Capítulo 21: Novo mundo

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– Senhores, creio que todos esperam respostas de mim e não estou aqui para lhes dar outra coisa além de respostas.

Bradley Kruger permanecia ereto diante do púlpito da ONU. Atrás de si, uma imagem projetava a sua imagem e o símbolo da organização. Kruger, mesmo sem sua pose forte, demonstrava leves sinais de cansaço e dor, provavelmente decorrente de sua ferida no ombro. Mesmo assim, ele dava um meio sorriso para a multidão à sua frente.

Presidentes, reis e ministros. As maiores potências mundiais, todos reunidos e em silêncio. Nenhuma palavra. Somente a tensão no ar, a carga elétrica que parecia distorcer a realidade.
O secretário-geral faz um leve silêncio depois de dizer aquelas palavras, deixando que elas entrem na mente das pessoas, que seja processado e que estejam prontas para as que vem em seguida.

– Acredito que saibam os desdobramentos dos últimos acontecimentos. De todas as formas, tentei intermediar um conflito com procedências catastróficas para a humanidade. Uma guerra nuclear...

Ele solta a última palavra, deixando-as ecoar pela enorme sala. Que a imagem mental do que aquilo representa se projete nas mentes de todos e lá fique estagnada, a loucura e o pandemônio de tal acontecimento. Ele respira fundo, agora, depois das duas últimas palavras, há um murmúrio no meio do local. Bradley prepara-se para prosseguir.

– Steve, tudo limpo?

Escuto Cody dizer no comunicador, lhe dispenso com um simples e seco sim. Depois disso continuo a caminhar pelas instalações. Já faz uma semana desde a visita a Washington. Tudo estava um caos. Administrativamente, a sede do governo americano passou temporariamente de sua capital para New York, no prédio da ONU. Novas eleições seriam requisitadas. Tropas clonicas patrulham o país continental. Diversos focos de crises foram detectados, como eu disse, tudo está um caos.

No fim, somente cumpro minhas funções, vigiar o perímetro e escutar, sim, escutar tudo que é dito dentro da reunião. Coisa fácil de fazer quando há no meio do céu diversas projeções a flutuarem e transmitirem cada movimento e palavra dentro daquele recinto. Diversos drones e robôs voam pelo céu cinzento. A sede da ONU está lotada de soldados. As manifestações realizadas na entrada do prédio foram dispersadas, todos estão alertas para ataques de manifestantes ou terroristas. Ninguém tem certeza de nada, a tensão só aumenta. Bradley continua:

– Se desejam razões, pois bem, lhes darei as razões de meus movimentos. Mas para isso, preciso recorrer à história. Uma história que não pode ser esquecida, já que dela decorre as maiores tragédias humanas, as grandes guerras – ele para, estica o braço até uma taça ao seu lado. Pega o copo e o leva calmamente até a boca bebendo um longo gole de água. Tudo com sua normal paciência, mesmo que ela crie uma atmosfera de pressa em todos. Depois, satisfeitos, prossegue:
– Recordados por todos, depois da primeira guerra mundial, uma organização mundial semelhante a essa foi criada, a Liga das Nações. Porém, muito da culpa de uma segunda guerra recai sobre ela. Exatamente por sua inanição, por sua falta de influência e sua passionalidade. Faltou-lhe atitude, um posicionamento.

– Inanição, essa é a palavra que define a antiga e fracassada união, palavra está que não pretendo repetir nessa nossa geração. Por isso agi. Enviei um diplomata para a China e fui pessoalmente a Washington para tentar acalmar os ânimos. Fiz o que pude, porém, em um ato extremo, o governo americano declara guerra e ordena um ataque nuclear, mesmo sendo este último negado por seu parlamento. E, diante de um ataque dessa magnitude, China responde em mesma proporção. Em minutos, veria o mundo em uma crise sem precedentes. Por isso, diante de situações extremas, tomo decisões extremas e declaro formalmente intervenção militar nos dois países...

Agora não é somente um murmúrio contido, toda a sala explode em conversas. Palavras de surpresas e indignação, outros, aprovam os atos e outros tomam a neutralidade, somente observando o desenvolvimento do espetáculo.

De alguma forma, tudo isso me dói. Tudo corre rápido demais. Sinto tristeza, melancolia, talvez seja essa a melhor palavra. Não sei. Às vezes quando durmo, vejo flashes em minha mente, algumas vezes são imagens de criança, dos centros de treinamentos, das salas, dos laboratórios e seus testes. Outras, vejo o capitão, o mesmo rosto que eu, que todos nós. Caído, alvejado e morto, quase como se fosse nós mesmos lá. Depois tudo muda, vejo aquele garoto na minha primeira missão, tão parecido comigo de alguma forma, usado como uma máquina. Um outro eu, desmaiado. Por fim, diversos rostos, todos mortos no atentado chinês. O único botão que eu não parei. Mais de três mil vidas, nossa maior falha, minha maior falha.

Então, à noite, os fantasmas passam por debaixo de minha cama e eu pulo assustado. Vendo-me pálido a perguntar quem eu sou. Diante de tal pergunta, me calo. Porque realmente não sei a resposta. Nem sei se a saberei.

Sou cortado de meus pensamentos por uma voz escondida no meio da multidão. Uma voz indigna que diz:
– Uma intervenção sem o aval do conselho de segurança? Isso é loucura!

Bradley respira fundo e sorri. Um sorriso calmo, depois olha diretamente para seu público. Realmente, o que dizia o interlocutor anônimo não era de todo mentira. Uma intervenção militar somente é permitida por uma decisão unânime do conselho de segurança, da qual a China e os EUA participam. Mas isso é passado. Há muito tempo que Bradley saiu de uma posição de um secretário-geral com funções puramente decorativas e de organização. Sua influência política equivale a de diversos países. Claro, seu exército da paz lhe garante o respeito necessário para não ser ignorado.

– Você está correto. Contudo, não vivemos mais em 1945. Tais instrumentos, se não evoluídos, são capazes de levarem a decadência. Chamem-me do que quiserem, porém, nessa época, tudo que fiz e que faço garante a preservação da raça humana. Tal conselho não possui mais a eficácia que um dia possuiu, provando o contexto em que vivemos. Tememos hoje, mas tudo que faço é pela união das nações, de nossa raça, da humanidade como um todo. No fim, tudo que temos é a união. Faço tudo isso para que nossos filhos possam ter um mundo depois de nós. Um mundo único e próspero. Por isso, se alguém tiver reclamações, peço que diga agora...

Suas palavras são fortes, a conversa é forte. Porém, enquanto ele diz suas últimas palavras, a algazarra se acalma. Ninguém protesta. Ocorrendo isso, a reunião é encerrada e as pessoas dissolutas, sendo cada uma acompanhada por um agente clone.
Tendo as reuniões sido encerradas, os grandes painéis nos céus voltam a projetar jornalistas e a noticiarem os acontecimentos atuais. Indo desde conflito, manifestações violentas até caso de suicídio.

Espera... uma notícia me prende. Olho ligeiramente ao redor, estou sozinho em um jardim verde. Respiro fundo assustado, um suor frio escorre do meu rosto coberto pelo capacete. Não consigo me mover, então permaneço no canto congelado. No meio do céu, noticiado por algum jornal qualquer, o oficial Hughes está projetado e morto...

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⏰ Última atualização: Jul 12 ⏰

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