17
BEATRICE
Desde que tinha descoberto os demônios e a Ordem que os eliminava daquele plano, Beatrice odiava pensar que os humanos eram "seres limitados". Isso porque ela não tinha limitações em destruí-los e eles sempre voltavam para mais uma rotina desgastante. Mas ela sempre esteve presa somente nesse conceito. Não sabia que o termo "seres limitados" estava aplicado sobre a impossibilidade de viver numa só vida todas as experiências, físicas e emocionais, proporcionadas pelo mundo. Agora se perguntava o porquê de não ter vivido de forma normal.
Infelizmente sabia a resposta. Beatrice não a viveu simplesmente por não ter tido escolha alguma. Ela foi colocada para seguir passos que não eram dela, mas que, obrigatoriamente, deveria caminhar por onde outras pessoas já pisaram. Não pode desfrutar do mundo, pois era desconhecido. O caminho que lhe passaram era seguro porque outros já o percorreram, então tinham a certeza de que não haveria falhas. Esse foi um dos motivos de ter aceitado sem birras aquele combinado. Ali, não tinham formas dela se desviar. Era algo linear e já escrito, ela só precisava ler.
Obviamente não esperava uma caneta viesse e riscasse as linhas seguintes, substituindo-as por novos textos os quais ela ainda não sabia como interpretar. Chegava a ser hilário que ela, uma garota que era fluente em diversos idiomas, não soubesse ler as linhas de sua própria história. Mesmo com toda a interrupção, ela estava gostando do novo rumo que aquelas páginas a tinham dado; estava descobrindo o novo, algo que nunca tinha visto ou experenciado. E, novamente, ela não esperava que arrancassem as folhas daquele livro.
Era estúpido para um pagão analisar sua situação. Pensariam: Oras, você está longe de uma das mais manipuladoras instituições do mundo. Deveria se sentir livre, não apenas deles, mas também livre daquilo que teve que fingir ser a vida inteira. Seria fácil pensar assim. Entretanto, para você que ainda acredita que Beatrice deveria estar em seu melhor dia, imagine não ter em quem acreditar. Não importa sua religião, imagine-se distante do seu deus, ou deusa, imagine-se proibido de pisar no local onde você o cultua, de receber bençãos. Caso você for ateísta, só se coloque no lugar dela. Deve ter algo em que você acredita e, com certeza, se passasse pela situação de Beatrice, a entenderia.
Aceitava que a julgassem por fugir, sabia que já era um caso perdido para oferecer ajuda, já que além de perder sua fé e a garota que ama, ela também tinha sido impedida de ajudar nas buscas do causador de tudo aquilo. Tinha ido para a casa de férias dos pais. Gostava de pensar que se Ava estivesse em seu plano, a garota saberia procura-la ali. Também tinha a noção de que talvez Camila soubesse onde estava, pois já tinha comentado sobre o local para a menor.
Precisava se tempo para digerir tudo que tinha sido imposto a ela e, mesmo tendo conseguido completar parte daquele objetivo, não foi capaz de voltar e encarar o rosto das amigas. Sentia-se enfurecida por ter sido egoísta, não pensando que Camila tinha uma ligação maior com a fé que ela, não saberia lidar com um possível olhar decepcionado por a ter abandonado quando ela mais precisava. Não tinha o direito de estar sentada no meio da praia, com os pés afundados na areia, sentindo o topo da cabeça e os ombros queimarem por conta do sol e dos fios curtos de seu cabelo. Beatrice confessava ter agido como uma adolescente imatura em meio a um surto ao ter cortado o próprio cabelo, tendo que ir a um profissional para ajeitá-los depois de ver o estrago que fizera. O cabelereiro o cortou ainda mais curtos, deixando-o um pouco acima do ombro, mas ela não se arrependeu já que tinha ficado com uma boa aparência.
VOCÊ ESTÁ LENDO
You know I do - Avatrice
FanfictionApós o desastre no Vaticano, as irmãs guerreiras são aterrorizadas pelas consequências. Adriel e o Padre Vincent fugiram, e a Ordem da Espada Cruciforme suspeita que eles demorarão a realizar um outro ataque devido a situação atual da Igreja. É o mo...