|Capítulo 10|

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02 de maio de 1945 

Amanheceu com o tempo nublado. Nenhuma luz sequer passava por entre as janelas grandes da fábrica para nos saudar com o novo dia, parecia que os céus acompanhavam os meus sentimentos, por estarem tão cinzas, tão tristes como eu. Nada estava certo. Aqui poucos minutos Rustan deixará o hospital. Não apenas ele irá embora, mas assim como uma parte de mim irá com ele.

Dizem quando se está apaixonado é assim: sentimos a falta do outro quando se vá, mas a vida retorna ao se reencontrar com ela, a pessoa amada. O coração volta a bater até errar os compassos, o sorriso se alarga no rosto ressaltando as maçãs da face, as cores do rubor se manifestam entregando todos os verdadeiros sentimentos... Tudo volta como antes ou ainda melhor... É bom se apaixonar. Mas não por um soldado russo que está prestes a voltar para seu pelotão.

Quando eu acordo, não ousou olhar para ele e pensar no que estava para acontecer, não queria materializar meus pensamentos, por mais que fossem imutáveis, aquilo irá acontecer, goste eu ou não. Levantando e sentando, eu fecho os olhos para deixar meu corpo se acostumar com o novo dia que teria.

Repentinamente eu sinto um abraço e olho sobressaltada para o lado encontrando Rustan parecendo carente, ele fica muito tempo assim até eu limpar a garganta chamando a atenção dele. O mesmo me lança um olhar feio e para com o gesto carinhoso.

-Malvada -pronuncia e se afasta de mim, sentando-se em sua cama. Eu o olho achando graça e sorriso como boba para ele.

-Abusado -rebato cheia de charme revirando a cabeça, mesmo com meus cabelos todos bagunçado e o rosto amassado, ele não parecia se importar com isso, via muito além disso...

Rustan não se importava com banalidades ou apenas atualmente ele não se incomoda mais com a boa aparência, do jeito que me via, era mais lindo do que se eu me arrumasse inteira... Não era pelo exterior por qual ele havia se apaixonado por mim, assim como eu por ele; ambos víamos o interior um do outro e, mesmo sendo sofrido, com cicatrizes profundas e quase incuráveis, o que havia ali era muito maior do que o tempo deixou e marcou em nós. 

Podem todos dizer que é apenas uma paixão ardente pela carência do amor humano, por conta de que guerra que extinguiu esse sentimento, trazendo somente caos, mortes, destruição em todo redor, contudo sabíamos claramente que não era isso...    

-A senhorita fica linda me xingando -diz simplesmente, como se aquele seu elogio não fosse nada. Meu rosto instantaneamente cora e eu mordo os lábios nervosamente, querendo esconder a face dele, escondendo-me atrás de minhas mãos.

-Rustan! -eu o repreendo por ser audacioso comigo, não ter medo de dizer o que pensa ao meu respeito. -Não assim!

O homem revira os olhos reclamando mentalmente de minhas manias por repreender sempre seu jeito totalmente livre e espontâneo por falar comigo, não que seja ruim, mas libertador demais. Ainda mais no meio do hospital com pacientes em volta. Ali, de maneira alguma, é lugar para cortejar uma dama. Totalmente inapropriado.

-Mulheres... -escuto dizer e eu abro a boca querendo responder a seu comentário, quando acrescenta: -Ficou ainda mais linda para mim, com essa expressão toda brava e as bochechas coradas. Está me provocando por saber que eu não resisto mais a sua beleza?

Eu não sabia que dizia seriamente ou apenas brincava comigo, contudo suas palavras surtem efeito e eu fico ainda mais vergonha. Meu coração erra todas as batidas, quando eu encontro com seus olhos brilhantes e totalmente focalizados em mim -aquele homem iria me enlouquecer de vez.

Bufo por não conseguir dizer nada e escuto de fundo sua gostosa risada esquentando meu peito com todos os meus sentimentos por ele. Eu já havia dado tanta liberdade a esse homem, que ele agia espontaneamente comigo a partir de agora, como se fosse a sua amiga ou até mais do que isso -eu deveria começar a me acostumar com sua ousadia pronunciada à mim.

Amor a Toda ProvaOnde histórias criam vida. Descubra agora