Sombras

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  O som de minha respiração pesada ecoava pelo local, alarmando o medo que eu sentira a cada ruído que ouvia. Desde o esbarrar em gaiolas à passos de ratos que circulavam por ali. Após revirar a casa de Sônia em busca de objetos que pudessem ajudar em minha investigação, me dirigi ao meu ponto de partida, o local onde acordei, e lembrei-me do vulto entrando neste pet-shop.

  Com a luz tremeluzente de minha lanterna, comecei a inspecionar aquele lugar, que com toda certeza poderia ser acunhado de "mal-assombrado". Grades e jaulas estavam esparramadas por todo canto, de diferentes tamanhos e formas, e farelos de ração ainda jaziam no chão encardido. A loja fétida ainda se mantinha de pé, mas tudo estava revirado, e de modo tão impactante que de maneira alguma poderia ter sido obra de delinquentes.

"Sem dúvida alguma, isto não foi obra do tempo"

  Continuei a caminhar, direcionando a lanterna para todos os cantos ao me redor, acreditando que uma pista gritante fosse surgir. Mas, tragicamente, ela apareceu e desejei jamais ter adentrado aquela loja de animais. Senti que quanto mais eu procurava, o pior mais se revelava.

  Primeiro soltei um grito que, sem perceber soou como o daquelas menininhas choronas que vemos em filmes de terror. Em seguida, tropecei em uma gaiola ao recuar e cai sentada, de frente para o que vira.

Um cadáver.

  A lanterna que soltou-se de minhas mãos, e que neste momento estava no chão, iluminava o corpo do homem. Haviam cortes, como de unhas, em seu rosto manchado de sangue e seus olhos vidrados me encaravam como se implorassem por ajuda. "Deve ter morrido pedindo por socorro..." pensei, observando o corpo com os olhos semicerrados, e levei minhas mãos a boca, sentindo que estava prestes a vomitar. Era dali que vinha aquele cheiro forte e asqueroso.

- Mas que merda é essa...?! - falei baixinho, com medo que o assassino ainda estivesse por ali.

  Como os que vira na rua, o cadáver era recente. A poça de sangue debaixo do corpo ainda nem havia secado. Se eu tivesse chegado apenas alguns minutos mais cedo, poderia ter presenciado uma horrível cena de homicídio.

  Depois de esfregar o rosto e repetir para mim mesma que estava segura, me levantei e peguei a lanterna. Com o corpo tremendo alucinado, arrisquei alguns passos até a vítima e dei atenção aos demais detalhes. Haviam hematomas na sua testa e em sua mão direita, evidenciando que ele lutou corpo a corpo com o culpado.

- Pelo menos não foi ninguém armado - suspirei, ao retirar um peso de meus ombros, mas só então associei os cortes as outras marcas que tinha visto, e minha expressão se tornou tensa - Mas quem mataria um homem de forma tão brutal usando apenas os punhos?

  Não importava como eu olhasse, aquele ainda era um incidente estranho. Afinal, a barriga do homem estava perfurada de forma horrorosa, como se alguém houvesse usado uma britadeira para corta-lo.

  Peguei meu caderno de anotações e atualizei com as mais novas notícias, boas ou más. Por certo, eu não estava sozinha no mundo, no entanto, poderia estar sendo caçada por um estranho psicopata. Como permanecer naquele lugar não me forneceria mais nenhuma informação optei por deixa-lo, mas foi então que aquilo aconteceu. Foi tudo muito rápido, mas bem sinistro.

  Escutei o som de um objeto de vidro se estilhaçar, "Veio da porta!" cogitei, e ao olhar as pressas para o local, sem nem mesmo posicionar a lanterna, eu vi uma sombra. Tinha forma humana, mas era esquisita, cheia de dobras e coisas saindo do corpo, todo o formato era esquisito. De fato, não era "humano", mas conclui que era humanoide. Quando apontei a lanterna, a silhueta já não estava mais lá.

  Em vez de me paralisar de medo, imersa em questões e dúvidas intermináveis, me pus a seguir por aquilo. Ouvi o som de passos, e não estavam distantes, mas eram rápidos. Corri pela escuridão em busca daquilo que poderia ser o próprio demônio, mas nada mais importava, eu precisava da verdade, fosse o que fosse. Logo, me peguei de volta na rua banhada pela chuva, mas estava de frente para uma outra porta, em um beco estreitíssimo.

"Foi por ali!" pensei ao ver que a porta estava aberta.

  Adentrei o local, com passadas largas e desesperadas, jogando a luz da lanterna para tudo quanto era lado. Com medo de ser atacada a qualquer momento.

- Devia ter guardado uma arma em casa, agora ela seria pra lá de bem-vinda - murmurei entre arfadas.

  Percorri vários corredores do local, até chegar a uma parte mais clara onde a luz do dia quase não passava pelos vidros espessos. Haviam muitos objetos dispersos no chão, mas nem consegui identificá-los. Aproveitando-me da pouca claridade de que dispunha, comecei a observar melhor onde me encontrava, e devido ao amplo espaço julguei que estava em uma fábrica. O que logo confirmei ao me deparar com grandes, e simples, maquinários. Tudo enferrujado e cheirando a óleo.

  De repente, jurei ter visto um vulto se mover por trás de uma máquina, o qual fez meu corpo congelar por um instante. Ele não passou correndo pelo canto de meu olho, ao contrário, estava ali a algum tempo.

"Estava me observando..."

  Senti que seus olhos estavam pousados em mim, me olhando de cima a baixo, como uma fera selvagem que inspeciona um cordeirinho em busca da parte mais deliciosa para atacar. Só então confirmei, que não estava lidando com um humano, e sim com uma criatura voraz e medonha que poderia me estraçalhar com o piscar de meus olhos. Pensei em correr, mas era tolice, ele corria mais que eu. E é como dizem, se correr do predador ele irá vê-lo como presa. Sem contar que eu já havia me perdido, após ter atravessado vários corredores dentro daquela fábrica em pleno breu. Não havia escapatória, aquele seria o meu fim.

  Do nada, vários passos ecoaram pela fábrica, como se uma manada estivesse a caminho dali. Uma porta se rompeu e ruídos esquisitos foram ouvidos das criaturas macabras. Como reflexo, eu apontei a lanterna, e só então pude ver estes seres das trevas sob a luz.

"Sem dúvida alguma, eu cheguei ao inferno!" Gritei em meus devaneios ao encarar as criaturas.

Incógnitas - Anomalias do TempoOnde histórias criam vida. Descubra agora