Bailey May
O ambiente era mórbido. Assim que entramos na casa, nos deparamos com a bagunça enorme da sala de estar. Era como se um furacão devastador tivesse acabado de passar por ali. O que não deixava de ser verdade.
Peguei a almofada na qual tropecei na entrada e pus sobre um dos sofás. Estava escuro e as janelas completamente fechadas. Todas elas.
Havia apenas a luz da televisão iluminando o lugar. Meu tio Marco estava ali, sentado na poltrona com os olhos vidrados na TV. Pacotes e mais pacotes velhos de batata e latas vazias estavam ao seu redor, parecendo fazer parte da decoração do ambiente. E se nós tivéssemos seguido direito pra onde quer que Wendy e Linsey estivessem, ele mal notaria que alguém tinha entrado ali.Minha mãe havia me contado sobre a situação dele. Ela disse que o tio Marco parecia não existir. Desde a madrugada em que Noah se fora até a quarta-feira em que nos encontrávamos, ninguém tinha o escutado dizer nada. Ele ficava sentado na sala o dia inteiro, na poltrona em frente a lareira apagada, olhando para a televisão como se não estivesse vendo nada. Era como se ainda tentasse entender tudo e, honestamente, eu pensava que não estava muito diferente dele.
Mas então eu o vi. Estava tão miserável que chegava a provocar um nó na boca do estômago. O que quer que estivesse naquele corpo não era o meu tio. E o que quer que eu estivesse sentindo, não poderia ser comparado àquilo.
— Ei! — minha mãe disse ao tocar seu ombro. — Viemos ver como estão as coisas...
Marco piscou lentamente e virou sua cabeça na mesma velocidade. Parecia que estava tentando nos reconhecer ao piscar mais algumas vezes.
—Vanessa. Bailey. — Aquilo deveria ser um comprimento, eu imaginei.
— Tudo bem, tio? — perguntei, baixinho. — O que anda assistindo? — Apontei para a TV. Eu sabia que era um jogo de futebol, mas talvez fazê-lo falar sobre qualquer outra coisa o tirasse um pouco da miséria.
Ele seguiu a direção do meu dedo e ficou perplexo por alguns instantes. Depois voltou seu olhar para mim.
— Hã...Eu não... Não sei bem. — Pigarreou, um tanto perdido. — Futebol, eu acho.
Bom, já era alguma coisa.
Ficamos todos em absoluto silêncio.
— Hm... Onde está Linsey? — minha mãe perguntou.
— No quarto... eu acho.
— Certo... — ela assentiu, grata, ainda que meu tio nem nos olhasse mais. — Estaremos lá em cima se precisar.
Dei alguns tapinhas em suas costas para reforçar o que minha mãe tinha dito. Ele nem reagiu.
Subimos as escadas devagar. Me dei conta de que era a primeira vez que eu estava ali desde o enterro.
Um aperto no peito me fez parar e respirar um pouco.
Noah não estava ali. Jamais estaria de novo.Me peguei tomado pelas lembranças das duas criança correndo por aquelas escadas a fora atrás do antigo cachorro bobão da família. Do campo de guerra que transformávamos a casa, nos escondendo com nossas Nerfs e estilingues improvisados. Da gente às espreitas, esperando o momento certo para pegar Linsey de surpresa e a deixar tão irritada que seria capaz de nos esganar no momento em que nos alcançasse. Pude escutar nossas risadas e até mesmo sentir o antigo arrepio na espinha só de pensar na possibilidade da minha prima nos pegar pela orelha e nos dar uma bronca daquelas.
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Lugar Seguro - Shivley Fanfic
FanfictionApós a tragédia que tirou a vida do seu primo e melhor amigo, Bailey May se vê num difícil dilema: dar suporte aos seus amigos e família enquanto tenta - com muito esforço - seguir em frente. Em seu desespero por utilidade para com as pessoas que lh...