Estou ficando assustada.

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Naquele exato momento a expressão de incredulidade no rosto de Rafaella só não superava o vinco que se formara em sua testa, indicando a falta de apetite. A comida que havia sido posta em seu prato não era nojenta como costumavam dizer, por sorte, contudo, tampouco era aquelas mil maravilhas.

-- Salada ou não? -- A cozinheira voltou a repetir com sua expressão de tédio e Rafaella acordou de seu transe.

-- Ôh boneca, acho melhor escolher logo, estou com fome e não tenho o dia todo. -- Uma mulher extremamente tatuada, de cabelo loiro e com marcas que Rafaella julgou ser onde os piercings ficavam, falou, sorrindo de forma cafajeste para Rafaella, que assentiu e pediu salada, saindo dali às pressas para movimentar a fila.

Ela procurou uma mesa para se sentar, porém todas estavam ocupadas, o que lhe deixava somente uma opção: Conversar com outra detenta. Seus olhos procuraram algum rosto não tão assustador e então encontraram o mesmo par de olhos castanhos lhe encarando. Ela respirou fundo e caminhou até sua mesa.

-- Será que eu posso...

-- Não. Vaza! -- A voz rouca foi firme, fria e seca, fazendo Rafaella suspirar e assentir.

Ela franziu o cenho quando viu uma mão no alto acenando para ela desesperadamente. Deu uma olhada para trás e aos redores, se certificando de que era com ela mesmo e quando constatou que sim se aproximou.

-- Olá, sente-se. -- A voz meiga proferiu. Rafaella atendeu seu pedido e se sentou, reparando que a garota era loira, sorridente e gentil. Pequenas sardas cobriam seu rosto e ela usava um uniforme marrom e branco, então não era
novata. -- Me chamo Manoela, mas pode me chamar de Manu.

-- Sou Rafaella. -- Ela disse um pouco cética devido a todo aquela gentileza e bom humor.

-- Primeiro dia aqui e já tem várias de olho em você. Logo alguém te pega. -- Rafaella franziu o cenho.

-- Alguém me pega? -- Perguntou confusa.

-- Sim, demorei três meses para ser pega por alguém, mas duvido que você passe de uma semana.

-- Em que sentido? -- Rafaella perguntou alheia ao que a garota dizia.

-- Oh, é sua primeira vez presa? -- A garota perguntou e Rafaella assentiu. -- Bem, as líderes dos bandos costumam pegar as novatas para serem suas parceiras sexuais. Elas te oferecem proteção em troca e outros benefícios, como comidas melhores do que as que nos dão aqui.

-- Não estou interessada, obrigada. -- Rafaella disse, tentando comer uma folha de alface, que era a única coisa que sentiu vontade de comer. Manu riu ao ouvir aquilo, levando uma mão até sua boca para abafar o som.

-- Você é engraçada. -- Disse e Rafaella percebeu que sua voz era um pouco enjoativa. -- Não é como se tivéssemos opção. Se não fizermos por vontade própria, uma hora ou outra alguém fará a força. -- Rafaella engoliu em seco. -- Nem todas são assim, mas algumas... -- A garota deixou sua frase morrer ao dar de ombros.

-- Quem... quem é aquela? -- Rafaella perguntou, apontando com o queixo para a garota de olhos castanhos que ainda a fitava sem pudor.

-- Bianca Andrade. Não deveríamos falar dela, é a líder absoluta.

-- Ela não para de me olhar. É intimidador isso. -- Rafaella reclamou e a garota arregalou os olhos.

-- Ela te olha? -- Rafaella assentiu. -- Talvez você quebre o título dela de intacta.

-- Intacta?

-- Sim. Ela está aqui há quase três anos e se tornou a líder no primeiro ano, quando derrotou a antiga líder. --Falou baixo para ninguém mais ouvi-las. -- Ela jamais pegou alguma novata para ela.

-- Por que ela está aqui? -- Rafaella não se conteve em perguntar, vendo a outra dar de ombros.

-- Ninguém sabe ao certo. Umas dizem que ela matou três pessoas à sangue frio, outras dizem que esquartejou a ex-namorada, mas a verdade é que nunca saberemos, porque ninguém ousa perguntar. -- Rafaella assentiu e se calou.

Teriam que tomar banho em alguns minutos e logo voltar para a cela. Cela, lá estava o novo medo de Rafaella, afinal ela não sabia com quem dividiria o espaço.

-- Está aqui por quê? -- Manu perguntou e Rafaella se remexeu em seu acento.

-- Um engano. -- Manu riu baixinho e assentiu.

-- Todas dizemos isso, até o momento que nos conformamos em assumir nossa culpa. -- Ela disse. -- Do que foi acusada?

-- Assassinato. -- Disse seriamente.

-- Uou, interessante. E quem você matou?

-- Não matei ninguém. -- Rafaella disse firmemente e com a expressão de irritação em seu rosto.

-- Quem te acusaram de matar? -- A garota reformulou a pergunta.

-- Meu irmão e de tentar matar minha mãe.

-- Nossa. Quanto tempo pegou? -- A garota perguntou curiosa.

-- Vinte e dois anos.

-- Bem, sua pena pode se reduzir para mais da metade disso se você se comportar. Eu mesma, peguei sete anos, estou aqui há dois anos e meio e saio no próximo semestre se manter a boa conduta.

-- Minha pena implica em não ter direito à redução de pena por bom comportamento ou por pagamento de fiança. -- Rafaella explicou. -- O que fez?

-- Roubo de carro e presa em flagrante.

-- Pegou tudo isso por roubo de carro?

-- Eu não sabia que era do senador. -- Rafaella abriu a boca surpresa, mas aparentemente a garota estava acostumada com aquilo.

-- Bem, logo sairá daqui então.  -- Rafaella disse, voltando a olhar para a garota de olhos castanhos. Ela sabia que deveria seguir o conselho da policial Mcgowan, mas não entendia o porquê de ser tão observada.

-- Sim. Reparei que tem três de olho em você. -- Manu disse. -- Por sorte a minha não está.

-- Não entendi.

-- Às vezes elas trocam de parceiras e as antigas ficam desprotegidas novamente. Tem vezes que elas ficam com mais de uma parceira. Sabe a tatuada? -- Rafaella assentiu assim que viu que Manu se referia à garota da fila.

-- Seu nome é Vivian-- A garota revelou. -- É porque a cada nova cicatriz ela faz uma nova tatuagem em cima.

-- Oh. -- Rafaella disse levemente assustada.

-- Ela parece estar de olho em você, mas não se preocupe. Ela só aparenta ser assustadora, é um doce de pessoa.

-- Estou ficando assustada. -- Rafaella revelou, rindo fraco e a garota assentiu.

-- Desculpe, não foi minha intenção. -- Manu disse, olhando para um ponto fixo atrás de Rafaella antes de se levantar. --
Preciso ir, minha mulher está me chamando. Até mais. -- Disse e saiu, Rafaella olhou para trás e viu uma garota branca,um pouco malhada, porém de riso fácil dando um selinho em Manu.

A garota suspirou amedrontada em seu interior. Em que furada sua mãe havia lhe metido desta vez?

Presa Por AcasoOnde histórias criam vida. Descubra agora