Rustan Abromowitz
- Senhor, eu... - ela hesita em me responder diretamente, desviando o olhar de meus olhos e abaixando para a mesa, suas mãos se unem e apertam uma a outra, tentando encontrar uma resposta para mim sobre o que aconteceu, mas ela não parecia saber explicar. - Como eu lhe disse, o senhor veio ao lugar certo, mas... - os olhos dela se enchem de lágrimas, lágrimas cruéis que queimam o meu peito e me preenche com medo de sua fala seguinte.
- Maria, o que aconteceu? - eu pergunto mais uma vez e ela crava os olhos em mim, engolindo em seco e recuperando as forças para me dizer:
- Senhor, a garoto morreu. Apesar de não ter morrido da infecção, creio eu que algo a mais aconteceu com ele durante seu período em guerra, alguma coisa não visível aos meus olhos de enfermeira. Eu... Eu posso ter deixado também passar por estar velha e não estar mais prestando atenção como antigamente. Mas foi um milagre ele ter aguentado tão firme. Foi uma linda benção a presença dele nesta casa, muitas coisas aconteceram por aqui e ele foi tão forte e protetor com a minha preciosas Line... Apesar de nem todos saberem, o pai dela foi um judeu e tinham preconceitos, ainda tem, mas Klaus, com seu jeito peculiar, doce e extraordinário, mudou grande parte a mente das pessoas do vilarejo.
Eu ainda não acreditava em suas palavras, porque não poderiam ser verdadeiras, eu queria tanto escutar que ela brincava comigo e mentia só porque eu era um soldado soviético e não merecia saber... Porém, pela forma que me dizia, aquilo me afirmava que era verídico a sua história e que eu precisava urgentemente pensar em como contar a Leah isso.
Leah, Leah... Como eu irei contar isso a ela? Como poderia? Eu não sei...
Levo a mão na cabeça e a passo, mudando meus olhos o foco e me levanto abruptamente da cadeira, fazendo-a cair com a minha impulsividade e ecoando pela casa o som agudo. Esfrego o rosto e sinto-me enlouquecer a cada segundo, porque eu vim de tão longe para saber que aquele era o desfecho da vida de uma criança inocente, pura, o irmão de Leah.
- Não, não, não... Não pode ser... Como... Como ele morreu? - eu precisava saber, tinha que perguntar para entender se a minha demora lhe causou sua morte.
- Como um herói, mas também em paz. A alguns quilômetros daqui tem campos silvestres que conseguiram ser salvos das mãos dos inimigos e está repleto das mais belas plantas que o senhor já viu, consegue se ver bem no fundo os morros e quando as nuvens estão pesadas demais pela chuva, parecem montanhas enormes nos guardando... Ouve-se lá os sons de pássaros, animais exóticos, um paraíso escondido. Eu sempre levo minha neta para lá, a fim de colher as flores e conseguir ervas frescas para meus chás e remédios naturais.
"Depois de curá-lo, ele se mostrou ser uma criança bem agitada e alegra, gostava de explorar o mundo e ir para lá e para cá. Eu o permiti ir com Leni até o campo, porque faria bem a ele, e dias mais tarde, ele chegou até mim e e agradeceu por tudo o que eu lhe fiz, deu-lhe esperanças e motivos para continuar a viver, porém, ele me afirmou que não teria mais tempo para ir atrás de sua irmã, porque não tinha mais forças. Disse que o tempo estava tarde e que seu coração não aguentaria."
"No momento eu não compreendi o que ele queria me dizer, porque não fazia sentido suas palavras. Mas então ele me disse que iria até o campo naquela noite e que se não voltasse, era porque o que ele mais temia, teria acontecido. Foi então que eu percebi que havia algo de errado com ele, mas seria tarde demais para cuidar, ele parecia tão decidido que eu não poderia ser egoísta e não permitir seu último desejo. Ainda sim, eu senti que fui responsável por sua morte, se ele não tivesse ido, eu poderia ter ajudado a se recuperar..."
"Na manhã seguinte, eu acordei antes do sol, sentindo o sereno umedecer minhas roupas e congelar o meu corpo de frio, mas eu não parei até chegar ao campo... Eu o encontrei lá, sozinho e no escuro, mas não estava gelado, bem... estava por causa da sua morte, mas parecia que não sentiu frio durante na noite, porque quando me aproximei eu vi brasas e cinzas no local. Creio eu que fez uma pequena fogueira para se aquecer. O senhor tem que ver o céu aqui no anoitecer, é fenomenal, é glorioso. Mágico. Milhões de estrelas sorrindo para nós. Quando estamos na escuridão da noite, nunca estamos sozinhos de fato, porque sempre tem alguém a nos olhar e proteger."
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Amor a Toda Prova
Historical FictionNo final da segunda guerra mundial, Leah, uma alemã que vive com uma prima de seu falecido pai, sente em sua própria pele os horrores que uma guerra produz, sentindo a extrema necessidade pela sobrevivência, ainda mais com a notícia do avanço dos so...