Conor sabia, mas se recusaria a
contar.
Por fim, Conor caía no sono e o pesadelo o acometia. O pesadelo acontecia sempre que ele dormia
agora, e era pior do que antes, se é que era possível. Ele acordava gritando três ou quatro vezes por
noite, uma vez gritando tanto que sua avó bateu na porta para ver se ele estava bem.
Mas ela não entrou no quarto.
O fim de semana chegou e foi passado no hospital, mas o novo remédio de sua mãe ainda não fizera
efeito e, no meio-tempo, ela teve uma infecção nos pulmões. Sua dor piorou também, então ela passava a
maior parte do tempo dormindo e falando coisas sem sentido por causa dos analgésicos. A avó de Conor
o tirava do quarto quando a mãe estava assim, e por isso ele se acostumou tanto a caminhar pelo hospital
que uma vez ele levou uma mulher perdida até o departamento de radiologia.
Lily e sua mãe também fizeram uma visita no fim de semana, mas ele tomou cuidado
para passar o tempo todo em que elas estavam ali lendo revistas na loja de presentes.
Depois, de alguma forma, ele voltou à escola. Por mais incrível que fosse, o tempo seguia adiante para
todo o mundo.
O resto do mundo que não estava esperando.
A sra. Marl estava devolvendo o trabalho sobre histórias de vida. Quer dizer, para todos os que tinham
uma vida. Conor só ficou sentado à carteira, a cabeça apoiada na mão, olhando para o relógio. Ainda
faltavam duas horas e meia para as 12h07. Não que isso importasse.
Ele estava começando a pensar que o monstro tinha desaparecido para sempre.
Mais um que não queria falar com ele.
— Ei — ouviu ele um chamado sussurrado por perto. Tirando sarro dele, sem dúvida.
Olhe para Conor O’Malley, só sentado lá como um saco vazio. Que maluco.
— Ei — ouviu ele novamente, desta vez com mais insistência.
Percebeu que alguém estava sussurrando para ele.
Lily estava do outro lado do corredor, onde se sentava todos esses anos em que frequentaram juntos a
escola. Ela olhava para a srta. Marl, mas os dedos lhe estendiam um bilhete.
Um bilhete para Conor.
— Pegue — sussurrou ela pelo canto da boca, entregando-lhe o bilhete.
Conor olhou para ver se a srta. Marl os estava observando, mas ela estava ocupada demais expressando
decepção com o fato de a vida de Sully apresentar uma horrível semelhança com a de um super-herói
com características de inseto. Conor estendeu a mão e pegou o bilhete.
Ele estava dobrado no que pareciam centenas de vezes e abri-lo era como desfazer um nó. Ele lançou um
olhar irritado para Lily, mas ela ainda fingia prestar atenção na professora.
Conor abriu o bilhete na mesa e leu. Apesar de todas as dobras, ele tinha apenas quatro linhas.
Quatro linhas e o mundo todo se acalmou.
Desculpe por ter contado a todo mundo sobre sua mãe, dizia a primeira linha.
Sinto falta da sua amizade, dizia a segunda.
Você está bem?, dizia a terceira.
Eu vejo você, dizia a quarta, com o eu sublinhado cem vezes.
Ele releu. E releu.
Conor voltou a olhar para Lily, que estava ocupada sendo elogiada pela srta. Marl, mas percebeu que ela
se ruborizava, e não só por causa do que a srta. Marl dizia.
A srta. Marl seguiu em frente, ignorando Conor.
Ao terminar, Lily olhou para o amigo. Fitou-o nos olhos.
E ela tinha razão. Ela o via, ela o via mesmo.
Ele teve de engolir em seco antes de conseguir falar.
— Lily… — Conor começou a dizer, mas a porta da sala se abriu e a secretária entrou, aproximando-se
da srta. Marl e sussurrando-lhe alguma coisa.
As duas se viraram e olharam para Conor.

Sete Minutos Depois Da Meia-Noite [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora