08 | A primeira história

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— Há muito tempo — disse o monstro —, antes que nesta cidade houvesse estradas, trens e carros, este era um lugar verdejante. Árvores cobriam todas as colinas e margeavam todos os caminhos. Elas sombreavam todos os riachos e protegiam todas as casas, porque havia casas aqui na época, feitas de rochas e terra.

Isto era um reino.

— O quê? — falou Conor, olhando para o jardim. — Aqui?

Curioso, o monstro tombou a cabeça para ele. — Você nunca ouviu falar disso?

— Um reino aqui ao redor, não — respondeu Conor. — Não temos nem um McDonald’s.

— Ainda assim — continuou o monstro —, era um reino, pequeno, mas feliz, porque o rei era apenas um rei, um homem cuja sabedoria foi arduamente adquirida. Sua esposa deu à luz quatro filhos fortes, mas o rei teve de travar batalhas para preservar a paz durante seu reinado. Batalhas contra gigantes e
dragões, batalhas contra lobos negros de olhos vermelhos, batalhas contra exércitos de homens liderados por grandes magos.

Essas batalhas garantiram a manutenção das fronteiras do reino e trouxeram paz para a terra. Mas a
vitória teve um preço. Um a um, os quatro filhos do rei foram mortos. Pelo fogo de um dragão ou pelas mãos de um gigante ou pelos dentes de um lobo ou pela lança de um homem. Um a um, os quatro príncipes do reino pereceram, deixando o rei com apenas um herdeiro. Seu neto ainda bebê.

— Tudo isso parece um conto de fadas — comentou Conor, desconfiado.

— Você não diria isso se ouvisse os gritos de um homem morto por uma lança — retrucou o monstro. — Ou seus gritos de terror ao ser destroçado por lobos. Agora, cale-se.

Enquanto isso, a esposa do rei sucumbiu à dor da perda, assim como a mãe do jovem príncipe. O rei ficou apenas na companhia da criança, e também de muito mais tristeza do que um homem é capaz de suportar.

“Tenho de me casar novamente”, concluiu o rei. “Para o bem do meu príncipe e do meu reino, e até para o meu próprio bem.”

E ele se casou de novo, com uma princesa de um reino próximo, uma união de conveniência que fortalecia os dois reinos. Ela era jovem e bela e, apesar de sua expressão ser um pouco séria e ter a língua um pouco afiada, ela parecia fazer o rei feliz.

O tempo passou. O jovem príncipe cresceu até ser quase um homem, a dois anos de completar seu décimo oitavo aniversário, o que lhe permitiria assumir o trono com a morte do velho rei. Foram dias felizes para o reino. As batalhas tinham cessado e o futuro parecia garantido nas mãos do jovem e
corajoso príncipe.

Mas um dia o rei adoeceu. Começaram a se espalhar rumores de que ele fora envenenado pela nova esposa. Circulavam histórias de que ela invocara espíritos dos mortos para se fazer mais jovem do que realmente era e que, sob seu rosto juvenil, se escondia a carranca de uma velha. Ninguém a perdoaria por ter envenenado o rei, apesar de ele implorar a seus súditos, até o fim, que não a culpassem.

E então ele morreu um ano antes de seu neto ter idade suficiente para assumir o trono.

A rainha, a “vodrasta” dele, tornou-se regente em seu lugar, e cuidaria das questões de Estado até que o príncipe tivesse idade para assumir.

No começo, para a surpresa de muitos, o reinado dela foi bom. Seu semblante — a despeito dos rumores — era jovem e agradável, e ela trabalhava para reinar como o rei morto.

O príncipe, enquanto isso, se apaixonara.

— Eu sabia! — murmurou Conor. — Essas histórias sempre têm príncipes idiotas que se apaixonam. — Ele começou a andar em direção à casa. — Achei que essa história seria boa.

Sete Minutos Depois Da Meia-Noite [COMPLETO]Onde histórias criam vida. Descubra agora