22 | Já não vejo você

26 4 0
                                    


— Quero ir ao hospital também — disse Conor na manhã seguinte, no carro com sua avó. — Não quero
ir à escola hoje.
Ela só dirigia. Era bem possível que nunca fosse falar com ele novamente.
— Como ela estava na noite passada? — perguntou ele. Conor esperou acordado por muito tempo depois
que o monstro foi embora, mas dormiu antes que a avó retornasse.
— Praticamente na mesma — respondeu ela, tensa, os olhos fixos na rua.
— O novo remédio está ajudando?
Ela demorou tanto para responder que ele achou que não fosse falar nada, e estava prestes a perguntar
novamente quando ela disse:
— É cedo demais para saber.
Conor deixou algumas ruas passarem e perguntou:
— Quando ela vem para casa?
A isso sua avó não respondeu, por mais que faltasse meia hora para chegarem à escola.
Não havia esperança de prestar atenção nas aulas. O que, novamente, não importava, porque nenhum dos
professores lhe fazia perguntas. Nem seus colegas. Quando chegou a hora do recreio, ele tinha passado
outra manhã sem ter dito nenhuma palavra a ninguém.
Sozinho, ele ficou sentado num canto afastado do refeitório, a comida intacta diante dele. O salão estava
incrivelmente barulhento, rugindo com os sons dos colegas e todos os gritos e berros e lutas e risadas.
Conor deu o melhor de si para ignorar tudo.
O monstro a curaria. Claro que sim. Por que mais ele teria vindo? Não havia outra explicação. Ele saíra
caminhando como uma árvore medicinal, a mesma espécie que fez o remédio para sua mãe, então por que
mais?
Por favor, pensou Conor olhando para sua bandeja quase cheia. Por favor.
Duas mãos vindas do outro lado da mesa bateram com força nas laterais da bandeja, derrubando o suco
de laranja no colo de Conor.
Conor se levantou, mas não rápido o bastante. Suas calças estavam ensopadas de suco e pingavam pelas
pernas.
— O’Malley mijou nas calças! — gritou imediatamente Sully, com Anton rindo atrás dele.
— Aqui — disse Anton, jogando em Conor um pouco da poça que se formara na mesa.
— Você esqueceu um pouco!
Harry se colocou entre Anton e Sully, como sempre de braços cruzados, encarando-o.
Conor devolveu a encarada.
Os dois ficaram paralisados por tanto tempo que Sully e Anton se aquietaram,
incomodados com aquela competição de olhares. Perguntavam-se o que Harry faria em seguida.
Conor também se perguntava.
— Acho que entendi, O’Malley — falou Harry, finalmente. — Acho que sei pelo que
você está pedindo.
— Você vai receber agora — disse Sully. Ele e Anton riram, cumprimentando-se com
os punhos fechados.
Conor não via professores pelo canto do olho, então percebeu que Harry tinha escolhido uma hora em
que não seriam perturbados.
Conor estava sozinho.
Harry deu um passo à frente, ainda muito calmo.
— Eis aqui o pior golpe de todos, O’Malley — anunciou Harry. — Eis aqui a pior coisa que posso fazer
contra você.
Ele estendeu a mão, como se pedisse um cumprimento.
Ele estava mesmo pedindo um cumprimento.
Conor reagiu automaticamente, estendendo a mão e cumprimentando Harry antes mesmo de pensar no que
estava fazendo. Eles se cumprimentaram como dois empresários ao fim de uma reunião.
— Adeus, O’Malley — disse Harry, olhando nos olhos de Conor. — Já não vejo você.
Então ele soltou a mão de Conor, deu-lhe as costas e se afastou. Anton e Sully pareceram ainda mais
confusos, mas, depois de um segundo, eles foram embora também.
Ninguém se virou para olhar para Conor.
Havia um enorme relógio digital na parede do refeitório, comprado em algum momento dos anos 1970
como a mais recente tecnologia e jamais substituído, apesar de ser mais velho do que a mãe de Conor.
Enquanto Conor observava Harry se afastando, afastando-se sem olhar para trás, afastando-se sem fazer
nada, Harry passou pelo relógio digital.
O intervalo começava às 11h55 e terminava às 12h40.
O relógio atualmente mostrava 12h06.
As palavras de Harry ecoavam na mente de Conor.
“Já não vejo você.”
Harry continuava se afastando, cumprindo o que prometera.
“Já não vejo você.”
O relógio anunciou 12h07.
— É hora da terceira história — o monstro disse por trás dele.

Sete Minutos Depois Da Meia-Noite [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora