28 | A quarta história

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Mesmo preso na enorme e forte mão do monstro, Conor sentia o terror tomando conta dele, sentia a
escuridão toda preenchendo seus pulmões e o sufocando, sentia o estômago começando a…
— Não! — gritou ele, retorcendo-se mais, mas o monstro o segurava com força. —
Não! Por favor!
A colina, a igreja, o cemitério desapareceram, até mesmo o sol sumiu, deixando-os no meio de uma
escuridão fria, a escuridão que acompanhava Conor desde que sua mãe fora hospitalizada pela primeira
vez, desde antes, quando ela começou com os tratamentos que a fizeram perder os cabelos, desde quando
ela teve uma gripe que não a deixava, até que ela foi a um médico e não era gripe coisa nenhuma, desde
antes disso, quando ela começou a reclamar de como estava se sentindo cansada, muito antes disso tudo,
desde sempre, parecia que o pesadelo sempre estivera ali, perseguindo-o, cercando-o, isolando-o,
ostracizando-o.
Parecia que ele nunca tinha estado em nenhum outro lugar.
— Tire-me daqui! — gritou ele. — Por favor!
— Está na hora — disse o monstro novamente — da quarta história.
— Não sei de história nenhuma! — exclamou Conor, sua mente sacudindo de tanto medo.
— Se você não contar — disse o monstro —, terei de fazer isso por você. — Ele segurou Conor perto
do seu rosto. — E, acredite no que digo, você não vai querer isso.
— Por favor — repetiu Conor. — Tenho de voltar para minha mãe.
— Mas — continuou o monstro, virando-se na escuridão — ela já está aqui.
O monstro o soltou de repente, quase deixando-o cair na terra, e Conor saiu rolando.
Ele reconheceu o terreno frio sob suas mãos, reconheceu a clareira onde estava, cercada em três lados
por uma floresta escura e impenetrável, reconheceu o quarto lado, um penhasco, que se embrenhava em
uma escuridão ainda mais profunda.
E, na beirada do abismo, sua mãe.
Ela encontrava-se de costas para Conor, mas estava olhando para trás, sorrindo. Parecia fraca como no
hospital, mas lhe acenou silenciosamente.
— Mamãe! — gritou Conor, sentindo-se pesado demais para se levantar, como sempre
se sentia quando o pesadelo se iniciava. — Você tem de sair daí!
Sua mãe não se movia, apesar de parecer um pouco preocupada com o que ele dissera.
Conor avançou se arrastando, o esforço consumindo-o.
— Mamãe, você tem de correr!
— Estou bem, querido — falou ela. — Não há motivo para se preocupar.
— Mamãe, corra! Por favor, corra!
— Mas, querido, há…
Ela parou e se virou para o abismo, como se tivesse ouvido algo.
— Não — sussurrou Conor para si mesmo. Ele avançou um pouco mais, mas ela estava
muito longe, longe demais para alcançá-la a tempo, e ele se sentia tão pesado…
Houve um som grave do fundo do penhasco. Um estrondo, uma explosão.
Como se algo enorme estivesse se movendo lá embaixo.
Algo maior do que o mundo.
E estava subindo pelo penhasco.
— Conor? — chamou a mãe, olhando para o filho.
Mas Conor sabia. Era tarde demais.
O monstro de verdade estava vindo.
— Mamãe! — gritou ele, obrigando-se a se levantar, enfrentando o peso insuportável que o pressionava.
— MAMÃE!
— Conor! — gritou sua mãe, recuando da beirada do abismo.
Mas o barulho estava aumentando. E aumentando. E aumentando ainda mais.
— MAMÃE!
Ele sabia que não chegaria a tempo.
Porque, com o estrondo, uma nuvem de escuridão incandescente ergueu duas enormes
mãos fechadas sobre o abismo. Elas pairaram no ar por um tempo, sobre sua mãe que tentava recuar.
Mas ela estava fraca demais, fraca demais…
E os punhos desceram num ataque violento e a seguraram, puxando-a para o abismo.
E finalmente Conor conseguiu correr. Com um grito, ele atravessou a clareira, correndo tão rápido que
quase tropeçou, e se jogou na direção da mãe, na direção de suas mãos esticadas, enquanto os punhos
escuros a puxavam para o abismo.
E suas mãos seguraram as dela.
Este era o pesadelo. Este era o pesadelo que o fazia acordar gritando todas as noites. Isto estava
acontecendo, bem agora, bem aqui.
Ele estava na beirada do penhasco, se segurando, segurando as mãos da mãe com toda a força, tentando
impedir que ela fosse tragada pela escuridão, tragada pela criatura lá embaixo.
Que agora ele via por inteiro.
O monstro de verdade, aquele do qual Conor tinha mesmo medo, aquele que ele esperava ter visto
quando o teixo apareceu pela primeira vez, o verdadeiro monstro do pesadelo, formado por nuvem,
cinzas e chamas escuras, mas com músculos de verdade,
força de verdade, olhos vermelhos de verdade que o encaravam e dentes reluzentes que comeriam sua
mãe viva. Já vi coisas piores, disse Conor para o teixo naquela primeira noite.
E ali estava a coisa pior.
— Ajude-me, Conor! — gritou a mãe. — Não me solte!
— Não vou soltá-la! — gritou Conor. — Prometo!
O monstro do pesadelo rugiu e puxou com mais força, seus punhos apertando o corpo
de sua mãe
E ela começou a escorregar.
— Não! — gritou ele.
Sua mãe berrou, apavorada.
— Por favor, Conor! Segure-me!
— Vou segurá-la! — gritou Conor. Ele se virou para o teixo, ali de pé, sem se mover. —
Ajude-me! Não consigo segurá-la!
Mas ele só ficou ali, observando.
— Conor! — gritou sua mãe.
E as mãos dela escorregavam.
— Conor! — gritou ela novamente.
— Mamãe! — gritou ele, segurando-a com força.
Mas eles estavam se soltando, e ela estava ficando mais e mais pesada, o monstro do pesadelo puxando
com mais e mais força.
— Estou escorregando! — berrou sua mãe.
— NÃO! — gritou ele.
Ele caiu de peito por causa do peso da mãe e por causa da força do monstro que a puxava.
Ela gritou novamente.
E de novo.
E ela era tão pesada, inacreditavelmente.
— Por favor — sussurrou Conor para si mesmo. — Por favor.
— E aqui — ele ouviu o teixo dizer atrás de si — está a quarta história.
— Cale a boca! — gritou Conor. — Ajude-me!
— Eis a verdade de Conor O’Malley.
E sua mãe gritava.
E ela estava escorregando.
Era tão difícil segurá-la.
— É agora ou nunca — disse o teixo. — Você precisa falar a verdade.
— Não! — exclamou Conor, a voz trêmula.
— Você tem que falar a verdade.
— Não! — repetiu Conor, olhando para o rosto da mãe…
Enquanto a verdade de repente lhe vinha…
Enquanto o pesadelo alcançava seu ápice perfeito…
— Não! — gritou Conor mais uma vez…
E sua mãe caiu.

Sete Minutos Depois Da Meia-Noite [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora