Prólogo

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Senhores e senhoras, aqui quem fala é o comandante. Dentre de poucos minutos, estaremos pousando no Aeroporto Santos Dumont do Rio de Janeiro. O clima é bom, a temperatura é de 36º C. A previsão é céu limpo e claro com muito sol por todo o final de semana. Aproveitem a estadia e obrigada por escolher a nossa companhia aérea.

Graças. A. Deus.

            Eu juro que enlouqueceria e começaria a esfaquear os outros passageiros com a faca de passar manteiga se tivesse de ficar muito mais tempo na companhia daquele garoto.

            ― Quem diria? ― Carlos sorriu para mim de um modo não tão cínico quanto eu esperava, não deixando, é claro, de ser completamente debochado. ― Eu acho que foi sua companhia, mas o tempo realmente passou voando.

            ― Pois eu senti cada cada minuto dessa insuportável uma hora e meia ― retruquei, sem olhar para ele.

            Pela minha visão periférica, vi que ele consultou o relógio.

            ― Então não foi tão ruim assim ― disse, me dando uma cotovelada brincalhona. ― Foram quase duas horas de voo. Viu? Passou voando.

            ― Eu descontei aquela meia hora de paz em que você estava dormindo, espertinho.

            Em vez de ficar chateado, ele sorriu ainda mais.

            ― Você é ácida demais para uma menina.

            Aquela frase me pegou desprevenida e eu ergui as sobrancelhas, não conseguindo conter um sorriso surpreso. Fechei a cara assim que os olhos dele se iluminaram ao me ver correspondendo a todo aquele lenga-lenga.

            ― O que posso dizer? Você é um babaca completo. Exatamente o que se esperaria de um garoto.

            Carlos balançou a cabeça desaprovadoramente, mas não perdeu o sorriso.

            ― Eu acho que você não deveria generalizar, Amelia.

            Eu virei de costas para ele e coloquei meus dedos sobre o vidro frio da janela.

            ― E eu acho que você deveria ficar calado ― murmurei. ― Está estragando o meu momento-filme, pousando-no-Rio.

            ― Você é completamente pirada. ― Fora isso, ele não disse mais nada. O que foi até surpreendentemente educado, considerando o tanto que ele tinha sido implicante a viagem inteira.

            Ok, talvez ele não tenha feito por querer, admito.

            Pode ser que seja coisa cultural tirar uma pessoa de sua tranquila leitura para ficar fazendo comentários aleatórios sobre coisas que ninguém quer saber.

            E tenho certeza de que ele não exatamente mirou nas minhas novíssimas botas Miu-miu de cano alto quando foi vomitar.

            É capaz que ele nem mesmo soubesse o quanto aquele sotaque imbecil estava me irritando.

Por último, eu preciso dizer, não era culpa dele que tivesse aquele nome. Exatamente aquele nome... Como se estivessem tramando para cima de mim...

            Aqueles pensamentos deixaram minha mente assim que sobrevoamos o Cristo Redentor. O monumento parecia minúsculo lá de cima, como se fizesse parte de uma maquete de ensino médio. Mas era o que ele representava que me fez sorrir.

            "Então é isso", eu pensei. "Que comece o filme".

            O sorriso enorme que eu me esforçara para esconder por todo aquele tempo finalmente encontrou espaço em meus lábios. Ignorei os olhares indagadores do meu companheiro de assento. Minha barriga começou a se retorcer... de um jeito bom.

            Que comece o filme.

Como nos filmes [Completo]Onde histórias criam vida. Descubra agora