Capítulo 6: Extração

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Um único tiro ecoou mais do que todos os outros no meio daquele pandemônio. Vi tudo em um filme cinzento, descolorido e em câmera lenta. O homem em pé a minha frente prepara o augúrio do fim. Sua arma apontada contra meu peito mira o tiro de misericórdia. Não vejo seu rosto, tudo é embasado e difuso, quase como se eu olhasse o mundo por baixo d'água.

O tiro explode e seu corpo é lançado. O perco de vista. Foi rápido, milésimos de segundos e então ele desaparece. Para mim, tudo foi lento, em frames curtos e cortados. No fim, eu pisquei.

— De novo, você está ficando lento, capitão.

Escuto a voz de Ferris soando sarcástica no comunicador, agora sei de onde veio o tiro, mesmo que não o veja. Basicamente, ele é melhor de nós no quesito mira e destruição.

— Você está bem, capitão?

Escuto agora a voz de Cody, parece nervoso, preocupado e arfante. Respondo um sim seco e me levanto. Sem tempo para esperar, começo uma segunda corrida desenfreada, dessa vez em direção ao armazém. Disparo em minha maior velocidade. Todos ali, suspeitando o movimento, fazem de mim o alvo de seus tiros que explodem o solo levantando poeira e terra. Mais disparos são efetuados, esses em ajuda.

Corro como se minha vida dependesse disso, no fim, depende mesmo. Não demora muito a chegar na entrada e entrar sendo coberto pela fumaça sufocante. Olho de perto agora, todos os pelotões estão reunidos, três unidades, nove soldados, dois feridos, colocados em um canto a lamuriar dores no corpo.

Ainda quase sem respirar, arfando pesadamente e me esforçando para respirar, começo a disferir ordens. Agora havia mais duas entradas nas laterais do prédio. Sem realmente me preocupar com a hierarquia.

— Cody, você fica na escada, não deixe brechas. Quero dois homens em cada nova entrada feita. Ferris, você fica comigo na entrada principal. Agora.

Minha voz saiu dura, sem vida ou simpatia. Ali, naquela situação, não haveria espaço para desagrado, se houvesse, todos ganharíamos bons buracos no peito de presente. Corro até a porta com Ferris, até ali o plano tinha seguido bem. Nossas unidades dispersas haviam sido juntadas em um único ponto defensável. Claro, agora com mais aberturas, porém com mais sentinelas. Ferris explodira a parede que nos separavam, criando buracos para nos reunir.

Por um momento, olho o local. Estava cheio de uma fumaça verde, o que impedia a visibilidade interna. Ao redor, vejo, graças a visão de calor dos capacetes, os soldados posicionados. Estávamos em alerta extremo, tendo que nos abaixar a todo momento enquanto projeteis passam sibilando por perto de nossos corpos, nos escondendo, abrigando-nos enquanto as paredes explodem em poeira. Quando as balas das armas inimigas nos caçam sedentas por sangue.

No fim, éramos como pássaros engaiolados, presos, sem respirar. Porém, diferente desses, nossas grades mortíferas se aproximam a cada segundo, afunilando nossa existência. Espremendo-nos, até que estivéssemos sem espaço nenhum, sem vida, só fim.

Agora, não havia mais um plano, era só sobrevivência. Abaixar, se esconder e atirar, em uma tentativa falha de retardar o inevitável. Sem planos, só findar.

— Iniciando processo de extração.

Assim escutamos em nossos comunicadores uma voz metálica, sem vida, mas para nós, a maior das esperanças. Nos três minutos que se seguiram, não houve realmente nada. Tudo continuou igual, a explodir. Parecíamos ainda mais apertados, agora a se preocupar com a munição. Do meu lado, Ferris atira loucamente, atirando em qualquer ponto que se movesse. Me escondo, quase pulando, na proteção da parede enquanto uma outra bala a explode perfurando. Prendo a respiração ao ver o buraco feito, a massa de areia e cimento a manchar minha armadura preta.

Então, como se não pudesse ficar mais louco, a real balburdia começa. Simplesmente do nada, tiros dourados cortam o céu acertando o solo em cargas duras e pesadas. Literalmente do vazio, uma nave aparece brotando do nada. Vai se abaixando rápido abrindo uma porta grande lateral. Enquanto que, com armas grandes e poderosas, começa a atirar em qualquer ponto visível.

— É nossa chance, vamos. — Grito a plenos pulmões, mesmo sabendo que todos poderiam me escutar pelos comunicadores. — Vamos, Vamos!

Aproveitando da abertura feita pelo jato, corremos. Cody pega um dos feridos e coloca nos braços, enquanto outro soldado pega o outro. Corremos com todas as nossas forças. Os inimigos não param, em um momento, tudo vira uma confusão de tiros e destruição.

Sem a menor hesitação, nos jogamos dentro do jato. Depois que todos estão minimamente dentro, ela decola rápido. Ainda estou jogado no chão pensando o quão desastroso foi a missão quando Ferris, já sem capacete se aproxima. Ele estica sua mão e me entrega um detonador.

— Presentinho, capitão, pode apertar.

Ele sorri e todos os outros o acompanham. Sem entender direito, aperto o botão vermelho e espero a mínima reação. Nada. Ao menos nos primeiros segundos, depois uma explosão. Me viro assustado a tempo de ver pela janela todo o prédio a desabar.

— Mas o quê? — Digo assustado.

— Simples — Responde Ferris já rindo, ele pausa por um segundo e continua — Depois dos explosivos nas paredes, fiz questão de colocar alguns nas colunas de sustentação.

Sorrio, não consigo deixar de não sorri. Acompanho sua risada contagiante, depois, antes que percebêssemos, estávamos todos rindo da situação.

Meu comunicador liga se acendendo de vermelho. Paro de rir. Aperto o botão e espero a voz do outro lado. Ela vem sem nenhuma pausa, fria e quase gutural.

— Beta-19? — Era o general Nash com sua normal antipatia — Me encontre assim que pousar, você está oficialmente desligado das operações. 

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