Capítulo 16

474 54 15
                                    

Noah põe a mão no vidro e bate bem de leve, mas estou tão à espera daquele som que em menos de vinte segundos já abri a janela e saí.
Ele indica o cobertor estendido sobre o telhado.

— Veio bem preparado, hein? — comento, escorregando até ele.

Ele estende o braço na minha direção e o passa em volta do meu pescoço.

— Tento sempre estar um passo à frente. Além disso, eu precisava de incentivo para terminar o treinamento, então pensei que ia encontrar você aqui.

— Eu fui seu incentivo?

— Foi.~

O braço dele está quente na minha pele. Dobro os dedos do pé na ponta do cobertor, passando-os pelas telhas ainda mornas. Já são quase nove da noite e o restinho do dia está perdendo a batalha contra a escuridão. Será outra noite estrelada.

— As estrelas mudam dependendo do lugar do mundo, sabia? Se a gente estivesse na Austrália, veria constelações totalmente diferentes.

— Não é só invertido? — Noah me puxa para mais perto e apoia minha cabeça no seu peito. Respiro fundo, sentindo a pele quente e o cheiro de camisa limpa. — Ou de cabeça para baixo? É totalmente diferente?

— É bastante diferente — confirmo. — É inverno na Austrália, então estão vendo o Cisne... e o Cinturão de Órion. E uma estrela laranja avermelhada, Aldebarã, que faz parte do olho de Touro.

— E como foi, exatamente — pergunta ele, passando o dedo preguiçosamente pela gola da minha camiseta, um movimento incrível —, que você se tornou astrofísica?

— Foi de um jeito meio torto. — Fecho os olhos, sinto o cheiro da grama cortada, das roseiras da minha mãe, do banho de Noah.

— Continua — encoraja ele, passando o dedo pelo meu pescoço e seguindo a linha da mandíbula, depois descendo até o ombro e de volta ao decote. Sinto-me quase hipnotizada por aquele movimento simples e me pego confessando uma história que nunca contei.

— Você sabe que meu pai deixou minha mãe antes de eu nascer, não sabe?

Ele faz que sim com a cabeça, a testa enrugada, mas não diz nada.

— Bom, eu não sei como aconteceu. Ela não fala sobre isso. Se foi ela que pôs ele para fora, se ele simplesmente foi embora, se eles tiveram uma briga feia ou... sei lá. Mas ele deixou umas coisas para trás numa caixa enorme que minha mãe devia mandar pelo correio. Acho que era isso. Mas ela ia me ter e a Diarra era muito pequena, só tinha um ano. Por isso, acabou não mandando, e a largou no fundo do armário da entrada.
Sempre achei que aquilo não combinava com a minha mãe, que sempre limpava cada pedacinho da casa.

— Diarra e eu encontramos a caixa quando eu tinha uns cinco anos e ela, seis. Achamos que fosse um presente de Natal ou coisa assim. Por isso, abrimos, animadíssimas. Mas estava cheia de quinquilharias: camisetas velhas com nomes de bandas, fitas cassete, fotos de grandes grupos de pessoas que não conhecíamos, material esportivo, um tênis. Um monte de coisas. Não era o que a gente esperava depois que percebeu o que era.

— O que vocês esperavam? — A voz de Noah soou baixinha.

— Um tesouro. Diários antigos ou alguma coisa assim. A coleção de Barbies dele.

— Ah... O seu pai colecionava Barbies?

Caio na risada.

— Não que eu saiba. Mas éramos muito pequenas. Teríamos preferido isso a sapatos fedidos e camisetas do R.E.M. e do Blind Melon.

— É, faz sentido.

Agora, o dedo de Noah desce até meu short, traçando a mesma linha lenta pelo cós. Respiro fundo, com dificuldade.

Minha Vida Mora do Outro Lado  -  NoanyOnde histórias criam vida. Descubra agora