O refeitório fazia barulho, conversas murmuravam entre as mesas. Já com o prato na mão, me sento. A cadeira é dura e um pouco desconfortável. Apoio o prato sobre a superfície a minha frente. Ao redor de mim, Ferris e Cody conversam. Não só eles, o refeitório está cheio, diversas pessoas em mesas separadas trocam palavras. Todos clones, todos soldados.
Contudo, era visível um ar pesado sobre o local. Não era algo exclusivo daqui o mundo todo está nesse estado estático, sofrido, tenso. Cada pessoa a rir demonstrava uma risada nervosa, seca.
Estávamos em um grande galpão, numa das bordas, mesas com pratos e panelas estavam posicionados. Paredes brancas, dez mesas espalhados pelo ambiente, prédio grande, ar rarefeito.
Assim que me sento, meus amigos percebem minha presença. Temos pouco tempo, voltamos a fazer parte das atividades normais, nossos momentos de folga e filmes acabaram. Ferris se vira e pergunta:
— Então, Capitão, o que acha disso tudo?
Sorrio, forçadamente, mas sorrio. Ele fala dos últimos acontecimentos, o mundo em uma quase guerra, metade dele dividida. Como sempre, Rússia apoiou diretamente a China em uma investida contra os EUA. Inglaterra e alguns outros países apresentaram defesa ao Estados Unidos alegando sua inocência. Os Estados Unidos no dia seguinte fizeram um pronunciamento acusando a China, com provas, de que ela foi a responsável pelas duas pandemias, alegando serem pandemias criadas em laboratório. Claro, mesmo com "provas", sempre vai parecer somente contra-ataque, nunca real.
— Sinceramente, estamos ferrados.
Ele ri, rimos juntos. Não havia graça. Volto minha atenção a comida. Depois de alguns minutos, Cody bate em meu ombro.
— O que houve capitão... Steve?
Olho para ele, parecia preocupado. Volto a sorrir e respondo:
— Nada demais, só estou com um mal pressentimento. Ainda sinto que algo está errado...
Não preciso continuar, algo prende nossa atenção. O comandante Reagan entra na sala. Ele é igual a todos nós, porém transmite uma sensação totalmente diferente, como outra pessoa, ao mesmo que igual. Seus olhos são duros, visivelmente cansado e estressado. Ele respira fundo e começa seu anúncio:
— Senhores, temos uma nova missão, as atividades programadas para hoje à tarde serão imediatamente canceladas, outros assumirão nosso lugar — Sua voz é alta e audível em qualquer lugar do refeitório — Peço que se apressem, peguem suas coisas, seus equipamentos. Faremos uma viagem para Washington em escolta ao secretário-geral. Por enquanto, é só isso. Estejam prontos às 2.
Ele diz e sai. Estava um pouco encolhido e não demonstrava o seu típico sorriso que escapava as vezes entre as ordens. Nosso batalhão, o número 7, havia sido escolhido para servir diretamente ao secretário-geral. Não me impressiona o cansaço do comandante.
— Agora Kruger tentará negociações com o presidente norte-americano — digo olhando para meus companheiros — ou seja, o negócio está tão ruim que é necessário ele ir lá pessoalmente. É amigos, estamos na merda.
Depois das frases rio, Cody e Ferris me acompanham, eram risadas nervosas. Todos os nervos gritavam a flor da pele, como se veneno tivesse sido injetado na veia e ela gritasse a arder. Estávamos tensos, em constante alerta com o risco constante de uma guerra.
O almoço acabou, saímos.
...
Nos movemos para o quarto para fazer os últimos preparativos. Só nos três nos movendo pelos corredores estreitos que levam aos quartos, estávamos nos dormitórios. Cody e Ferris andam lado a lado na frente, enquanto que eu permaneço na parte de trás. Assim que chegamos, Ferris levanta uma sobrancelha em minha direção, clara interrogação. Olho para onde seu rosto aponta, no fim do corredor, exatamente na porta de meu quarto, o oficial Hughes permanece parado, de braços cruzados e a esperar alguém, suponho que a mim.
Retribuo o olhar de Ferris com um abanar de ombros. Nos aproximamos.
— Preciso falar com vocês... a sós.
Meus amigos entram em seus quartos em silêncio, fomos feitos para não desobedecer às ordens, aquela parecia uma ordem.
Abro a porta do quarto e me sento na cama, Hughes permanece em pé. Ele olha ao redor, ainda continuava sem muitas coisas para observar, cama, guarda-roupas e os furos de uma tv retirada, não tínhamos mais tempo para ela.
Hughes parecia preocupado, seus cabelos marrons estavam caídos e arrepiados, ainda mais do que na última vez que nos encontramos.
— Você estava certo...
Ele diz sem nenhuma cerimônia, somente diz sem esperar uma introdução. Fala e espera uma reação, levanto uma sobrancelha em interrogação. Sendo assim, ele continua.
— Tudo o que você disse naquele dia, realmente estava certo. Pesquisei sobre a organização, não é puro caos e nem somente uma visão utópica de uma liderança unificada, é algo mais.
— Tipo o quê?
— Supremacia... investiguei, a China estava certa. Os Estados Unidos agiram diretamente sobre a organização, fundos, estratégias, informações, tudo. Eles estavam diretamente à frente de todos os acontecimentos, gente grande, generais, políticos, uma gama de empresários. Tudo maquinado e não é o fim.
— Suponho que tenha uma hipótese sobre isso, qual?
— Tenho. Uma tentativa de supremacia, ou volta a ela. Desde 2019 que os Estados Unidos têm perdido poder, é visto um declínio de sua influência, poder econômico. Então, apelam ao militar, mas não diretamente, usam dessa organização terrorista como manobra, ferindo os inimigos e possibilitando uma volta do antigo prestigio.
— Essa é uma cartada perigosa que pode muito bem leva-los para uma situação pior, porque fariam isso? — Pergunto.
— Não sei. É por isso que estou aqui, quero que fique de olho e veja isso.
Cruzo os braços em um olhar sério e pensativo. Mordo levemente os lábios inferiores, a perna balança pela situação e a tensão. Respondo:
— Isso não me parece uma missão oficial...
Hughes empalidece, é visível o medo. Porém, continua firme.
— Não é, não por enquanto. Preciso de mais dados para abrir investigação e chamar a atenção dos órgãos mundiais. Pretendo reunir provas e divulga-los como relato em uma rede de informações na internet. Provavelmente chame a atenção mundial. — Ele faz uma pausa, espero o que ele quer de mim, não me contaria atoa. Percebendo isso, ele vai direto ao assunto —Quero que fique de olho em Washington na sua viagem.
— Entendo. Pois bem, não farei isso. Não me envolverei em sua busca. Porém, não falarei nada de sua "investigação" a ninguém... considere isso um favor.
Hughes se fecha, seu nariz parece ainda mais torto que da última vez.
— Imaginei que isso pudesse acontecer. Por um minuto, pensei que fosse melhor do que uma simples cópia, me enganei...
Ele sai, sem despedidas. Paro para pensar, porém o relógio no meu pulso não me permite isso. O alarme soa. Olho para ele, acessório que todos possuem, até mesmo os clones do exército da paz. Deixo para lá os pensamentos, estava atrasado.
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Oi, espero que estejam gostando da história. Fico muito feliz de escreve-la. Então, se gostarem, votem e comentem suas opiniões. Muito obrigado por chegarem até aqui!
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Crise de identidade
Science Fiction#1° Lugar na categoria ação no concurso anjos e fadas. Crise mundial, tensões políticas, guerra. Esse foi o cenário de nosso surgimento, viemos como um exercito para manter a paz na terra, a lâmina da ONU. Clones feitos para a guerra, aprimorados ge...