XX - INGERAS: O ÚLTIMO ELO

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O Príncipe Ingeras VI, descendente inacreditavelmente idêntico ao filho unigênito do Conde Drácula, quando ele ainda era humano, debruça-se em seu travesseiro enquanto dorme, por conta dum terrível pesadelo que o atormenta:

Durante o sonho; ele caminha por seus aposentos reais, quando vindo dalém duma grande janela atrás dele, surge uma figura funesta, a silhueta imensa e alada de alguém que adentra seu quarto dizendo:
- Meu filho!
- Meu Pai? - O príncipe sussurra correndo até as janelas e as fechando o mais rápido que pode, enquanto um morcego imenso é envolvido por uma névoa negra que logo ganha a forma dum homem Alto e forte que veste uma longa capa preta com forro carmesim. - O que faz aqui, não deves arriscar-te tanto!

Os dois então ignoram suas atuais naturezas; posições e circunstâncias; abraçando-se como pai e filho como há muito tempo não faziam desde que precisaram separar-se por conta da nova natureza de Drácula.
- Sou mais rápido do que imagina, meu jovem. - Drácula murmura ainda abraçando seu filho humano bem forte. - Ou devo dizer, meu grande homem?
- Não creio que já se passou uma década desde que deixei a humanidade para trás!
Mas... Olhe só para você, meu filho, tornou-se um grande líder. - O Senhor da Escuridão diz tocando as faces de seu filho que não via há muito tempo.
- Queria que ainda estivesses aqui comigo, meu pai! - Ingeras diz cabisbaixo.
- Mas estou, bem aqui. - Drácula sussurra tocando o peitoral do príncipe com a palma de mão esquerda. - Obrigado pelo decreto que fizeste, meu filho, para impedir que os homens avancem contra o meu castelo.
- Confesso que me houve mister fazê-lo, meu pai. Graças ao que te tornastes o povo tem pressionado os sábios e clérigos.
- Malditos sejam! - ao Conde murmura rangendo os dentes, enquanto seu filho continua:
- Estes por sua vez, já sugerem que o lugar de nossa antiga morada seja pilhado.
- Sabes que não serão nada além de cadáveres antes mesmo que passem de meus portões, não é? - O Senhor da Escuridão diz sorrindo, ao que Ingeras responde:
- Exatamente por isso estabeleci este tratado, para mantê-los longe da própria morte iminente. Os ataques, por parte de tuas esposas e filhos vampiros...
- Seus irmãos... - Drácula interrompeu, mas foi rebatido:
- Quaisquer daquelas criaturas; veriam-me como algo além de um saco de carne cheio de sangue, meu pai.
É por isso que ainda luto para manter o povo da Transilvânia longe de vós, pelo bem dele próprio!
- Não pensa em também proteger seu velho pai? - Drácula indaga intrigado.
- Creio piamente que já não precisas de proteção alguma, meu pai. Outrossim, não seria hipócrita em negar que me alegrou revê-lo.
- Quem sabe um dia possas conhecer teus demais irmãos. - O Conde diz um tanto inseguro, e o príncipe desconversa:
- Quem sabe, meu pai? Desejo apenas o bem para o meu povo! Apenas cesse os ataques cada vez mais frequentes aos vilarejos e quem sabe haja paz entre nós.
- Farei o possível, meu filho! - Drácula diz se despedindo com um aceno que também faz a grande janela fechada príncipe fechou outrora, se abrir com um estrondo.
- Saiba que ainda o amo muito, meu pai! - Ingeras diz olhando fixamente nos olhos vermelhos de seu pai vampiro, mas ao abraçá-lo, alerta num tom claramente ríspido:
- Porém estejas ciente de que devo proteger meu povo, do mesmo modo que desejas proteger o teu.
- Que assim seja; alteza! - Drácula ainda assente, quando seu corpo inteiro explode se transformando numa revoada de morcegos que faz o príncipe Ingeras VI acordar, gritando em meio a uma madrugada onde fortes trovões anunciam uma tempestade que se aproxima.

- Que farei, Deus meu? Por que tenho tido tais sonhos, como se fora meu antepassado de séculos atrás? - O príncipe indaga levantando-se e saindo de sua cama, furtivamente para não acordar uma bela dama que ainda dorme ao seu lado.
- Aquele do qual eu deveria ser o legado, é justamente o mal do qual meus antepassados e eu protegemos ao povo que nos foi confiado.

Algum tempo depois; o príncipe já bebe um pouco de vinho, sozinho na cabeceira duma grande mesa na qual serviam-se banquetes, quando vestida com um túnica branca e leve que cobria-lhe o corpo nu, uma bela dama de longos cabelos negros e pele marfínea, diz surgindo logo atrás da cadeira onde ele está sentado:
- Meu senhor; perdoe o atrevimento desta humilde cortesã a quem deste a honra de introduzir às tuas câmaras, mas pareces tão aflito. O que o incomoda?
- Ah, venha linda dama. - Ingeras VI convida a mulher para sentar-se sobre o colo dele. - Perdoe-me, qual é mesmo teu nome?
- Sou Licana; meu senhor! Dona de um dos vinhedos mais prósperos de teu reino, apesar de os conservadores destas terras não verem-me com bons olhos, jamais deixaram de provar do que minhas terras oferecem.
- Pois eu a aprecio por seres mais que a dona de um vinhedo. Sabes disto, não é? - Ingeras VI diz cheirando-lhe o cangote.
- Sei bem disto, milorde. - Licana diz retribuindo às carícias enquanto sente algo volumoso tocar-lhe as nádegas. - O destino foi gentil comigo ao permitir que me salvasses, usando tua espada contra aqueles lobisomens que atacaram minha carruagem há tantos anos atrás!
- Sem dúvida, ele foi sim. - Ingeras VI diz dando um sorriso tão malicioso quanto encantador enquanto se levanta, e afasta o cálice com o braço fazendo-o cair ao chão e colocando a própria Licana deitada sobre a mesa com todo cuidado, sugere:
- Felizmente a noite ainda não acabou, bela Licana!
- De fato! - A dama diz enquanto ele levanta-lhe o vestido leve que cobria-lhe o corpo e tira a própria túnica com a qual dormia e fora até aquela mesa para ficar sozinho, enquanto pensava no que fazer a respeito de seu povo e do próprio pai, o Conde Drácula. - Mas noto que algo o transtorna. Se aceitasse a sugestão de tua humilde serva, talvez chegasses ao fim de todo este tormento estampado em tua linda face, alteza.
- Ouvistes sobre aquele meu antepassado, não é? Tenho tido pesadelos como se fora Ingeras I e além disto Drácula tem visitado meus sonhos, como se ambos tivessem um acordo de paz! - Ingeras VI diz num tom assustadoramente ríspido, como se Licana dissesse algo que não deveria ter dito, mas ela logo se mostra hábil com as palavras:
- Não te preocupes. Todos temos nossos segredos.
Não temas; pois este está a salvo comigo assim como o nosso, meu senhor.
- O que me sugeres, Licana? - O príncipe diz tirando a própria roupa e ficando como veio ao mundo, se deita sobre a própria mesa, ao lado da dama, a quem cobre o corpo também nu, com o vestido que acabou de tirar dela.
- Não há mister que cubras o que tanto já provastes e bem conheces, milorde. - Licana diz sorrindo e se descobrindo, vira-se para o príncipe enquanto continua:
- Não dispensastes todos serviçais? Então ninguém nos incomodará, estou certa?
- Certamente! - Ingeras VI diz sorrindo enquanto acaricia seu longos cabelos sedosos. - Pois então, diga-me, minha voluptuosa Licana. Que solução é esta que tendes a dar, no tocante ao meu dilema?
- Revogue este famigerado acordo que vossos antepassados fizeram sobre mantermos distância das terras do Conde Vladislaus, milorde. Pense em quanto sangue já foi derramado e nada foi feito contra aqueles demônios.

[ UDG ] Sr. CONDEOnde histórias criam vida. Descubra agora