Capítulo 5 _ Confissões

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Estava tudo escuro a minha volta, como se estivesse a vagar sozinha pelo espaço a milhares de anos-luz, onde os raios do sol não penetram, aqui é escuro e gelado. Ouvia o vento a soprar, mas não o sentia embora o frio tomasse conta do espaço.

— Não, não estás. Tu não estás no meu lugar. Tu não és eu. Eu só queria poder sentir. Amari você não entende. Amari não… — As vozes continuavam a dizer sem parar.

Vozes e mais vozes, o que queriam de mim? Parecia que um espírito maligno tinha-se apoderado da minha mente e não tencionava abandona-la tão cedo, porém, eu sabia que não se trava de espírito ou assombração alguma, conheço essa voz, agora lembro, conhecia esse tom muito bem.

Agora via-se uma luz fraca, porém vibrante, vinha de uma porta entre-aberta que surgiu sem avisos no vazio em que estava. O vácuo começou a ganhar forma e transformou-se num corredor pouco iluminado, os meus pés descalços tocavam agora o chão frio de madeira. Caminhei até a luz reconfortante e fiquei a escutar as vozes que propagavam no interior do cómodo, do qual aquela robusta porta tinha acesso, eu estava no corredor enquanto o Amir e o Aires encontravam-se do outro lado da alvenaria a conversar.

— Por favor não conta a ninguém, peço-te — pediu o Aires — sei que não é justo o que estou a pedir-te, juro que vou contar para todos, mas não agora, da-me só mais um tempo.

— Tudo bem, agora podes deixar-me sozinho — Amir suplicou.

Desde a confissão do Amir no viaduto que ele não consegue olhar nos nossos olhos direito, ele pune-se por odiar os seus irmãos. Não trocamos uma só palavra desde aquele momento, essa é a primeira vez que o ouço falar, desde então, fiquei com um ligeiro ciúme por ter sido com o Aires e não comigo.

Aires saiu do quarto e notou a minha presença ali estagnada. Amir por sua vez manteve-se no cómodo, acho que ele começou a chorar, ouvia-se barulho de objetos colidirem com o chão seguido de um berro feroz, o grito e a angústia que senti vindo dele deixaram-me atormentada.

— O que você ouviu? — Aires parecia preocupado com a minha presença.

— Nada de mais, cheguei a pouco.

— E o que seria esse nada de mais?

Ele estava muito nervoso e de certeza que não era pelo facto de o Amir estar a surtar no compartimento ao lado. Ele tinha medo da minha resposta. Tinha medo de saber que eu ouvi alguma coisa, o que estarás a tramar agora, Aires?

— Nada de mais é nada de mais. — aborrecido pela minha resposta, revira os olhos e passa por mim, mas para há alguns centímetros, pois prossigo com a minha inquietação — o que tem o Amir?

— O mesmo de antes. — suspirou pesadamente e continuou — O melhor é deixa-lo estar por agora ou pode piorar. Falei com o pai, ele chamou um psicólogo a mando da tia Kénia.

— A tia Kénia também vem?

— Sim, o psicólogo vai falar com todos nós, não só com o Amir.

— Foi o que pensei, é o mais certo.

Sempre me questionei como seria falar com um psicólogo, só o Aires tinha sessões com um, desde que foi diagnosticado com Analgesia congénita, assim como os exames que ele tinha que fazer, era só 1 vez por ano.

— Então tá!

Ele virou-se novamente na direção oposta a mim e apressou os passos, parecia que quer fugir da minha pessoa.

— Aires espera, ainda não terminei de falar. Vocês estão a esconder-me alguma coisa?

— Esquece isso Amari. Porquê que não entraste e participaste da conversa em vez de ficar a espionar? E, porquê que estás tão nervosa quanto a isso?

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