Capítulo 2

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É a primeira noite abafada do verão, e eu me encontro sozinha em casa, tentando aproveitar o silêncio, mas percebendo que estou andando de um cômodo para o outro, inquieta.

Diarra saiu com Trash, o mais novo tenista louro de sua interminável lista de namorados. Não consigo falar com minha melhor amiga, Sina, que está completamente envolvida com a namorada dela, Heyoon, desde que as aulas acabaram há uma semana e ele se formou.

Não há nada que eu queira ver na TV, nenhum lugar da cidade aonde queira ir. Tentei me sentar na varanda, mas, com a maré baixa, o ar úmido fica pesado demais e um incômodo aroma de lodo é trazido do rio pela brisa.

Por isso, estou sentada em nossa sala de estar com o teto abobadado, mastigando o gelo que sobrou no copo, folheando a pilha de revistas de fofocas sobre (sub)celebridades de Diarra. De repente, ouço um apito alto e constante.

Enquanto ele azucrina, olho à minha volta, assustada, tentando descobrir o que é.

É a secadora? O detector de fumaça? Por fim, percebo que é a campainha, tocando, tocando, sem parar. Corro para abrir a porta, esperando - que saco! - ver um dos ex-namorados de Diarra, que, sentindo-se audacioso depois de tomar várias caipifrutas de morango no clube, veio reconquistar minha irmã.

Em vez disso, encontro minha mãe, pressionada contra a campainha, sendo beijada até a alma por um homem que não conheço.

Quando abro a porta com força, os dois quase caem, mas ele apoia a mão no batente e continua a beijá-la, como se não houvesse amanhã. Então, fico ali parada, me sentindo idiota, de braços cruzados, a camisola fina balançando levemente no ar denso. Vozes veranescas me cercam.

O bater do mar longe dali, o rugido de uma moto subindo a rua, o soprar do vento entre as árvores. Nada daquilo - e com certeza não a minha presença - faz minha mãe e aquele cara pararem. Nem o estouro do escapamento de uma moto, que entra no terreno dos Urrea's, algo que normalmente a enlouqueceria.

Por fim, eles se soltam, tentando respirar, e ela se vira para mim com uma risada envergonhada.

- Gabrielly. Nossa! Você me assustou.

Minha mãe está com o rosto vermelho, a voz aguda e afetada. Não fala com o tom de "sou eu que mando" que costuma usar em casa, nem com a frieza açucarada que exibe no trabalho.

Cinco anos atrás, minha mãe entrou para a política. Diarra e eu não levamos isso a sério no início - nem sabíamos que mamãe votava. No entanto, um dia, ela voltou de um comício toda animada e decidida a virar deputada. Depois, se candidatou e foi eleita, e nossas vidas mudaram completamente.

Tínhamos orgulho dela. É claro que tínhamos.

Mas, em vez de preparar o café da manhã e vasculhar nossas mochilas para garantir que havíamos feito o dever, minha mãe saía de casa às cinco da manhã e ia para Hartford "antes do trânsito parar". Ela trabalhava até tarde em comissões e sessões especiais. As atividades importantes dos fins de semana deixaram de ser os treinos de ginástica da Diarra e minhas competições de natação e passaram a ser estudar propostas que seriam postas em votação, participar de sessões especiais ou de eventos locais.

Diarra recorreu a todas as táticas de mau comportamento adolescente possíveis e imagináveis. Começou a usar drogas e a beber, cometeu pequenos furtos, transou com vários garotos. Eu li pilhas de livros, decidi ser democrata (minha mãe é republicana) e comecei a passar mais tempo do que de costume observando os Urrea's.

Por isso, hoje, estou, paralisada aqui, chocada com o prolongado e inesperado amasso, até minha mãe finalmente soltar o cara. Ele se vira para mim e eu fico sem ar.

Minha Vida Mora do Outro Lado  -  NoanyOnde histórias criam vida. Descubra agora