10. Ataque fulminante

358 43 210
                                    

Finalmente o inverno chegou. Lembro de quando Taylor pediu meu voto sobre o baile, mas não sabia bem para que era até ela me contar sobre a atração. Antes de votar, tinham opções como DJ e solo, e é claro que eu escolhi solo.
A morena ainda não me disse o que vamos ter de tão especial nessa festa, mas garantiu que todos vão gostar. Eu já não tenho muita certeza, meu gosto é peculiar para tudo. Principalmente, música.

— Está lindo, sério.

Olho em volta admirada com a beleza e capricho da decoração feita.
Logo na entrada do salão é possível destacar a cortina azul cobalto, que combina com todos os outros tons no restante dos objetos e adereços. É tanto azul que mal sei dizer a diferença entre um e outro; é mínima, mas provoca mudança quando intercalada com a cor branca.
Há algumas folhas espalhadas na lateral do tapete claro que nos recepciona, e o espaço liberado para as pessoas dançarem está incrivelmente iluminado e... Azul.
Logo à frente é notório algumas mesas com cadeiras, palco e espaço reservado para as bebidas, onde já é possível perceber a presença de um homem e uma mulher.

— Imagino o trabalho para organizar, ainda bem que não fiquei com esta parte — Taylor bufa aliviada e agarra a mão de Lilly, puxando-a para algum canto e fazendo uma foto dela.

— Sua vez, Heaven. — A morena observa a tela do celular enquanto a outra garota vem até mim.

— Ah, não, valeu.

— Ela é a que odeia pessoas, amiga, deixa para lá.

Entreabro a boca e dou um tapinha do braço dela, cruzando os meus em seguida.

— Você odeia as pessoas? — Lilly indaga como se realmente acreditasse no que a amiga disse.

— Não, eu não odeio as pessoas — justifico. — Só prefiro quando elas não estão por perto. — balanço os ombros.

— Bem sociável.

— Bukowski disse isso, sabia?

— O que é Bukowski? Algum tipo de bulldog? — ri.

— Já consigo imaginar como vão suas notas em filosofia — reviro os olhos, mas acabo cedendo ao riso.

— O pessoal está chegando, vou pegar a câmera para as filmagens. Vem comigo, Lilly.

— Vou falar com o Isaac — aponto para trás.

Não sou fã de festas extremamente formais e o primeiro — e espero que último — desses eventos que frequentei, na minha própria casa, foi bem desagradável. Pelo menos a parte em que eu ainda estava lá.
Ajeito meus pés na sandália de salto e puxo um pouco o vestido para baixo. É bonito, meio acinzentado, pouco rodado e com mangas cobrindo meus ombros, mas acho que me arrependi de ter deixado Taylor escolher, ficou curto demais.

— Oi, ruiva — Isaac passa o braço pelo meu pescoço, sorrindo.

— Heaven, esse é o Liam.

Olho para o rapaz que está perto dele e sorrio tentando ser simpática. Ele retribui com um aceno.
Rapidamente, o salão fica cheio de jovens e uma música agitada deixa o ambiente descontraído. As garotas que tinham saído para buscar a câmera voltam e se aproximam, cada uma segurando um dos meus braços.

— O que querem de mim? — ergo uma sobrancelha.

— Vamos aproveitar a festa, não podemos madrugar nessa.

— Eu ainda me sinto deslocada aqui. Podem respeitar minha timidez?

— Ainda se sentiria deslocada se disséssemos que o Gryffin vai cantar?
Paro de andar e encaro Lilly com o semblante confuso.

— Como conseguiram isso? — solto um riso, incrédula.

— A direção conseguiu. Só fizemos a indicação — Taylor olha para o palco.

— Acho que estou começando a gostar desse colégio.

Desvio a atenção das garotas quando meu celular notifica uma mensagem de Ethan, dizendo: "Cinza cai bem em você."
Sou obrigada a desviar os olhos da tela do aparelho e olhar em volta, procurando o sujeito inconveniente. Sem sucesso, decido voltar a olhar para o palco, aguardando a apresentação da noite junto com os demais alunos.
Depois que a música começa, não demora muito para que apesar do som, eu escute uma voz grave chamando meu nome. Olho para trás e consigo enxergar Joe acenando freneticamente e seguindo até o palco por um dos lados do salão.
Assim que ele chega onde queria e atrapalha ridiculamente o show, toma o microfone da mão do Gryffin.

— Estão vendo essa ruivinha, aí no meio? — aponta para mim. — Ela é minha filha.

— O que está fazendo? — questiono depois de me dar conta do quão bêbado ele parece estar.

— Ela é minha filha, mas eu nunca quis ser pai.

Consigo sentir meu estômago embrulhar e minha garganta ficar seca; efeitos da extrema vergonha que estou sentindo agora. Sem contar os burburinhos das pessoas ao meu redor.

— Acho que vou ter um ataque fulminante — consigo escutar a voz tensa de Isaac atrás de mim.

— Quando ela veio morar comigo, a única coisa que consegui pensar era em como eu ia cuidar de uma adolescente mimada e que eu sequer conhecia — ele dá risada.

Engulo seco e ajeito a postura, fazendo de tudo para não dar o gosto das minhas lágrimas à ele.

— Se eu estou aqui hoje, é por causa dessa garota — ele cambaleia para o lado e o homem que até então estava cantando, tenta tomar o microfone de sua mão. Ele reluta, empurrando o outro sujeito.

— Quer saber o motivo de eu ter aceitado você? — dá um passo para frente. — Remorso. Em algum momento eu me senti mal por ter deixado você, mas quando chegou aqui, percebi que eu tinha feito a coisa certa.

— Alguém tira ele dali — sussurro.

— Você é uma inútil, assim como sua mãe era.

Cerro os dentes e sequer espero que alguém faça algo. Subo até o palco e lanço o microfone que estava em sua mão, no chão, encarando seu rosto e limpando a lágrima que infelizmente não consegui conter.

— E você é um bêbado nojento, fútil e um verdadeiro cuzão — me viro para as pessoas. — Pensem o que quiserem, mas não deixem de aproveitar a noite por causa disso.

Tiro a presilha que segurava parte do meu cabelo e jogo em qualquer lugar assim que desço, seguindo sem olhar para trás até o jardim do colégio, onde está a arquibancada.
Não sei o que pode ter acontecido para ele ter decidido vir aqui e acabar com uma noite que tinha de tudo para ser no mínimo divertida, para mim. Não espero e nem quero desculpas idiotas, só preciso pensar bem se ainda vale a pena continuar passando por tanta humilhação, desde me oferecer para morar com ele, até o que aconteceu segundos atrás.

Heaven Onde histórias criam vida. Descubra agora